Assédio Processual

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Assédio processual pode ser entendido como a atuação da parte que, por meio do abuso do direito de defesa, pratica atos atentatórios à dignidade da justiça, sem observar os deveres de lealdade e boa-fé processuais, de modo que tais atos proporcionam excessiva demora na prestação jurisdicional, com o propósito deliberado e ilícito de obstruir ou retardar a efetiva prestação jurisdicional ou prejudicar a parte contrária, bem como minar a resistência dessa última, até que ela fique desestimulada e, quem sabe, desista do processo.

O assediante, ao atuar dentro da relação jurídica processual, possui objetivos escusos, quais sejam, retardar a prestação jurisdicional e/ou prejudicar dolosamente a parte contrária, por meio do exercício reiterado e abusivo das faculdades processuais, mas o faz geralmente sob a dissimulada alegação de estar exercendo o seu direito de contraditório e de ampla defesa.

Com efeito, é uma modalidade de abuso do direito ao contraditório e à ampla defesa, pois há deliberada utilização de sucessivos instrumentos procedimentais lícitos com a única finalidade de alongar desarrazoadamente a solução da controvérsia e, assim, atingir a esfera psicológica da parte adversa. O Tribunal Superior do Trabalho já enfrentou o tema:

ASSÉDIO PROCESSUAL 4.1. O assédio processual consiste em modalidade de abuso do direito ao contraditório e à ampla defesa. É ideia que descende da construção dogmática do assédio moral, exigindo gravidade substancial, extraída de comportamento reiterado do litigante, capaz, inclusive, de gerar efeitos sobre o ânimo de seu oponente, para além de ferir a própria autoridade do Poder Judiciário. Assim, caracteriza-se pela deliberada utilização de sucessivos instrumentos processuais lícitos, com a finalidade de alongar, desarrazoadamente, a solução da controvérsia e, de tal modo, atingir a esfera psicológica da parte adversa. 4.2. Como toda espécie de abuso de direito, o assédio processual é considerado ato ilícito no ordenamento, o que, somando-se à existência do dano moral, gera o dever de indenizar. Nessa direção, confira-se a dicção dos arts. 187 do Código Civil e 16 do CPC. […] (RO-293-76.2012.5.09.0000, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Data de Julgamento: 02.02.2016, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 12.02.2016)

O Superior Tribunal de Justiça, por meio de sua 3ª Turma, também definiu o ilícito de assédio processual. Ficou definida a seguinte tese: “O ajuizamento de sucessivas ações judiciais, desprovidas de fundamentação idônea e intentadas com propósito doloso, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa, o denominado assédio processual”. A tese foi desenvolvida no caso pela ministra Nancy Andrighi, que, em voto-vista, divergiu do relator, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

“Embora não seja da tradição do direito processual civil brasileiro, é admissível o reconhecimento da existência do ato ilícito de abuso processual, tais como o abuso do direito fundamental de ação ou de defesa, não apenas em hipóteses previamente tipificadas na legislação, mas também quando configurada a má utilização dos direitos fundamentais processuais”, decidiu a ministra, conforme consta na ementa do acórdão (REsp 1.817.845, data do julgamento: 10/10/2019).

O abuso do direito fundamental de acesso à justiça em que incorreram os recorridos não se materializou em cada um dos atos processuais individualmente considerados, mas, ao revés, concretizou-se em uma série de atos concertados, em sucessivas pretensões desprovidas de fundamentação e em quase uma dezena de demandas frívolas e temerárias”, anotou a Ministra em seu voto.

O tema guarda relação com a chamada demora patológica do processo. A demora fisiológica é aquela relacionada à duração normal do processo, que, para ser resolvido, depende de um procedimento que toma necessariamente certo tempo, em razão do devido processo legal. Quando essa duração fisiológica ou normal do processo é excedida, surge a chamada demora patológica do feito. A respeito do tema, José Roberto dos Santos Bedaque (2003, p. 21-22) esclarece:

“Ainda que não se trate de duração patológica, o processo cognitivo, pela sua própria natureza, demanda tempo para efetivação dos atos a ele inerentes, possibilitando a cognição plena da relação substancial e a efetivação do contraditório. […]. O simples fato de o direito permanecer insatisfeito durante todo o tempo necessário ao desenvolvimento do processo cognitivo já configura dano ao seu titular. Além disso, acontecimentos podem também se verificar nesse ínterim, colocando em perigo a efetividade da tutela jurisdicional. Esse quadro representa aquilo que a doutrina identifica como o dano marginal, causado ou agravado pela duração do processo”.

Considerando que o assédio processual atinge principalmente a saúde psicológica da vítima, o dano a ser reparado, em regra, é de natureza moral. É preciso, no entanto, chamar a atenção para o fato de que a mera utilização de expedientes processuais de forma protelatória não configura, por si só, assédio processual. Esse somente se caracteriza se a parte agir em desconformidade com o dever jurídico de lealdade processual, na forma estatuída pelo art. 8º do CPC.

Isso porque o assédio processual pressupõe a configuração de dolo da parte no entrave no andamento do processo em nítida deslealdade processual. Logo, é preciso que fique evidenciado o nítido intuito de protelar o andamento do feito, abusando no exercício do seu direito ao contraditório e à ampla defesa.

Por fim, a verificação do assédio processual, modalidade de litigância de má-fé, deve ter em conta as peculiaridades do caso concreto, considerando a potencialidade da conduta praticada, a reiteração da conduta, a seriedade das argumentações apresentadas, a fase processual, o objetivo a ser alcançado e a repercussão dos atos protelatórios na parte adversa.

Referências:

BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003.

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