A ascensão funcional de um diplomata

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28 de novembro4 min. de leitura

Tema recorrente entre os candidatos ao Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata (CACD), mais conhecidos como CACDistas, é o das promoções. Mesmo antes do ingresso na carreira, os aspirantes querem saber como e, principalmente, em quanto chegarão ao topo. Esse tema está disciplinado pela Lei No 11.440, de 29 de dezembro de 2006, cujo conteúdo, aliás, faz parte do programa da prova de Noções de Direito e Direito Internacional Público do exame de ingresso (primeira e segunda fases).

Todos os CACDistas imaginam-se não apenas como membro do corpo diplomático brasileiro, mas em especial, como Embaixador(a) do Brasil em Paris, em Washington ou alguma Embaixada importante. Claro que a pessoa que irá ocupar um desses cargos daqui a 40 anos, por exemplo, provavelmente ainda não ingressou na carreira e poderá até ser você ou algum concorrente seu no CACD deste ano ou do próximo, mas é preciso saber que o caminho não é fácil e o funil, apertado. Entendamos como funciona.

As promoções na Carreira de Diplomata obedecem a critérios legais, especialmente os estabelecidos nas Seções V e VI da referida Lei No 11.440/06, que instituiu o Regime Jurídico dos Servidores do Serviço Exterior Brasileiro, aí incluídos os diplomatas. Com certeza, como em toda carreira, nem toda promoção é automática (por antiguidade), assim que obedecidos os requisitos previstos na Lei, aliás, no caso do Itamaraty, apenas a primeira é assim. Das cinco promoções a que aspiram os diplomatas, as quatro últimas ocorrem também a partir de avaliações subjetivas, o que é chamado de promoção por merecimento[1].

A promoção por antiguidade significa que a ascensão funcional ocorre pela ordem de ingresso na carreira, logo após a aprovação no CACD. É desse modo que um diplomata

[1] Isso é exatamente o estabelecido no art. 51 da referida Lei:

Art. 51.  As promoções na Carreira de Diplomata obedecerão aos seguintes critérios:

I – promoção a Ministro de Primeira Classe, Ministro de Segunda Classe, Conselheiro e Primeiro-Secretário, por merecimento; e

II – promoção a Segundo-Secretário, obedecida a antigüidade na classe e a ordem de classificação no Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata – CACD, cumprido o requisito previsto no art. 53 desta Lei.

sobe o primeiro degrau de sua trajetória, ou seja, é promovido de Terceiro-Secretário[1] (classe inicial) a Segundo-Secretário. Os aprovados no CACD são dispostos em uma fila, de acordo com a colocação em que passaram. O primeiro colocado no Concurso será o primeiro da fila e assim por diante. Esse primeiro da fila do CACD de 2019 estará logo atrás do último colocado do CACD de 2018.

Para ser promovido a Segundo-Secretário, o diplomata não precisa jamais ter servido no exterior. Como os primeiros anos de exercício profissional ocorrem necessariamente em Brasília, inclusive porque o período do Curso de Formação[2] do Instituto Rio Branco (IRBr) obriga-o a morar na capital do país, em geral, essa promoção ocorre antes da primeira missão permanente ao exterior, ou durante sua estada no primeiro Posto (Embaixada, Consulado ou Missão junto a algum organismo internacional). Atualmente, o tempo médio para que isso ocorra tem sido de 6 a 7 anos, incluído aí o período de curso no IRBr.

Para a promoção de Segundo a Primeiro-Secretário, o diplomata necessita haver concluído o CAD (Curso de Aperfeiçoamento de Diplomatas)[3], ter ao menos 2 anos de serviço prestado no exterior e haver completado 3 anos de exercício profissional como Segundo-Secretário, que é o tempo de interstício mínimo entre cada classe da carreira. Como se trata de uma promoção por merecimento, no entanto, como afirmei, não basta cumprir esses requisitos, pois a escolha é da alta direção do Ministério, sendo a última palavra a do Presidente da República, com quem o Ministro das Relações Exteriores (Chanceler) despacha a lista de promovidos em todas as classes.

Para ser um dos escolhido a qualquer promoção por merecimento, além de cumprir os requisitos mínimos de promoção em sua respectiva classe, o diplomata precisa entrar no

[2] Como há muitas referências às classes da carreira, pede-se a compreensão (e permissão) das candidadas para utilização dos termos somente no masculino, para evitar a poluição do texto com os respectivos “(as)”.

[3] Os cursos do IRBr serão objeto de artigo futuro. Para conhecer o Curso de Formação, sugere-se pesquisa ao endereço http://www.institutoriobranco.mre.gov.br/pt-br/curso_de_formacao.xml

[4] Ver http://www.institutoriobranco.mre.gov.br/pt-br/curso_de_aperfeicoamento_de_diplomatas.xml

chamado Quadro de Acesso (QA). Trata-se de uma lista elaborada a partir de uma votação de todos os diplomatas sobre quais candidatos à promoção acham que merecem recebê-la. Os diplomatas votam nos candidatos de sua própria classe (votação horizontal) e das classes inferiores à sua (votação vertical).

Os resultados das votações são examinados em 3 diferentes câmaras de avaliação formadas por Chefes de Divisão, Diretores de Departamento e Secretários. As listas começam maiores na câmara hierarquicamente menor e vão diminuindo na medida em que sobem para as câmaras mais altas. Após essa triagem, o Chanceler decide quem entra no Quadro de Acesso de cada classe. O número de ingressantes no QA é o mesmo dos promovidos, que obviamente deixam o Quadro ao mudarem de classe.

As condições para a promoção de diplomatas nas demais classes estão previstas no Artigo 52 da Lei No 11.440:

Art. 52.  Poderão ser promovidos somente os Diplomatas que satisfaçam os seguintes requisitos específicos:

I – no caso de promoção a Ministro de Primeira Classe, contar o Ministro de Segunda Classe, no mínimo:

  1. a) 20 (vinte) anos de efetivo exercício, computados a partir da posse em cargo da classe inicial da carreira, dos quais pelo menos 10 (dez) anos de serviços prestados no exterior; e
  2. b) 3 (três) anos de exercício, como titular, de funções de chefia equivalentes a nível igual ou superior a DAS-4 ou em posto no exterior, de acordo com o disposto em regulamento;

II – no caso de promoção a Ministro de Segunda Classe, haver o Conselheiro concluído o Curso de Altos Estudos – CAE e contar pelo menos 15 (quinze) anos de efetivo exercício, computados a partir da posse em cargo da classe inicial da carreira, dos quais um mínimo de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de serviços prestados no exterior;

III – no caso de promoção a Conselheiro, haver o Primeiro-Secretário concluído o Curso de Atualização em Política Externa – CAP e contar pelo menos 10 (dez) anos de

efetivo exercício, computados a partir da posse em cargo da classe inicial da carreira, dos quais um mínimo de 5 (cinco) anos de serviços prestados no exterior.

O tempo mínimo de exercício do diplomata no exterior, exigência legal a partir da promoção de Segundo a Primeiro-Secretário, é contado somente quando a missão é permanente ou transitória ininterrupta de duração igual ou superior a 1 (um) ano. O período de serviço prestado em postos do grupo D é computado em triplo e o prestado no grupo C, em dobro.

Com todas essas exigências, a carreira diplomática torna-se, como costumo afirmar, uma maratona, não uma corrida de 100 metros rasos. Pior: nessa maratona, ao contrário do que ocorre com a competição olímpica, há barreiras, e muitas. É reconfortante saber, no entanto, que o tempo pode ser cruel com a promoção de alguns diplomatas no curto prazo, que muitas vezes não têm seu merecimento reconhecido como acham que deveriam, mas, no longo prazo, todos os que trabalham bem e seriamente acabam ascendendo na carreira. Poucos conseguem, no entanto, chegar ao último degrau – o de Ministro de Primeira Classe, chamado informalmente de Embaixador – sem esperar ao menos cerca de 30 anos. É preciso, pois, ter paciência, trabalhar com seriedade e não achar que a satisfação profissional ocorre somente quando se chega ao topo da carreira.

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