Imputar Feminicídio De Grávida E Provocação De Aborto, Concomitantemente, É Bis In Idem?

- Isso foi analisado pelo STJ e vai cair na sua prova!

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16 de outubro3 min. de leitura

Olá pessoal, tudo certo?

Antes de respondermos à pergunta título do presente post, é imprescindível compreender o caso concreto analisado pelo Superior Tribunal de Justiça. Tratava-se de situação em que o juízo de 1º grau exarou decisão de pronúncia em desfavor do réu, indicando a possível prática do crime tipificado no art. 121, § 2º, I, IV e VI, c/c § 2º-A, I, c/c § 7º, I; art. 125 e art. 211 (duas vezes), c/c art. 61, II, alínea b, na forma do art. 69, todos do Código Penal.

A defesa, ao impugnar tal decisão através de Recurso em Sentido Estrito, logrou parcial êxito, uma vez que o respectivo Tribunal de Justiça determinou o afastamento do delito de provocação de aborto (art. 125 do CPB) da pronúncia, mantendo os demais termos da decisão.

De acordo do o Tribunal, “o delito de aborto configura bis in idem com a qualificadora do feminicídio. Vale lembrar, inicialmente, que o feminicídio reúne indícios suficientes para ser acolhido pela decisão de pronúncia, e isso se dá exatamente porque é uma qualificadora de ordem objetiva – vai incidir sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar propriamente dita -, e existem indicativos de que o crime tenha ocorrido na forma descrita na denúncia, ou seja, a vítima era ex-namorada do recorrente, sendo certo que deste relacionamento sobreveio a gravidez. A majorante incidiu justamente porque o delito foi cometido contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em observância ao estado gestacional da vítima, protegendo-a, portanto, por demonstrar maior vulnerabilidade. Como se vê, a vítima, sua ex-namorada, estava em estado gestacional, fato do qual o recorrente tinha pleno conhecimento e, ao que tudo indica, pretendia cessá-la, pois não queria assumir a paternidade. No entanto, a admissibilidade da causa majorante do feminicídio (perpetrado durante a gestação da vítima) acarreta bis in idem se, igualmente constar da imputação o crime conexo de aborto, por não ser possível, ao perpetrar o feminicídio, o agente incidir na conduta de feminicídio qualificado pelo estado gestacional da vítima e também responder pelo crime de aborto, pois ao ceifar a vida ou tentar ceifar a vida de mulher grávida seria apenado duas vezes: pela majorante e pelo crime de aborto. Assinale-se que é juridicamente inaceitável eventual condenação do recorrente pelo crime de homicídio de mulher, praticado “durante a gestação” e, posteriormente, pelo crime de aborto, porque receberia dupla apenação (uma pela majorante e outra pelo crime de aborto)”.

PEDRO, ESSE ENTENDIMENTO PREVALECEU NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA?

Não! De acordo inclusive com outros julgados, o STJ vem compreendendo que, enquanto o art. 125 do CP tutela o feto enquanto bem jurídico, o crime de homicídio praticado contra gestante, agravado pelo art. 61, II, h, do Código Penal protege a pessoa em maior grau de vulnerabilidade, raciocínio aplicável ao caso dos autos, em que se imputou ao acusado o art. 121, § 7º, I, do CP, tendo em vista a identidade de bens jurídicos protegidos pela agravante genérica e pela qualificadora em referência (vide HC 141.701/RJ[1]).

Como bem destacado pelo Min. Relator, no crime de aborto provocado por terceiro, apesar de ser necessário que a vítima esteja grávida, o bem tutelado pelo ordenamento jurídico é a vida do feto (CC 104.842/PR) e no homicídio contra a gestante, o Código Penal protege quem está mais vulnerável” (Resp 1.672.789/SP).

Espero que tenham entendido! Isso vai cair em prova! Vamos em frente!

 

Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!

Vamos em frente.

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

 

 

 

[1] HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO CONTRA GESTANTE. ABORTO. OCULTAÇÃO DE CADÁVER PARA ASSEGURAR A IMPUNIDADE DE OUTRO CRIME. PENA-BASE. AGRAVANTES. ART. 61, II, “B” E “H”, DO CÓDIGO PENAL. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CONFISSÃO ESPONTÂNEA CONFIGURADA. ATENUANTE DA MENORIDADE. VIOLAÇÃO AO MÉTODO TRIFÁSICO. NOVA DOSIMETRIA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Por ocasião da análise das circunstâncias judiciais estabelecidas no art. 59 do Código Penal, o Magistrado tem o dever de justificar a majoração da pena-base, fundamentando-a em elementos concretos. 2. Não há bis in idem quanto à incidência da agravante do art. 61, II, “h”, do Código Penal no crime de homicídio contra gestante e a condenação pelo crime de aborto, porquanto as duas normas visam tutelar bens jurídicos diferentes: a agravante tutela pessoas em maior grau de vulnerabilidade e o aborto diz respeito ao feto. 3. A jurisprudência desta Corte já decidiu que é inviável a análise de elemento subjetivo do crime na via estreita do habeas corpus, por demandar acurado exame probatório. Assim, inviável o conhecimento do writ com relação ao alegado bis in idem quanto à incidência da agravante do art. 61, II, “b”, no crime de ocultação de cadáver. 4. Este Tribunal tem entendido que a confissão espontânea, ainda que parcial ou qualificada, deve ser reconhecida, de modo a ensejar a atenuação da pena. 5. O Código Penal estabeleceu o método trifásico para aplicação da pena, de modo que as atenuantes devem ser analisadas juntamente com as agravantes, na segunda fase da dosimetria. Evidente o constrangimento ilegal quando o Tribunal aplica a atenuante da menoridade penal após o estabelecimento da pena total definitiva. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para reduzir a pena imposta ao paciente. (HC 141.701/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 01/12/2016).

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