Regressiva OAB 100 dias (Dica 95) – Direito Penal: Professor Marcelo Ferreira

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regressiva OABEstupro: concurso de crimes ou crime único?

A Lei nº 12.015/09 alterou o Título VI da Parte Especial do Código Penal. Antes da alteração, o referido Título se referia aos “Crimes Contra os Costumes”, e passou a tratar dos “Crimes contra a Dignidade Sexual”, indicando, de forma mais adequada, o bem juridicamente tutelado.
O primeiro Capítulo daquele Título manteve o mesmo nome: “Crimes contra a Liberdade Sexual”, mas seus artigos foram objeto de algumas alterações.
A mudança mais significativa, que gerou várias discussões e interpretações contraditórias, diz respeito ao crime de estupro, que abarca não só a conduta de conjunção carnal, mas também aquelas referentes a atos libidinosos diversos da conjunção carnal. Isso porque, com a alteração legal, foi revogado o art. 214, que previa o crime de atentado violento ao pudor, mas o texto nele previsto não deixou de existir no ordenamento jurídico, uma vez que passou a constar da redação do art. 213.
Com efeito, a conduta de conjunção carnal (introdução do pênis na vagina) e a conduta de ato libidinoso diverso (coito anal, sexo oral, dedo na vagina, beijo lascivo etc.) fazem parte, hoje, do mesmo tipo penal, denominado estupro.
Nesse contexto, surge a problemática que se refere às hipóteses em que o agente pratica conjunção carnal e outros atos libidinosos contra a mesma vítima. Se antes havia dois crimes, após a alteração legislativa essa afirmativa foi objeto de muitos debates, que deram origem a duas posições antagônicas.
Seria possível a existência de concurso de crimes no mesmo contexto fático, quando o agente praticasse conjunção carnal e outra espécie de ato libidinoso contra a mesma vítima, considerando a nova redação normativa? A extinção da expressão “atentado violento ao pudor” e classificação daquela conduta como estupro, indica que a intenção do legislador foi a de unir os dois artigos do Código Penal para definir como crime único as múltiplas condutas de cunho sexual?
Busca-se, portanto, a compreensão da nova definição jurídica do crime de estupro e suas reais interferências na aplicação da lei penal, considerando a redação dada pela Lei n° 12.015/09, com especial destaque para as questões que envolvem o concurso de crimes e a continuidade delitiva.
A possibilidade de tratar as múltiplas condutas como crime único ou como uma pluralidade de crimes indica a importância do assunto.
Já não se pode desconhecer que a finalidade do crime de estupro é a tutela da dignidade sexual e da liberdade sexual, consideradas como expressão da dignidade humana. Em nossa sociedade atual não existe mais espaço para ser usado o instrumento penal com o fim de proteger práticas costumeiras, conveniências sociais ou a normalidade das condutas relacionadas ao sexo. Há o entendimento de que a experiência sexual é algo intimamente relacionado ao indivíduo, sob cuja perspectiva incide a tutela penal.
No que diz respeito ao conceito atual do crime de estupro, observamos uma grande evolução, que aconteceu principalmente a partir do momento em que houve reconhecimento de que, tanto a mulher, quanto o homem, podem se estabelecer como sujeitos passivos do crime em referência. Já que vivemos em um mundo em que se procura o estabelecimento de tratamento igual entre homens e mulheres e não era aceitável que o instrumento penal fizesse esse tratamento individualizado. Neste momento, existe a certeza de que, sendo a mulher sujeito passiva desse crime, ela também irá sofre as sanções penais.
Nas alterações trazidas pela lei em explanação, teve também uma especial atenção do legislador ao estupro no momento em que cometido contra menores de quatorze anos, ou pessoa com enfermidade ou doença mental que não tenha capacidade de discernimento para a prática do ato. A lei atual definiu o crime em referência como Estupro de Vulnerável. O principal objetivo foi de cuidar da liberdade sexual da vítima vulnerável, que em regra são presas fáceis daqueles que eram sexualmente depravados e que deixavam transparecer a sua libido.
A Lei nº 12.015/09 aboliu o crime de atentado violento ao pudor, porém as ações que antes caracterizavam crime de atentado violento ao pudor começaram a integrar o delito de estupro.
Todas essas modificações mostram que a intenção do legislador foi no sentido de dificultar a situação dos que se envolvem na prática de crimes sexuais com violência à pessoa.
O pensamento dominante defende que ao juntar os tipos penais, a nova redação do crime de estupro admitiu de forma franca a caracterização de tipo misto alternativo. Para essa corrente, a tese discordante decorreria em ultraje ao princípio da legalidade, o pilar do direito penal. Ainda que os réus tenham sido beneficiados, e que, diante deste fato a lei tenha assumido um caráter atenuante não revelado nas intenções legislativas que precederam a edição da Lei 12.015/2009, acredita-se que deveria se homenagear o primado da legalidade. Existiu a criação de uma nova disciplina normativa que levou a um modelo mais criterioso de punição no campo dos delitos sexuais.
Em sentido oposto, compreende-se que ao fundir os dois tipos penais, encerrando com a expressão “atentado violento ao pudor” e qualificando todo crime sexual como estupro, o legislador evidenciou que tinha como objetivo principal tornar a lei mais rigorosa e por conseqüência a penalização do delinqüente sexual. O recrudescimento da pena em relação ao verificado na lei anterior foi a prova disso, já que a pena passa a ser de 12 (doze) a 30 (trinta) anos enquanto a prevista anteriormente era de 12 (doze) a 25 (vinte e cinco) anos.
Considerando-se a corrente do tipo misto alternativo, existiria um estímulo aos agentes praticantes do crime de estupro, pois, caso a pessoa pratique somente conjunção carnal, ela terá pena de reclusão de seis anos, se ela praticar coito anal, relação sexual oral, vários coitos, várias conjunções, a pena é igualmente abordada.
Na lei em questão, o legislador nunca teve a intenção de amenizar a penalidade aplicada ao agente. A intenção foi a de fazer justiça, coibindo a prática desse crime que aterroriza a sociedade atual.
No entanto, a despeito de todas as divergências, o que se verificou no âmbito dos tribunais foi a posição segundo a qual deve ser reconhecida a tese de crime único, o que privilegia o criminoso e deixa ainda mais enfraquecida a legislação que visa coibir a prática de crimes sexuais, com reflexos diretos e significativos sobre a liberdade sexual das vítimas do crime de estupro.
 
Bons estudos !

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MarceloMarcelo Ferreira – Mestre em Direito Público, Especialista em Direito Penal e Processo Penal. Autor da obra Segurança Pública e Prisão Preventiva no Estado Democrático de Direito (Editora Lumen Juris). Assessor de Ministro do Superior Tribunal Militar. Professor de Direito Penal e Processo Penal do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), da  UNIEURO e da
pós-graduação do UniCEUB. Coordenador da Equipe Exame (cursos presenciais de prática penal para OAB). No Rio de Janeiro, além de professor universitário e de cursos preparatórios para concursos, atuou como presidente e membro de várias bancas de concurso público, em especial, os concursos para os cargos de Delegado de Polícia do Estado do Rio de Janeiro e de Oficial integrante do Sistema de Assessoria Jurídica Consultiva da Marinha.
 

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