Artigo jurídico: Descriminalização do cultivo da cannabis para uso próprio. Por José Carlos

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Por: Projeto Exame de Ordem | Cursos Online

Descriminalização do cultivo da cannabis para uso próprio. A sugestão voltou a ser objeto de discussão no Senado Federal. O que você acha sobre a possibilidade da legalização?

A referida sugestão voltou a ser discutida pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal. A ideia foi do cidadão Gabriel Lima, que propôs liberar o uso da maconha para o fim recreativo. Em três dias, foram alcançadas 20 mil assinaturas, corroborando a ideia ao nível de sugestão legislativa. Quando a ideia vira sugestão, um senador estuda o assunto e o remete para a comissão decidir se encampa o tema em um projeto de lei.
A proposta visa a atender a qualidade de vida dos consumidores da planta e tem como objetivo conseguir o que a longo prazo será inevitável: a descriminalização do cultivo para uso próprio.
Segundo a proposta, haverá vantagens tanto econômicas quanto políticas.
Algumas vantagens apontadas para a descriminalização do cultivo da planta para uso próprio:
a) O Governo poderia tributar com impostos, e isso traria muito dinheiro para os cofres públicos, tirando do traficante.
b) O cidadão de bem não precisaria se envolver com tráfico para fazer o uso recreativo da planta.
c) Haveria a economia de milhões com custos processuais, entre outras vantagens.
 
Assim, o combate ao tráfico de “maconha” poderá gerar renda para o governo e consecutivamente disponibilizar melhorias para a população com o dinheiro arrecadado de forma lícita.
Nesse viés, com a legalização, o Estado poderia aplicar o imposto adquirido com sua venda para melhorar os serviços de saúde, a Previdência Social etc.
Resta a incógnita: a legalização da maconha poderia ser o caminho para a legalização de outras drogas mais potentes? A legalização poderá fomentar o aumento do consumo da cannabis no país?
A consulta pública sobre o tema está sendo realizada pelo Senado Federal. Assim, você poderá opinar sobre a matéria no site do Senado (será possível enquanto a matéria estiver em trâmite). Confira AQUI o link para que você possa opinar a respeito!
Até o presente momento, a votação está apresentando os números de 34.261 votos a favor da descriminalização e 2.592 votos contrários à sugestão. (Resultado apurado em 17/07/2017 às 22:29).
Cabe destacar que, atualmente, a conduta do uso de drogas continua sendo figura típica, estando prevista no artigo 28 da Lei n. 11.343, de 2006, conforme se vê:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;

II – prestação de serviços à comunidade;

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Segundo a Lei de combate às drogas, não houve a descriminalização da posse de droga para consumo próprio, mas apenas a diminuição da carga punitiva (o usuário não pode ser preso), pois a nova lei, mesmo tratando mais brandamente o usuário, manteve a conduta como crime, fixando-lhe, dentre outras medidas, a pena de medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento de que a conduta tipificada no art. 28 da Lei n. 11.343/2006 sempre foi e continua sendo crime. Para o pretório excelso, o que houve com o advento do diploma normativo foi a despenalização da conduta do usuário que porta drogas para consumo pessoal.
Em voto proferido no julgamento do Recurso Extraordinário 430.105-9/RJ, em que fora relator, o Ministro Sepúlveda Pertence apresentara o entendimento de que as alterações verificadas na punição de conduta de posse de drogas para consumo são resultados de um processo de despenalização. Nesse sentido: STF – RE 430105 QO – RJ – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – J. 13-02-2007 (Informativo n. 456 do STF).
Quanto à legalização das drogas, existe forte posição que defende essa linha,  fundamentando que é direito do cidadão a manifestação de suas escolhas, desde que,  claro, não interfira na esfera jurídica de outrem.
Com fulcro no princípio da alteridade, se a conduta só faz mal à própria pessoa, não existirá punição penal. Dessarte, sem que a conduta transcenda a figura do autor e se torne capaz de ferir interesse do outro (altero), é impossível ao Direito Penal puni-la.
Ademais, dentro dessa perspectiva, invoca-se que o Estado deve ser mantenedor das liberdades e garantias individuais das pessoas.
Nesse sentido, o posicionamento da juíza de Direito aposentada Maria Lúcia Karam (Fonte: http://www.leapbrasil.com.br/site/wp-content/uploads/2017/03/10_Drogas-legislacao-brasileiraf – Drogas: legislação brasileira e violações a direitos fundamentais). Vejamos:

Mantendo a criminalização da posse para uso pessoal, a Lei 11.343/2006 repete as violações ao princípio da lesividade e às normas que, assegurando a liberdade individual e o respeito à vida privada, se vinculam ao próprio princípio da legalidade, que, base do Estado de direito democrático, assegura a liberdade individual como regra geral (…). (grifei)

Arremata ainda que: ‘A simples posse para uso pessoal das drogas qualificadas de ilícitas, ou seu consumo em circunstâncias que não envolvam um perigo concreto, direito e imediato para terceiros, são condutas que não afetam nenhum bem jurídico alheio, dizendo respeito unicamente ao indivíduo e à sua intimidade e as suas opções pessoais.’ Não estando autorizado a penetrar no âmbito da vida privada, não pode o Estado intervir sobre condutas de tal natureza. Enquanto não afete concretamente direitos de terceiros, o indivíduo pode ser e fazer o que bem quiser. (grifei)

 
Ainda sobre a legalização, o Supremo Tribunal Federal deve julgar sobre o tema, uma vez que tramita no pretório excelso um processo no qual um cidadão recorreu contra punição por porte de drogas.
Em 2011, quando o tema entrou no Supremo, a Procuradoria-Geral da República posicionou-se contra a descriminalização. Em parecer, declarou que a lei protege a saúde pública, “que fica exposta a perigo pelo porte da droga proibida, independentemente do uso ou da quantidade apreendida”, pois contribui para a propagação do vício na sociedade.
No caso, um homem foi condenado a dois meses de prestação de serviço à comunidade por ter sido flagrado com três gramas de maconha. A Defensoria Pública de São Paulo, que recorreu contra a punição, alegou que a proibição do porte para consumo próprio ofende os princípios constitucionais da intimidade e da vida privada.
A Defensoria visou anular condenação por porte de maconha.
Como o caso teve repercussão geral reconhecida, a decisão deve impactar outros processos em todo o país. Ainda seria preciso estabelecer regras sobre produção, venda e a quantidade que configura “uso pessoal”.

Diversas entidades entraram como amicus curiae no processo, como a Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia (CBDD), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim), o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), a Conectas Direitos Humanos e a Pastoral Carcerária.

Em 2013, ex-ministros da Justiça dos governos Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) enviaram um ofício ao ministro Gilmar Mendes, relator do RE 635.659, defendendo a descriminalização do porte de droga para uso próprio. Assinaram o documento Márcio Thomaz Bastos, Nelson Jobim, José Carlos Dias, José Gregori, Aloysio Nunes, Miguel Reale Junior e Tarso Genro.

No ofício, os ex-ministros argumentaram que “cada cidadão tem liberdade para construir seu próprio modo de vida, desde que respeite o mesmo espaço dos demais” e que “não é legítima a criminalização de comportamentos praticados dentro da esfera íntima do indivíduo que não prejudiquem terceiros”.

Na oportunidade, foi classificada a guerra às drogas “um fracasso”, pois “tratar o usuário como cidadão, oferecendo-lhe estrutura de tratamento, por meio de políticas de redução de danos, é mais adequado do que estigmatizá-lo como criminoso”. Fundamentam ainda as experiências bem-sucedidas, como em Portugal, Espanha, Colômbia, Argentina, Itália e Alemanha.

Por fim, devemos esperar qual será a posição do legislativo e do judiciário brasileiro. O tema é hodierno e faz parte do cotidiano do povo brasileiro.

 

Por óbvio, à luz da democracia, a sociedade brasileira deverá ser consultada sobre o assunto, pois devemos saber se a legalização da maconha está condizente com os costumes e opinião popular dos brasileiros, ou se, pelo contrário, será uma afronta ao sentimento dos cidadãos pátrios


José-CarlosJosé Carlos – Professor Universitário e Advogado, com especialização em Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Ambiental e Recursos Hídricos. Doutorando em Direito Penal pela Universidade de Buenos Aires (UBA). Professor Titular de Direito Penal e Direito Processual Penal na Universidade Católica de Brasília (UCB). Professor Titular das Faculdades Integradas da União Educacional do Planalto Central (FACIPLAC) nas áreas de Direito Penal, Processo Penal e Laboratório de Prática Jurídica. Participante de bancas examinadoras de Concursos Públicos.
 
 


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