Discuti-se a possibilidade de aplicação analógica, a determinados empregados rurais, do descanso de 10 minutos a cada período de 90 minutos trabalhados, previsto no artigo 72 da CLT para os empregados em serviços de mecanografia, uma vez que a Norma Regulamentadora nº 31 do Ministério do Trabalho e Emprego, apesar de prever o direito destes empregados ao descanso, não especifica o tempo de duração da pausa.
Assim dispõe o artigo 72 da CLT, verbis: Art. 72 da CLT – Nos serviços permanentes de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), a cada período de 90 (noventa) minutos de trabalho consecutivo corresponderá um repouso de 10 (dez) minutos não deduzidos da duração normal de trabalho.
Vale observar que o artigo 7º, inciso XXII, da CR/88 garante aos trabalhadores urbanos e rurais a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”.
Nesse prumo, o art. 13 da Lei nº 5.889/73 (que institui normas reguladoras do trabalho rural), determina que “nos locais de trabalho rural serão observadas as normas de segurança e higiene estabelecidas em portaria do ministro do Trabalho e Previdência Social”.
Com a edição da Portaria nº. 86, de 3 de março de 2005, do MTE, que “aprova a Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura”, entrou em vigor a Norma Regulamentadora nº 31, que estabelece medidas de segurança e higiene para esses profissionais.
Nestes dois itens estão previstas pausas para descanso do trabalhador:
31.10.7. Para as atividades que forem realizadas necessariamente em pé, devem ser garantidas pausas para descanso. (…)
31.10.9. Nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica devem ser incluídas pausas para descanso e outras medidas que preservem a saúde do trabalhador.
Parcela da jurisprudência entende que não há que se falar em aplicação analógica do artigo 72 da CLT como forma de suprir a ausência de disposição expressa acerca do tempo de descanso a ser usufruído pelo empregado rural, pois não há dispositivo legal que obrigue o empregador ao pagamento, como horas extras, das pausas suprimidas.
Para essa linha de pensamento, apesar de se reconhecer a analogia como forma de suprimento de lacuna no ordenamento jurídico (arts. 4º da LINDB e 8º da CLT), afasta-se a possibilidade de aplicação analógica do artigo 72 da CLT como forma de suprir a ausência de disposição expressa acerca do tempo de descanso a ser usufruído pelo empregado rural pela total ausência de semelhança ou similitude entre as atividades desenvolvidas pelos profissionais da Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura e aquelas desenvolvidas pelos profissionais da mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo).
Mas, prepondera no C. TST entendimento contrário. Em diversos casos, a SDI-1 do TST já se manifestou no sentido de reconhecer ao empregado rural o direito ao intervalo, por aplicação analógica do art. 72 da CLT. Com efeito, o artigo 4º da LICC dispõe que, “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
Também o artigo 8º da CLT autoriza a analogia como fonte do direito: Art. 8º da CLT – As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
Desse modo, segundo entendeu o TST (E-RR-912-26.2010.5.15.0156, Relator Ministro: João Oreste Dalazen, Data de Julgamento: 05/12/2013, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 19/12/2013), ainda que a NR-31 não estabeleça a duração dos intervalos para os trabalhadores que desenvolvem suas atividades nos moldes previstos nos itens 31.10.7 e 31.10.9, não desobriga o empregador do cumprimento da norma. Do contrário, a garantia do descanso trazida pela norma se revelaria inócua simplesmente por falta de disposição expressa acerca do tempo de duração do intervalo, ficando o empregado, a parte hipossuficiente da relação jurídica, sem a proteção necessária à sua saúde e segurança no trabalho.
Nessas condições, encontra respaldo legal a condenação da reclamada ao pagamento correspondente a 10 (dez) minutos, como horas extras, a cada 90 (noventa) minutos de trabalho, pela aplicação da Norma Regulamentadora nº 31 do Ministério do Trabalho e Emprego e analogia com o artigo 72 da CLT.
A toda vista, o fundamento adotado busca resguardar a dignidade do trabalhador e do ser humano, objeto de proteção na ordem constitucional brasileira (artigos 5º e 7º), além de privilegiar a isonomia (artigo 5º, caput, da Constituição Federal), estabelecendo tratamento desigual a trabalhadores rurais que se diferenciam pelo grande esforço físico demandado no trabalho executado.
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