Um dos principais temas tratados pela imprensa, durante a campanha presidencial, foi a questão da crise fiscal brasileira. O presidente eleito, Jair Bolsonaro, receberá um país que já possui mais de 52% de seu orçamento comprometido com o pagamento de dívidas. Muitos estados brasileiros estão no limite de uma crise no que se refere à execução de suas obrigações primordiais, como saúde, educação, segurança pública e pagamento de servidores. Pois bem, como isso afeta os novos concursos públicos?
Para quem leu o primeiro parágrafo, haverá uma tendência a achar que não teremos concursos públicos durante o governo do presidente eleito. Apesar de isso ter sido objeto de ataques de candidatos adversários durante a campanha eleitoral, devemos analisar a realidade pós-eleições através de uma visão mais detalhada. Assim sendo, a nossa análise visa esclarecer quais são as decisões que acreditamos que serão tomadas a partir do dia 02 de Janeiro.
O que as leis orçamentárias nos dizem?
Pois bem, começamos com uma boa notícia, segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias aprovada no Congresso Nacional, no dia 01/07/2018, há a previsão da manutenção dos concursos já autorizados e em andamento em 2018:
“As duas hipóteses restantes são oriundas, praticamente, de obrigações legais, de forma que somos compelidos a incluí-las no relatório da continuidade dos concursos compelidos a incluí-las. No que se refere aos concursos já em andamento que tenham prazo improrrogável de nomeação vencendo em 2019, situação já reconhecida pelo Poder Judiciário como direito subjetivo dos candidatos. Evita-se, assim, custoso litígio judicial, no qual a União sairia certamente derrotada. Mesmo nesse caso, no entanto, limitamos as nomeações às vagas constantes do edital, gerando assim a menor despesa possível. (..)”
Assim sendo, acreditamos que haverá a manutenção do texto do relatório e a manutenção dos concursos já anunciados em 2018 e que estejam sendo elaborados seus editais através de bancas organizadoras. Além disso, a LDO também traz, na sessão de “Gastos com pessoal e encargos e benefícios aos servidores”, a necessidade de reposição de servidores nas áreas de educação, saúde, segurança pública e defesa, apesar de o relatório apontar que serão apenas repostas as vagas que foram “perdidas”, sendo necessária reposição pelo profissional específico da área, não havendo o remanejamento.
“A eventual perda de um professor ou de um médico, no período de 15 dezembro de 2016 a 31 de dezembro de 2018, somente poderá ser compensada pela contratação, respectivamente, de um professor ou de um médico.”
Os concursos públicos serão “congelados para os próximos 5 anos”?
A lei orçamentária vincula a administração do novo presidente eleito. Apesar disso, muitas pessoas têm questionado a visão ideológica do futuro Superministro da Fazenda e Planejmento, Paulo Guedes, e a possibilidade de redução dos concursos públicos, já que o futuro ministro se considera um liberal e a favor de uma maior austeridade fiscal.
Pois bem, a redução das despesas públicas perpassa uma série de reformas de estado, principalmente a reforma da previdência, a manutenção da taxa de juros reduzida e a redução das despesas públicas.
O economista Paulo Guedes, durante a campanha presidencial, apontou algumas soluções pelas quais pretende reduzir os gastos públicos, capitalizar o Estado e arrecadar mais para pagar a dívida pública. As principais soluções apresentadas se referem a privatizações de empresas públicas ou à diminuição da participação dos estados em alguns setores, como Correios e distribuição de combustíveis (BR distribuidora). Em relação aos concursos públicos, o principal pronunciamento do ministro foi feito durante um programa na Globo News, no qual alegou que poderia “congelar os concursos por 5 anos”. Apesar disso, logo em seguida, o próprio ministro tendeu a descartar a proposta, tendo em vista que outras soluções apresentadas se mostram mais eficazes, em termos numéricos, na capitalização e arrecadações dos recursos para a execução dos objetivos de Estado e o equilíbrio das contas públicas.
A análise que fazemos é que essa fala informal do futuro ministro não pode ser considerada decisão terminada, implicando na eliminação dos concursos públicos durante o governo Bolsonaro. Dizemos isso porque os serviços públicos de natureza essencial, segundo a Constituição, deverão ser mantidos e, para isso, é necessária a execução de novos concursos para a contratação de pessoal. Além disso, o presidente eleito está vinculado à lei orçamentária que será aprovada ainda neste ano, sendo que essa lei prevê explicitamente a manutenção dos concursos atuais e a previsão de reposição das vagas abertas.
Quais são as tendências de novos concursos?
O novo governo terá grandes desafios na missão de equacionar o saneamento das contas públicas, além da execução de incentivos para o crescimento econômico. Por isso, a necessidade de capitalização do Estado e de aquisição de novas fontes de receitas serão pautas prioritárias para a nova equipe econômica. O forte viés voltado para área de segurança pública e combate à corrupção também farão parte da tônica de governo. Dessa maneira, apostamos que haverá uma tendência maior de elaboração de concursos na área de carreiras fiscais, como auditores fiscais, analista tributário, Banco Central. Já na área de segurança pública, apostamos em carreiras como policial rodoviário federal (aberto), Polícia Federal, DEPEN entre outros. Além disso, por questões estruturais, acreditamos em novos concursos para a área de infraestrutura, tendo em vista a necessidade de elaboração de bons projetos para a concessão de obras públicas, o que é interessante principalmente para a carreira de analista e especialista de infraestrutura.
Em relação ao Poder Judiciário, acreditamos que haverá concursos para a reposição de pessoal nas áreas técnicas dos tribunais, mas não podemos afirmar, com certeza, sobre a área da magistratura e carreiras ligadas ao Ministério Público e Defensoria.
Já no Legislativo, devido ao início da nova legislatura, apontamos para a tendência de abertura de novas vagas para o concurso de técnico, analista legislativo e consultor legislativo tanto na Câmara Federal quanto no Senado, tendo em vista a necessidade de reposição de pessoal e do tradicional costume de se constituir a banca elaboradora no primeiro ano de mandato legislativo.
Áreas de difícil elaboração de concursos
A posição ideológica liberal do novo governo aponta para a direção da redução da participação do Estado nas cotas de sociedades de economia mista e de privatização das empresas públicas. Com isso, a nossa aposta é que não haverá concurso para o Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Petrobrás e outras empresas públicas.
O que podemos esperar do novo governo?
Por fim, este artigo teve o objetivo de ajudar na compreensão da realidade em relação à realização dos concursos públicos para a gestão do novo governo.
Findada a campanha eleitoral, o novo presidente deve se submeter à Lei Orçamentária bem como tomar conhecimento da realidade do Estado Brasileiro para compreender melhor o funcionamento das carreiras de Estado e do funcionamento do governo. A redução de gastos deve ser feita sob a análise dos números que demonstram a realidade do país, mas nos parece que a eliminação de concursos públicos e a redução de pessoal em várias áreas pode diminuir a capacidade de enfrentamento dos desafios que o país precisa passar. As futuras decisões do novo ministro parecem caminhar na linha de amplo programa de privatizações de empresas públicas e na criação de mecanismos de arrecadação com o intuito de se conseguir enfrentar os novos desafios. Por fim, não acreditamos na redução de contingente de pessoal em carreiras que ajudarão na concretização dos serviços públicos essenciais e nos objetivos de governo propagados durante a campanha presidencial.
Leonardo Volpatti
Cientista Político especializado em Relações Governamentais e Advogado.
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