Por que África e não Europa?

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22 de Março de 2017

Um dos mitos da carreira diplomática é a dúvida sobre a existência de designação obrigatória de diplomata para trabalhar em determinado país. Trata-se da pergunta mais frequente entre as que me fazem os CACDistas (candidatos ao Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata – CACD).

De cara, a resposta é não. Aliás, as regras de movimentação de diplomatas entre o Brasil e o exterior já foram objeto de artigo anterior[1]. Os leitores devem ter ficado em dúvida, entretanto, sobre como o Itamaraty faz para lotar (designar) profissionais, não apenas diplomáticos, para trabalhar em algumas Embaixadas ou Consulados localizados em países com baixa qualidade de vida.

Mas se ninguém é obrigado a ir morar em nenhum país, o que fazer para tornar uma cidade africana ou asiática tão atraente como uma europeia ou norte-americana? Antes de mais nada, é preciso dizer que a recusa de movimentação (remoção) de qualquer diplomata é permitida, porém, pode gerar consequências.

O principal critério para mudar um diplomata de um destino para outro é o do rodízio entre Postos (representações brasileiras no exterior) de classificações distintas. As Embaixadas, Consulados e Missões do Brasil são classificadas com as letras A, B, C e D. Os Postos A são os melhores, em termos de qualidade de vida e importância política para nossas relações bilaterais, enquanto que os D são os piores, segundo os mesmos critérios.

Ao sair de um Posto A, o diplomata não pode ir imediatamente para outro A. Deverá escolher, portanto, entre B, C ou D. Logo, seu segundo destino será necessariamente em país de qualidade de vida inferior. Ainda assim, é verdade, pode escolher um B, que é melhor que os demais, em termos de conforto. Mas para aqueles que escolherem os C ou D, são oferecidas algumas vantagens exclusivas.

A primeira vantagem é a do tempo de exterior. Para ascender profissionalmente, o diplomata precisa atender a algumas condições. Apenas aqueles que cumprem essas condições podem ser candidatos à promoção. Entre esses pré-requisitos está o tempo de serviço no exterior, ou seja, o tempo que um diplomata serviu (não valem viagens eventuais), morou fora do país trabalhando em um Posto. Os tempos mínimos necessários são: a) dois anos (promoção de Segundo a Primeiro-Secretário); b) cinco anos (promoção de Primeiro-Secretário a Conselheiro); c) sete anos e meio (promoção de Conselheiro a Ministro de Segunda Classe); e d) dez anos (promoção de Ministro de Segunda Classe a Ministro de Primeira Classe, informalmente chamado de Embaixador)[2]. Em Postos C, o diplomata ganha o dobro de tempo de exterior e, nos D, o triplo. Assim, os dois anos de permanência nesses destinos (tempo médio) valem quatro, se o Posto for C, e seis, se o Posto for D.

A segunda vantagem é o auxílio-moradia. Certo percentual do valor do aluguel pago por um diplomata no exterior é reembolsado pelo Ministério das Relações Exteriores, até um certo limite predeterminado. Nos Postos A e B, esse percentual varia de 60 a 80%. Nos C e D, 100%.

A terceira é o salário, que é mais elevado nos Postos mais difíceis. Além disso, como normalmente se gasta menos nesses países, a economia é ainda maior. Lembrando que os salários dos diplomatas no exterior são pagos em dólar norte-americano, em valor definido caso a caso, inclusive levando-se em conta o custo de vida e as condições do país.

A quarta é os afastamentos e vindas periódicas ao Brasil. Nos Postos C e D, o diplomata tem direito a vir com a família a Brasília uma vez por ano, viagem paga pelo Itamaraty. E a cada quatro meses, ganha 15 dias de licença para se ausentar do país em que está vivendo.

Finalmente, os diplomatas que servem em Postos C e D têm direito a pleitear um Posto A (ou B, se preferir) ao final do período de dois anos de permanência. Essa escolha ocorre a partir de opções oferecidas pelo MRE antes ou após esse período, a depender das regras aplicadas no momento de sua remoção.

Com todas as vantagens elencadas acima, torna-se interessante optar-se por um destino em um país mais difícil. Além disso, há fatores menos subjetivos, como o próprio desejo de ir servir em um desses países ou o aumento da chance de ser promovido por conta do esforço pessoal e familiar.

Mas e as consequências da recusa, conforme mencionei acima? Se estiver no exterior, o diplomata que se recusar a ir para um dos destinos que lhe for oferecido fica obrigado a retornar a Brasília. Se já estiver em nosso país, simplesmente cancela-se sua inscrição no plano de remoções. E, claro, as vantagens subjetivas, como o aumento da chance de ser promovido, tornam-se desvantagens.

[1] Cf. http://blog.vouserdiplomata.com/como-se-define-o-destino-de-um-diplomata-no-exterior/

[2] Cf. http://blog.vouserdiplomata.com/como-um-diplomata-vai-de-terceiro-secretario-embaixador/



Prof
.Jean Marcel Fernandes – Coordenador Científico

Nomeado Terceiro-Secretário na Carreira de Diplomata em 14/06/2000. Serviu na Embaixada do Brasil em Paris, entre 2001 e 2002. Concluiu o Curso de Formação do Instituto Rio Branco em julho de 2002. Lotado no Instituto Rio Branco, como Chefe da Secretaria, em julho de 2002. Serviu na Embaixada do Brasil em Buenos Aires – Setor Político, entre 2004 e 2007. Promovido a Segundo-Secretário em dezembro de 2004. Concluiu Mestrado em Diplomacia, pelo Instituto Rio Branco, em julho de 2005. Publicou o livro “A promoção da paz pelo Direito Internacional Humanitário”, Fabris Editor, Porto Alegre, em maio de 2006. Saiba +


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22 de Março de 2017