Jurisprudência do STJ: a embriaguez ao volante, por si só, não pode presumir a existência do dolo eventual na conduta do motorista

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Por: Projeto Exame de Ordem | Cursos Online
Segundo a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, a embriaguez do motorista, por si só, não significa que o agente agiu com o dolo eventual, mesmo que resultando acidente com o evento morte.
No caso julgado (Resp n. 1.689.173/SC, 06/12/2017), uma motorista havia ingerido bebidas alcoólicas em uma festa e, ao assumir a direção de seu veículo, colidiu-o frontalmente com outro, causando a morte do condutor.
Para o Tribunal da Cidadania, o fato de a condutora estar embriagada e causar um acidente, ainda que em alta velocidade, não pode presumir que a conduta tenha sido perpetrada com o dolo eventual.
O entendimento do tribunal foi que, no caso, houve mera ausência do dever de cuidado objetivo, uma vez que a condutora não acreditava que iria colidir o veículo e produzir resultado lesivo.
Para que haja o dolo eventual, deve-se demonstrar que o agente previu a ocorrência do resultado e assumiu o risco de sua produção, ou seja, deve existir, por parte do agente, uma antecipação mental de que a sua conduta poderia causar o resultado danoso, aceitando-o como provável.
Assim, a embriaguez do agente condutor do automóvel, sem o acréscimo de outras peculiaridades que ultrapassem a violação do dever de cuidado objetivo, inerente ao tipo culposo, não pode servir de premissa bastante para a afirmação da existência do dolo eventual.
O ministro Rogério Schietti bem detalhou a complexidade em decidir nestes casos:
“Em verdade, é tormentosa a delimitação da fronteira divisória entre dolo eventual e culpa consciente na teoria do crime, máxime em hipóteses de homicídios causados na direção de automóvel. O tema me leva, sempre que com ele me defronto, a refletir sobre a particular dificuldade de chegar-se a uma conclusão sobre o elemento anímico que move a conduta do agente, haja vista que nem sempre o que pensa ou delibera o acusado em sua psique se materializa em atos externos”.
Em seu voto, destacou que, em regra, há a existência da culpa consciente. Vejamos:
“Pessoalmente, em crimes praticados na condução de veículos automotores, em que o próprio condutor é uma das pessoas afetadas pelo fato ocorrido, a tendência natural é concluir-se pela mera ausência do dever de cuidado objetivo, até porque, salvo exceções, normalmente as pessoas não se utilizam desse meio para cometer homicídios e, mesmo quando embriagadas, na maioria das vezes, agem sob a sincera crença de que têm capacidade de conduzir o seu veículo sem provocar acidentes”.
Nessa linha, pode-se afirmar que a maioria das pessoas, ao se embriagar e dirigir veículo automotor, não age com dolo eventual, mas com culpa consciente, pois prevê que poderá ocorrer o acidente, mas confia que esse resultado jamais advirá.
Percebe-se que a Sexta Turma do STJ entendeu que, para o reconhecimento do dolo eventual, faz-se imprescindível a análise das circunstâncias de cada caso concreto, não existindo uma regra geral e objetiva.
Assim, não se pode criar uma “regra aritmética” no sentido de que beber e dirigir veículo automotor caracteriza sempre a conduta sob a modalidade do dolo (eventual).
O ministro Rogério Schietti destacou, ainda, que a pouca severidade das sanções dos crimes culposos na condução de veículo automotor não justifica estabelecer uma regra de existência do dolo eventual em toda a conduta do condutor embriagado.
Vejamos as palavras do ministro:
“Aparentemente em razão da insuficiência da resposta punitiva para os crimes de trânsito, que, invariavelmente, não importam em supressão da liberdade de seus autores – porque, sendo a conduta culposa, os autores do crime são beneficiados pelo regime aberto de cumprimento da pena e pela substituição da sanção privativa de liberdade por restritiva de direitos – tem-se notado perigosa tendência de, mediante insólita interpretação de institutos que compõem a Teoria do Crime, forçar uma conclusão desajustada à realidade dos fatos”.
Pelo exposto, a ingestão de álcool, por si só, não é circunstância definitiva para o reconhecimento do dolo eventual, pois, em regra, o agente não assume o risco de causar um acidente nessas condições, devendo ser a conduta conjugada com outras circunstâncias que demonstrem o perigo.
Por fim, é plenamente possível, em crimes de homicídio na direção de veículo automotor, o reconhecimento da conduta com o dolo eventual, porém deverá estar respaldada a partir de circunstâncias fáticas que, subjacentes ao comportamento delitivo, indiquem haver o agente previsto e anuído ao resultado morte.


José-CarlosProf. José Carlos – Processo Penal – Professor Universitário e Advogado, com especialização em Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Ambiental e Recursos Hídricos. Doutorando em Direito Penal pela Universidade de Buenos Aires (UBA). Professor Titular de Direito Penal e Direito Processual Penal na Universidade Católica de Brasília (UCB). Professor Titular das Faculdades Integradas da União Educacional do Planalto Central (FACIPLAC) nas áreas de Direito Penal, Processo Penal e Laboratório de Prática Jurídica. Participante de bancas examinadoras de Concursos Públicos.


 

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