O Índio em “estado de isolamento” é inimputável para fins de aplicação da lei penal brasileira?

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Olá pessoal, tudo certo?

Vamos falar sobre um tema especialmente pensado para aqueles concursos em que, no edital de direito penal, há a previsão da Lei 6001/73 (Estatuto do Índio).

O assunto por mim eleito gera bastante confusão e insegurança quando do estudo da aplicação (ou não) da lei penal aos índios. Em primeiro lugar, ao contrário do que alguns possam entender, o chamado “estado de isolamento” mencionado no título do texto não denota (necessariamente) um conteúdo preconceituoso (apesar de não ser o ideal), mas sim extraído pela doutrina do próprio Estatuto do Índio.

É que a Lei 6.001/73 traz a existência de 3 estágios de integração dos índios. Vamos a eles:

(a) ISOLADOS – Quando vivem em grupos desconhecidos ou de que se possuem poucos e vagos informes através de contatos eventuais com elementos da comunhão nacional;

(b) EM VIAS DE INTEGRAÇÃO – Quando, em contato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservam menor ou maior parte das condições de sua vida nativa, mas aceitam algumas práticas e modos de existência comuns aos demais setores da comunhão nacional, da qual vão necessitando cada vez mais para o próprio sustento;

(c) INTEGRADOS – Quando incorporados à comunhão nacional e reconhecidos no pleno exercício dos direitos civis, ainda que conservem usos, costumes e tradições característicos da sua cultura.

Durante algum tempo, parcela da doutrina entendia que o simples fato de os índios viverem em estado de isolamento, por si só, seria suficiente para sustentar a ideia de INIMPUTABILIDADE.

Esse não é mais o pensamento dominante, conforme se pode verificar – dentre vários – no precedente da Suprema Corte datado de 2005 (HC 85.198/MA[1]). De maneira enfática, vale verificar ainda o HC 79.530/PA, da 1ª Turma do STF, que indicou a “sujeição do índio às normas do art. 26 e parágrafo único, do CP, que regulam a responsabilidade penal, em geral, inexistindo razão para exames psicológico ou antropológico, se presentes, nos autos, elementos suficientes para afastar qualquer dúvida sobre sua imputabilidade, a qual, de resto, nem chegou a ser alegada pela defesa no curso do processo”.

Beleza, Pedro. Acho que entendi. Mas tem como fazer um resumo de tudo?

Claro! Vamos lá.

Analisando o atual momento, podemos indicar que a simples condição de índio não é decisiva para a imputabilidade (ou ATRIBUILIDADE, como aponta Francisco Assis de Toledo), tampouco será caráter absoluto o grau de sua integração com a sociedade. As regras a serem aplicadas aos índios são as mesmas dos demais, ou seja, aquelas fixadas pelo legislador no artigo 26 do CPB[2].

Naturalmente, o grau de integração servirá como um dos parâmetros para a aferição da imputabilidade no caso concreto, mas se revela imprescindível para seu afastamento a impossibilidade de entendimento do ilícito ou atuação de acordo com esse entendimento. Não há critério absoluto, certo?

Espero que tenham compreendido! É um assunto bastante delicado!

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

 

 


[1] EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIMES DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMA PRATICADOS POR ÍNDIO. LAUDO ANTROPOLÓGICO. DESNECESSIDADE. ATENUAÇÃO DA PENA E REGIME DE SEMILIBERDADE. 1. Índio condenado pelos crimes de tráfico de entorpecentes, associação para o tráfico e porte ilegal de arma de fogo. É dispensável o exame antropológico destinado a aferir o grau de integração do paciente na sociedade se o Juiz afirma sua imputabilidade plena com fundamento na avaliação do grau de escolaridade, da fluência na língua portuguesa e do nível de liderança exercida na quadrilha, entre outros elementos de convicção. Precedente. 2. Atenuação da pena (artigo 56 do Estatuto do Índio). Pretensão atendida na sentença. Prejudicialidade. 3. Regime de semiliberdade previsto no parágrafo único do artigo 56 da Lei n. 6.001/73. Direito conferido pela simples condição de se tratar de indígena. Ordem concedida, em parte. (HC 85198, Relator(a): EROS GRAU, Primeira Turma, julgado em 17/11/2005).

[2] Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Parágrafo único – A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

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