Princípio da conexão e o e-processo

Nem tudo que está fora dos autos está fora do processo

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27 de novembro2 min. de leitura

    No Direito, sempre foi muito comum o uso do brocardo “quo non est in actis non est in mundo” para definir que não se pode admitir como verdadeiro aquilo que não está inserido no processo.

    É uma decorrência do princípio da escritura. Logo, cabia classicamente às partes buscar trazer os elementos importantes para o processo, de maneira a permitir um retrato da realidade que fosse o mais fiel possível.

    Contudo, com o desenvolvimento do processo judicial eletrônico, houve uma evolução significativa. Além do processo se tornar digital, ele não se limita à mera juntada de documentos digitalizados, porquanto novas tecnologias têm sido incorporadas.

    A imensa quantidade de informações na internet através de hiperlinks, redes e nuvens trazem uma conexão muito maior da realidade processual com o mundo real, rompendo essa barreira formal, estabelecendo uma conexão direta.

    As partes e o juiz podem se valer de diversos meios para identificar elementos da realidade, afastando cada vez mais a lógica de que o que está fora dos autos não está no mundo. Pelo contrário, o que está no mundo possui cada vez mais ligação com o que está nos autos.

    Veja uma aplicação em julgado do Tribunal Superior do Trabalho em que o uso do hiperlink permitiu que a corte constatasse que a parte estava utilizando uma guia de outro processo:

“(…) ATUAÇÃO EX OFFICIO – PRINCÍPIO DA CONEXÃO – DESLEALDADE AO PODER JUDICIÁRIO – CONTEMPT OF COURT. APLICAÇÃO DE MULTA. Com a recente erupção do processo judicial eletrônico, a vetusta parêmia romana “non quod est in actis non est in mundo” passou a ter um contraponto representado pelo princípio da conexão (entre os autos e o mundo) , o qual, segundo um dos seus descobridores “com o processo eletrônico, virtual, conectado à internet, os autos eletrônicos, virtuais, não estão separados, mas ao contrário, conectados ao mundo”. Assim, aproximou-se a realidade endoprocessual, a verdade que está nos autos , e “a verdade que está lá fora” por meios dos “hiperlinks”, redes e nuvens na tempestade de informações constantes do espaço cibernético, o que afeta em certa medida a sacralidade do princípio da escritura referido na parêmia romana. De outro lado, o art. 765 da CLT prevê acentuada atuação inquisitiva do juiz e dos tribunais do trabalho. Assim, utilizando-se do aludido princípio em conformidade com a previsão legal supracitada, procedeu-se a uma análise da Guia GRU apresentada e constatou-se que a mesma pertence ao processo de tribunal diverso. É o que se verifica ao se acessar a consulta processual naquele regional mediante o hiperlink De todo o exposto, constata-se que a parte praticou ato de má-fé processual, extrapolou os deveres éticos de comportamento não temerário no processo e praticou o “contempt of court”, ato atentatório à dignidade do próprio Poder Judiciário, enquanto uma parte orgânica do poder estatal, razão pela qual aplica – se lhe a multa no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa” (RR-802-95.2014.5.15.0088, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 28/10/2016).

    Nesse contexto, o que está na rede mundial (internet) pode estar nos autos processuais. Portanto, as limitações convencionais do processo devem ser afastadas para se reconhecer a existência de um “e-processo”.

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