No Processo do Trabalho, muitas empresas que foram condenadas em verbas trabalhistas inadimplidas não possuem qualquer tipo de patrimônio livre e desembaraçado. Logo, revela-se uma dificuldade substancial encontrar bens para atender ao crédito trabalhista.
No entanto, várias dessas empresas possuem créditos para receber perante a Fazenda Pública. São direitos que normalmente decorrem de contratos administrativos. O ente ou a entidade pública possuem débitos que, por diversas vezes, vencem sem o devido pagamento.
Considerando que esses valores já eram exigíveis pelas empresas, muitas delas oferecem esses créditos para penhora na execução trabalhista.
Nesse caso, o juiz pode proceder à penhora do crédito que é devido pela Administração, de maneira que, quando o ente ou a entidade pública promover o pagamento da parcela, os valores sejam depositados em uma conta judicial à disposição do juízo e vinculada ao processo, ao invés de serem pagos à empresa credora.
Segue-se, portanto, a lógica do art. 855 do CPC:
“Art. 855. Quando recair em crédito do executado, enquanto não ocorrer a hipótese prevista no art. 856, considerar-se-á feita a penhora pela intimação:
I – ao terceiro devedor para que não pague ao executado, seu credor;
II – ao executado, credor do terceiro, para que não pratique ato de disposição do crédito.”
Ocorre que, em vários processos, o juiz vai além do mencionado e não determina somente a penhora do crédito, mas o pagamento efetivo dele. Desse modo, o magistrado acaba autorizando o bloqueio de valores diretamente na conta da Fazenda Pública. Tal decisão gera significativo impacto nas finanças públicas.
Nesse panorama, surgiu uma forte corrente contrária. Essa corrente entende que o bloqueio de contas públicas afeta diretamente a gestão das finanças do ente ou da entidade. Os valores já poderiam estar comprometidos para atendimento de necessidades da coletividade, as quais ficarão frustradas por falta de recursos. Portanto, haveria violação do princípio da separação de poderes
Além disso, existiria vulneração do regime de precatórios e da segurança jurídica. Ora, normas constitucionais e legais especificam o procedimento para cobrança de valores devidos pela Fazenda Pública. E não existe autorização constitucional ou legal para o bloqueio na hipótese ventilada por essas decisões.
Ressalte-se, ainda, que a Fazenda Pública estaria privada de discutir a razão pela qual não fez o pagamento. Seu direito ao contraditório e à ampla defesa restariam prejudicados.
Não bastasse o exposto, não haveria competência da Justiça do Trabalho para examinar a cobrança de dívidas da Fazenda Pública com as empresas prestadoras de serviços.
Violado estaria, segundo essa corrente, o princípio do juiz natural.
O Supremo Tribunal Federal decidiu a questão no julgamento da ADPF 485, fixando a inconstitucionalidade do procedimento, conforme se nota na seguinte tese firmada:
“Verbas estaduais não podem ser objeto de bloqueio, penhora e/ou sequestro para pagamento de valores devidos em ações trabalhistas, ainda que as empresas reclamadas detenham créditos a receber da administração pública estadual, em virtude do disposto no art. 167, VI e X, da CF, e do princípio da separação de poderes (art. 2º da CF)”.
O que fazer nesse caso em que a empresa privada deixou de pagar as verbas trabalhistas por inadimplência do Estado que agora não pode mais ser penhorado? O trabalhador nunca receberá e o Estado que se beneficiou da mão de obra embolsa o dinheiro do trabalhador?