RECURSO EM SENTIDO ESTRITO E A POSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA

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17 de dezembro3 min. de leitura

O recurso em sentido estrito destina-se, em regra, ao ataque de decisões interlocutórias, não definitivas ou que não tenham caráter terminativo, previsto nos artigos 516 e seguintes do Código de Processo Penal Militar. Claro que não está atrelado apenas a decisões interlocutórias – posto que o caput do art. 516 do CPPM fala genericamente em decisão ou sentença – mas é um remédio especialmente dirigido a elas.

O rol trazido nas alíneas desse artigo é taxativo, não se admitindo sua inovação, em homenagem ao princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, bem como em razão do caráter subsidiário de ataque às decisões definitivas dado ao recurso de apelação pela alínea “b” do art. 526 do CPPM.

Por outro lado, é possível, em alguns casos, uma interpretação extensiva, admitida com base no § 1º do art. 2º do CPPM.

Assim, por exemplo, entendemos cabível a impetração de recurso em sentido estrito contra a decisão que conceder ou não a liberdade provisória “i” do art. 516 apenas mencione a menagem, que é compreendida em alguns casos como espécie de liberdade provisória (menagem-liberdade, do art. 268 do CPPM). Aliás, frise-se, o cabimento de recurso em sentido estrito contra decisão que conceda ou rejeite a liberdade provisória é também cabível, contrario sensu, com fundamento na manutenção da prisão preventiva, exposta expressamente, ao lado da decretação ou não dessa prisão, na alínea “h” do art. 516.

A interpretação extensiva, frise-se, “não amplia o rol legal; apenas admite que determinada situação se enquadra no dispositivo interpretado, a despeito de sua linguagem mais restritiva. A interpretação extensiva não amplia o conteúdo da norma; somente reconhece que determinada hipótese é por ela regida, ainda que sua expressão verbal não seja perfeita” (GRECO FILHO, 2012, p.386).

A doutrina processual penal comum traz como exemplo de interpretação extensiva neste caso a possibilidade de interposição de recurso em sentido estrito no caso de decisão que rejeita aditamento da denúncia, porquanto a lei processual penal comum apenas prevê a hipótese de rejeição da denúncia ou da queixa (art. 581, I, do CPP) (REIS; GONÇALVES, 2012, p. 621), e não do aditamento. No CPPM, o cabimento do recurso em sentido estrito no caso de decisão que rejeita o aditamento da denúncia não é por interpretação extensiva, mas por hipótese legal, já que expressamente prevista na lei processual penal militar, na alínea “d” do art. 516 do referido Diploma.

A discussão sobre a taxatividade do rol das situações de cabimento do recurso em sentido estrito ganhou relevância no Superior Tribunal Militar. No Recurso em Sentido Estrito n. 1993.01.006094-0/RS, julgado em 24 de agosto de 1993, sob relatoria do Ministro Antônio Joaquim Soares Moreira, decidiu-se:

Recurso em Sentido Estrito – Relaxamento da prisão em flagrante. Pleito interposto com fundamento no artigo 581, inciso v, ‘in fine’, do CPP,e artigo terceiro, letra ‘a’, do CPPM. Recurso não previsto no artigo 516, do CPPM cujo elenco de hipótese de cabimento e exaustivo, não ensejando emprego subsidiário de legislação diversa. postulação desguarnecida de amparo legal. por maioria, não conhecido do recurso (g.n.).

Nitidamente, na visão exposta pelo STM, não havia possibilidade de ampliação do rol enumerado pelo artigo nem se cogitando uma possível interpretação extensiva.

Repete-se a visão no Recurso em Sentido Estrito n. 2008.01.007521-1, rel. Min. José Américo dos Santos, julgado em 14 de abril de 2008, lavrando-se a seguinte Ementa:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO EM GRAU DE APELAÇÃO. O rol taxativo descrito no art. 516 da Lei Adjetiva Castrense não contempla recurso contra acórdão proferido em grau de Apelação. A hipótese descrita na alínea “q” do referido dispositivo processual refere-se a juízo de admissibilidade, em face da primeira instância. Preliminar de não conhecimento acolhida. Decisão unânime.

Todavia, a questão já foi controversa na Corte. Na Correição Parcial n. 2008.01.001983-3/SP, julgada em 11 de abril de 2008, sob relatoria do Ministro William de Oliveira Barros, o tema também foi discutido, havendo, em nosso sentir, adequada manifestação do Ministro Carlos Alberto, que somente pode ser absorvida compulsando o teor do Acórdão.

Tratou-se de um caso de deserção em que se discutia a possibilidade de ser novamente decretada a prisão provisória, uma vez transcorrido o prazo de sessenta dias do art. 453 do CPPM, chegando-se à conclusão de que tal possibilidade não existe, devendo o desertor responder em liberdade. Mas o que nos interessa é que o Eminente Ministro ingressou pelo estudo de preliminar de não conhecimento da Correição Parcial, posto entender ser caso de Recurso em Sentido Estrito, com arrimo na alínea “h” do art. 516 do CPPM, o que, embora muito bem arguido foi rejeitado por decisão majoritária.

Em suma, portanto, a visão do Superior Tribunal Militar é predominante no sentido da não aceitação da interpretação extensiva no recurso em sentido estrito, vertente que não adotamos em sua inteireza, mas que se mostra a mais segura aos candidatos a concurso.

Referências:

GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. São Paulo: Saraiva, 2012.

REIS, Alexandre Cebrian Araújo; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito processual penal esquematizado. São Paulo: Saraiva: 2012.

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