Justa causa duplicada: O que danado é isso?

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04 de setembro2 min. de leitura

Olá pessoal, tudo certo?

Assim como em nosso último texto, vamos trazer outro tema relacionado umbilicalmente à Lei de Lavagem de Capitais, em uma perspectiva mais atrelada ao direito processual penal.

Vale ressaltar que não se trata de tema inédito. Ao contrário, ele recorrentemente é abordado em provas de concurso público, mas ainda há um número significativo de candidatos que desconhecem ou ainda ficam inseguros quando o tema é justa causa duplicada.

Em primeiro lugar, devemos compreender o que significa justa causa. Trata-se de expressão inserida no ordenamento jurídico positivado a partir da Lei 11.719/08, ao inserir o art. 395, III do Código de Processo Penal.

A doutrina, no entanto, já trabalhava há muito com essa perspectiva. Nesse sentido, vale lembrar as lições do professor Afrânio Jardim, membro da Escola Carioca de Processo Penal. Segundo ele, a justa causa nada mais seria que o lastro probatório mínimo demandado para a instauração de um processo penal a partir da propositura de uma ação penal!

Seria, pois, a necessidade de comprovação de indícios de autoria e materialidade da conduta típica imputada na inicial de acusação, evitando-se que o cidadão seja submetido a uma aventura irresponsável e sem critérios, com potencial de estigmatização social, que é o processo criminal.

Bacana, Pedro! A revisão foi válida! Mas e essa coisa aí de “JUSTA CAUSA DUPLICADA”? O que danado é isso?

Sem desespero! Para a compreensão do termo – que é bastante coerente depois que entendemos sua razão de existir – precisamos fazer uma rápida análise dos crimes de lavagem de capitais!

De acordo com o artigo 1º da Lei 9.613/98, o legislador construiu a estrutura dos crimes de lavagem de capitais a partir de uma conduta criminosa antecedente, que funcionará como própria elementar do crime financeiro de ocultação! Sem esse crime antecedente, não há que se falar em lavagem. Há, pois, uma relação de ACESSORIEDADE! É que a lavagem é um crime ACESSÓRIO, diferido, remetido, parasitário, pois a sua tipificação está condicionada a uma infração penal antecedente.

Beleza! Mas não enrola. E a história lá da Justa Causa Duplicada?

Pois é! Acompanha o raciocínio comigo: Se a infração penal antecedente é considerada como uma “elementar do crime de lavagem” e, nos termos do artigo 2º, parágrafo 1º da Lei 9.613/98, para ensejar legitimamente a DENÚNCIA, devem estar presentes lastro probatório mínimo em relação a ela (justa causa), a doutrina concluiu que o legislador, a partir de 2012, expressamente exige a presença DUPLA de “lastro probatório mínimo”, tanto do (i) delito antecedente, como também (ii) do próprio crime de lavagem de capitais!

Ora, se “lastro probatório mínimo” é igual à justa causa e essa é exigida de maneira dúplice, está aí a razão pela qual, no crime de LAVAGEM DE CAPITAIS, exigir-se a chamada JUSTA CAUSA DUPLICADA, compreenderam? De toda forma, vale conferir a lei:

Art. 2º § 1o A denúncia será instruída COM INDÍCIOS SUFICIENTES DA EXISTÊNCIA DA INFRAÇÃO PENAL ANTECEDENTE, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

Em relação à justa causa referente à lavagem, ela é lógica do sistema processual penal, por isso não é necessária previsão na lei especial!

Essa expressão é muito relevante e, inclusive, vem sendo veiculada em votos dos Ministros e em acórdãos dos Tribunais Superiores. Exemplifica-se isso a partir de um trecho do voto do Ministro do STJ, Antônio Saldanha Palheiro, no julgamento do Recurso em Habeas Corpus 124.607/PR, em que registrou que a “denúncia não preenche a justa causa duplicada exigida para o delito de lavagem de ativos, seja por não carrear elementos suficientes da prática dos crimes antecedentes pelo imputado, mas também porque deixou de amparar a denúncia com indícios suficientes de autoria quanto ao delito de lavagem, restando induvidosa a inexistência dos indícios de autoria e materialidade delitiva a viabilizar o desencadeamento da ação penal, ou seja, falta justa causa ao início da persecução penal”.

Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!

Vamos em frente.

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

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