Hoje vamos tratar de um tema que é bastante adorado pelo examinador em prova de concurso público e ainda traz surpresas a muitos candidatos! Refiro-me às penas restritivas de direito.
As balizas essenciais das penas restritivas de direitos (PRD´s) encontram-se plasmadas no art. 44 do Código Penal, indicando que elas são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando (i) aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo, (ii) o réu não for reincidente em crime doloso e (iii) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.
Vale anotar que o simples fato de o réu ser reincidente não se revela óbice intransponível à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, já que há permissivo legal indicando que o juiz poderá efetuar a conversão, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.
Até aqui, nada de muito novo, apenas revisão. Agora, é preciso avançar e densificar nossas reflexões.
Vamos imaginar que alguém foi beneficiado pela substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, mas – antes de iniciar o cumprimento da restritiva de direitos imposta – diz ao juízo que prefere cumprir a pena privativa de liberdade.
Basta imaginarmos um caso de regime inicial aberto em que o apenado entenda lhe ser menos gravosa essa opção. ISSO É POSSÍVEL?
Para o STJ, NÃO! Essa “reconversão” não pode ocorrer a pedido do condenado, dependendo da observância de requisitos legais (ex.: descumprimento das condições impostas pelo juiz da condenação), não sendo facultado ao condenado requerer a que lhe parece mais cômoda ou conveniente (vide RESP 1.524.484/PE[1]).
É importante que você saiba que, na hora de sua prova, esse é o entendimento dominante e agasalhado pelo Superior Tribunal de Justiça. No entanto, particularmente, entendo que ele não é razoável. Explico.
Ora, se o apenado desejar, de fato, uma reconversão da PRD em PPL, basta que ele não inicie o cumprimento da restritiva de direitos que lhe fora indicado e essa reconversão se materializará. Afinal, o próprio art. 44, § 4o do CPB anota que “a pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta”. Ou seja, se essa for efetivamente a vontade do apenado, estar-se-ia estimulando um comportamento contra legem que poderia ser facilmente evitado, sem qualquer problema legal, afinal a pena privativa de liberdade fixada anterior à conversão deve ser reputada como legítima e proporcional.
Ainda sobre o tema de penas restritivas de direito, vale destacar que o STJ vem reiteradamente asseverando inexistir “direito subjetivo do réu em optar, na substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, se prefere a duas penas restritivas de direito ou uma restritiva de direitos e uma multa” (AgRg no HC n.456.224/SC, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, QUINTA TURMA, Dje 1º/4/2019)”.
Nesse contexto, em precedente recente, a Corte considerou, diante das peculiaridades do caso, que as penas restritivas de direitos impostas pelo Juiz sentenciante (prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária) são as medidas socialmente recomendáveis para a prevenção e reparação do delito de tráfico de drogas, cometido pela paciente não se revelando razoável e pertinente a modificação das penas restritivas de direito fixadas na situação[2].
Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!
Vamos em frente.
Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.
[1] RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PENAL. CONDENAÇÃO À PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. RECONVERSÃO A PEDIDO DO CONDENADO. INADMISSIBILIDADE.
RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
- O art. 33, § 2º, alínea c, do Código Penal, dito violado, apenas estabelece que o condenado não reincidente, condenado à pena igual ou inferior a 4 anos poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. Referido dispositivo legal não traça qualquer direito subjetivo do condenado quanto à escolha entre a sanção alternativa e a pena privativa de liberdade, que é a tese sustentada no recurso.
- A reconversão da pena restritiva de direitos imposta na sentença condenatória em pena privativa de liberdade depende do advento dos requisitos legais (descumprimento das condições impostas pelo juiz da condenação), não cabendo ao condenado, que sequer iniciou o cumprimento da pena, escolher ou decidir a forma como pretende cumprir a sanção, pleiteando aquela que lhe parece mais cômoda ou conveniente.
- Recurso especial desprovido.
(REsp 1524484/PE, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 25/05/2016)
[2] AgRg no HC 618.418/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 27/10/2020.
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