Natureza do vínculo entre advogados e a OAB e o direito fundamental à liberdade de associação profissional

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4Introdução

Encontra-se pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) o Recurso Extraordinário (RE) 647.885 – Repercussão Geral, proposto pelo Ministério Público Federal, por intermédio do qual se argui a inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 37 da Lei Federal 8.906/94 – Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB). O Parquet argumenta que a suspensão do exercício profissional até o efetivo pagamento das anuidades previstas no Estatuto da Advocacia vulnera o art. 5º, XIII, da Constituição, ao atentar contra a garantia constitucional de liberdade de exercício de trabalho, ofício ou profissão, na medida em que a suspensão consistiria em meio coativo de compelir a fazer parte da Entidade e em requisito indevido para limitar a atuação profissional.
Subjaz, a essa discussão, o argumento – a meu ver, completamente equivocado – de que o advogado não pode ser impedido, ainda que esteja inadimplente de suas obrigações financeiras para com a Ordem, pois poderia ancorar-se em seu direito fundamental à liberdade de manter-se (ou não) associado e em seu direito fundamental ao livre exercício profissional. Demonstrarei, contudo, que o princípio da liberdade de associação é de todo inaplicável a este caso, uma vez que a OAB não possui caráter associativo. Sua natureza jurídica é sui generis: é entidade independente do Poder Público – embora realize função pública –, dotada de autonomia orçamentária, regulamentar e administrativa, cabendo-lhe, por autorização legal, controlar os requisitos de ingresso e permanência na carreira. Em decorrência, o vínculo que une os advogados à OAB – a inscrição – não tem caráter associativo, mas de habilitação e qualificação para o exercício da advocacia.
O inadimplemento da anuidade exigida pela OAB, com efeito, trata-se de desvio ético-disciplinar que acarreta a perda de um dos requisitos essenciais não só para a inscrição inaugural nos quadros da Ordem, como também para o exercício da advocacia: a idoneidade moral (art. 8º, VI – EAOAB). O Estatuto prevê um princípio deontológico que impõe conduta de cumprimento das obrigações para com a Entidade. Obviamente, ninguém é obrigado a pertencer aos quadros da OAB senão para obter a habilitação necessária para executar a atividade advocatícia. Ao advogado é lícito requerer sua baixa, mas a mesma só produzirá efeitos desde que ele tenha quitado seu passivo, de modo que ele continua obrigado a adimplir as obrigações pregressas.
A decisão a ser proferida pelo STF no RE supracitado deverá levar em conta que: 1) os conselhos federais de fiscalização profissional possuem caráter autárquico, e não associativo ou sindical; 2) a OAB possui natureza jurídica singular, diferenciando-se das associações de classe, dos sindicatos e mesmo dos demais conselhos de fiscalização, em virtude da proeminente relevância atribuída ao advogado para a administração da Justiça estatal; 3) as contribuições exigidas pela OAB não possuem natureza tributária nem se reduzem a contributo sindical – consoante entendimento do próprio egrégio STF; 4) as sanções de suspensão e exclusão aplicadas aos inadimplentes não representam meios de cobrança, mas consequências da perda da idoneidade moral do advogado, vez que este cometeu infração ético-disciplinar tipificada no Código de Ética; 5) a relação jurídica entre a OAB e seus membros não é associativa, dado que a inscrição na Ordem é pressuposto para a habilitação para o exercício profissional e para a qualificação exigida pelo art. 5º, XIII – CF; e, finalmente, 6) a incidência do princípio da liberdade de associação profissional é impraticável em se tratando da normatização do peculiar vínculo jurídico entre advogados e OAB. Por todas essas razões, é induvidoso que a OAB está legal e constitucionalmente amparada para suspender, e eventualmente excluir, de seus quadros os membros que descumpram os deveres compatíveis com o ofício da advocacia.
Cumpre aclarar a natureza do vínculo entre advogados e OAB, a fim de que se possa subsidiar a discussão da questão submetida ao crivo do Supremo, tendo em vista o sistema de princípios constitucionais que garante a liberdade profissional e a liberdade de associação profissional (2). Previamente, contudo, será essencial expor minhas premissas de investigação, que partem da constatação da própria natureza jurídica da OAB enquanto entidade independente revestida de caráter público, do status da anuidade cobrada e das sanções aplicadas (1).

______________
1 In verbis: “Art. 37. (…):
§1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo.
§2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que se satisfaça integralmente a dívida, inclusive com a correção monetária.
(…)”.
Dentre as infrações disciplinares que ensejam suspensão, está definido “deixar de pagar as contribuições, multas e preços de serviços devidos à OAB, depois de regularmente notificado a fazê-lo” (art. 34, XXIII – EAOAB).
Fonte: Migalhas
 

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