Tópicos especiais para o TRF3 #2: Direito Internacional dos Refugiados

Aprenda mais sobre o conceito de refúgio, as diferenças do asilo e o princípio do non-refoulement.

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02 de março4 min. de leitura

O ponto Direito Internacional dos Refugiados, que aparece no conteúdo programático de Direito Internacional Público e Privado do XX Concurso Público para Juiz Federal Substituto do TRF da 3ª Região, já foi objeto de várias reflexões do examinador André de Carvalho Ramos (ACR).

É possível encontrar algumas lições de ACR sobre o tema em seu Curso de Direitos Humanos, mas também em dois artigos de sua autoria (Asilo e refúgio: semelhanças, diferenças e perspectivas e O princípio do non-refoulement no direito dos refugiados, ambos publicados em 2011). Vejamos as informações mais importantes.

O Direito Internacional dos Refugiados (DIR) é composto pelas normas que têm como objetivo proteger tanto as pessoas que fogem de seus países em busca de abrigo como aquelas que, depois de deslocadas, obtêm o reconhecimento da condição de refugiadas.

O órgão internacional responsável pela proteção e pela assistência aos refugiados é o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), órgão subsidiário das Nações Unidas criado em 1950.

A base normativa essencial do DIR é formada pela Convenção de Genebra relativa ao Estatuto dos Refugiados, conhecida como a Carta Magna dos refugiados, de 1951, e pelo Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, de 1967.

A Convenção de 51 definiu refugiado como a pessoa que, em consequência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em consequência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele (art. 1º, A, § 2º).

Observe que o conceito previsto na Convenção possui uma limitação temporal (decorrente dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951), assim como admite que os Estados Partes, no momento da assinatura, ratificação ou adesão, façam uma declaração acrescentando uma limitação geográfica (somente acontecimentos ocorridos na Europa), conforme o art. 1º, B, § 1º.

Essas limitações foram excluídas pelo Protocolo Adicional de 1967. Com isso, o conceito convencional de refugiado passou a ser o da pessoa que (a) se encontra fora do seu país de nacionalidade ou, se for apátrida, fora do país onde tenha residência habitual, (b) devido a fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas; e (c) não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção do seu país ou voltar a ele.

No Brasil, a lei que define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951 é a Lei nº 9.474/1997. Esse diploma também traz um conceito de refugiado. Veja:

 

Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:

I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;

II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;

III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.

 

Observe que a Lei nº 9.474/1997 amplia a definição de refugiado prevista na Convenção para alcançar também a hipótese do indivíduo que devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país:

 

A propósito, tome nota dos principais dispositivos da Lei nº 9.474/1997 cobrados em concurso público: arts. 1º, 7º, 9º, 10, 26, 33, 34 e 38.

É importante notar que refúgio não se confunde com asilo político, que é o acolhimento, por um Estado, de estrangeiro perseguido em outro por motivos políticos. Comparando os dois institutos, ACR aponta cinco semelhanças (Asilo e refúgio: semelhanças, diferenças e perspectivas, p. 40):

  • tratam do acolhimento do estrangeiro que não pode retornar ao Estado de sua nacionalidade ou de residência por motivo odioso;
  • estão consagrados em normas internacionais e nacionais, constituindo garantias para a proteção de direitos essenciais do indivíduo;
  • ambos, se corretamente concedidos, impedem a extradição pelos mesmos fatos que geraram a concessão;
  • podem ser objeto de revisão judicial interna;
  • por fim, os dois institutos são sujeitos aos sistemas de monitoramento internacional dos direitos humanos, em especial perante os tribunais especializados em direitos humanos.

 

As diferenças mencionadas pelo mesmo autor são:

  • o refúgio é regido por tratados universais e o asilo pelo costume internacional e por tratados regionais na América Latina, desde 1889;
  • o refúgio aplica-se a vários tipos de perseguição e o asilo busca acolher o perseguido por motivo político;
  • o refúgio pode ser concedido no caso de fundado temor de perseguição; o asilo exige a atualidade da perseguição;
  • o refúgio pode ser concedido, em alguns casos, sem qualquer situação de perseguição, bastando que exista um quadro de violação grave e sistemática de direitos humanos na região para a qual o indivíduo não pode retornar; o asilo não contempla tal hipótese de concessão;
  • o refúgio possui o ACNUR, ao passo que o asilo não conta com uma organização internacional de supervisão e capacitação;
  • no Brasil, o refúgio possui uma lei que estabelece o órgão de julgamento (CONARE), um trâmite e as causas de inclusão, cessação e exclusão; já o asilo é regido brevemente pela Lei de Migração;
  • no refúgio, o solicitante possui direito público subjetivo de ingresso no território nacional (é o único estrangeiro que possui tal direito), o que não ocorre com o solicitante de asilo;
  • a decisão de concessão do refúgio tem natureza declaratória e é vinculada à presença dos requisitos convencionais e legais, enquanto a decisão concessória do asilo é constitutiva e discricionária.

Merece destaque a proibição de expulsão ou de rechaço do refugiado para as fronteiras dos territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada, prevista no art. 33, § 1º, da Convenção, conhecida como princípio da proibição da devolução (ou do rechaço) ou do non-refoulement, que é considerado a norma básica do DIR. Trata-se de norma internacional que tutela a dignidade humana, com o fim de evitar que o refugiado ou solicitante de refúgio seja enviado de volta ao Estado de onde proveio e em que corre risco de perseguição ou de vida.

A exceção ao princípio do non-refoulement está contida § 2º do art. 33, que afasta a aplicação do princípio no caso haver razões sérias para considerar o refugiado perigo para a segurança do país onde se encontra, ou que, tendo sido objeto de uma condenação definitiva por um crime ou delito particularmente grave, constitua ameaça para a comunidade do dito país.

Para concluir, vale registrar que o ato administrativo que reconhece (ou não) a condição de refugiado pode ser controlado pelo Poder Judiciário à luz da legalidade, conforme já foi decidido pelo STF (Ext 1085, Caso Battisti) e pelo STJ (REsp 1174235/PR).

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