Considerações sobre a apreensão da arma de fogo no crime de porte ilegal

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15 de Setembro de 2017

“Professor, existe o crime de porte de arma sem a apreensão da arma de fogo?”
Em regra, não. Na verdade o que existe é o crime de porte de arma de fogo (art. 14 ou 16 do Estatuto do Desarmamento) sem a perícia da arma, pois os crimes do Estatuto são de perigo presumido, sinônimo de perigo abstrato, em que o risco é presumido pelo legislador. Sendo assim, o sujeito pode ser condenado pelo crime de porte ainda que a perícia não tenha sido realizada, pois as armas de fogo no Brasil são presumidamente aptas. Reforça esse raciocínio o bem jurídico tutelado pela norma, qual seja a incolumidade pública.
“Mas professor, eu vi um julgado no Dizer o Direito que dispõe que a apreensão é desnecessária…”
Sim, inclusive está na página 587 do Vade Mecum de Jurisprudência de 2016. Ocorre que houve erro na minuta do resumo, que deveria apontar apenas a perícia como desnecessária. O caso concreto envolve um sujeito surpreendido no interior do estado de Goiás transportando uma arma de fogo dentro de sua caminhonete. Ele foi preso em flagrante e a arma foi apreendida. Discutia-se apenas se a perícia era ou não necessária. E os senhores sabem que a perícia é prescindível (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1294551/GO, julgado em 07/08/14).
“Ok, professor, mas há outro julgado no STJ que inclusive faz menção a uma decisão do STF…”
Vamos lá. No HC 170543-CE, que cita decisão do STF, há arma apreendida. A arma foi localizada dentro de um veículo e nenhum dos ocupantes assumiu a propriedade dela. Todos foram presos, na figura do porte compartilhado (crime de porte em concurso de pessoas, ainda que diante de uma única arma, quando todos têm condição de rapidamente utilizá-la). Na decisão do STF (HC 104347-RS), há erro na minuta da ementa, pois o caso não versa sobre crime de porte, mas sim sobre delito de roubo majorado (todos os senhores sabem que existe roubo majorado sem a apreensão da arma de fogo, desde que o seu emprego possa ser demonstrado por outros meios). Onde foi lançado “…A apreensão da arma de fogo no afã de submetê-la a perícia para concluir pela consumação do crime de porte ilegal do artefato, tipificado no art. 14 da Lei nº 10.826/03, não é necessária nas hipóteses em que sua efetiva utilização pode ser demonstrada por outros meios…”, deveria ter sido minutado “…A apreensão da arma de fogo no afã de submetê-la a perícia para concluir pela majorante do roubo, prevista no § 2º, inc. I, do art. 157 do CP, não é necessária nas hipóteses em que sua efetiva utilização pode ser demonstrada por outros meios…”.
“Mas essa decisão do STF (HC 104347-RS) cita inclusive outra decisão do mesmo Tribunal…”
Sim, a proferida no julgamento do HC 96099-RS, que versa sobre caso em que existe arma apreendida, discutindo-se apenas a validade da perícia, que foi feita pelos próprios policiais.
“Professor, então, na verdade, houve equívoco na elaboração da ementa do STF, que contagiou, equivocadamente, o STJ?”
Sim, é isso aí!
“Mas, professor, para terminar: poderia em alguma hipótese haver o crime de porte ilegal sem a apreensão da arma?”
Como existe homicídio sem cadáver, pode haver porte ilegal sem apreensão da arma, quando, de forma inequívoca, houver a demonstração de que a arma foi portada. Mas isso apenas a título de ilustração, pois são casos de difícil visualização. Como explicado, também não há julgados nesse sentido. Exemplo: um sujeito é filmado entrando no carro com um revólver nas mãos. É surpreendido horas depois pela polícia, mas no carro existe apenas o cano de um revólver. O cano (que não é acessório) é apreendido e a perícia demonstra que é não só compatível, mas idêntico ao da arma exibida nas imagens. No caso, no meu entender, poderíamos falar em porte, pois há materialidade. Se não houvesse a apreensão do cano, não poderíamos cogitar a existência do delito por duas razões: uma de ordem prática e outra de ordem técnica: 1) é muito comum a utilização de simulacros nos assaltos; 2) o que se presume é o funcionamento da arma, e não a sua existência.
Fernando Cocito 
Delegado de Polícia da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), o professor Fernando Cocito já atuou na Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (DECO) e Delegacia de Repressão a Roubos e Furtos (DRF). Na DECO, presidiu o primeiro enfrentamento ao PCC da capital da República, que culminou na deflagração da “Operação Tabuleiro”, em novembro de 2014. Na DRF, atuou na “Operação Hostibus”, que prendeu os responsáveis por 36 explosões de terminais de autoatendimento bancário em 2015. Professor fundador da ESUP (Escola Superior de Polícia) da PCDF. Há dez anos professor de Direito Penal e Legislação Penal Especial de cursos preparatórios para concursos de Brasília.
 



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