Vacinas para Dengue: sim, elas (também) existem!

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19 de Dezembro de 2022

Olá pessoal! Tudo bem? Sou a professora Débora Juliani, farmacêutica, especialista em Análises Clínicas e faço parte da equipe do Gran Cursos Saúde.

Hoje vamos falar de Virologia e de vacinas! E antes de mais nada quero explicar o título deste artigo. Recentemente publiquei aqui mesmo, no Blog do Gran Cursos um artigo intitulado “Vacinas para Infecções Urinárias: sim, elas existem!” e o tema fez tanto sucesso (se você ainda não leu, não deixe de ler) que resolvi trazer mais uma vacina que também existe, é importantíssima, porém pouco conhecida: a vacina contra a dengue!

O vírus dengue (DENV) é um arbovírus (nome dado a vírus cujo ciclo de replicação ocorre parcialmente em insetos), transmitido pela picada da fêmea do “famoso” mosquito Aedes aegypti e possui quatro sorotipos diferentes (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4). Além da dengue temos outras arboviroses comuns em ambientes urbanos como Zika e Chikungunya.

Infelizmente, a dengue é uma antiga conhecida dos brasileiros. A primeira epidemia comprovada no nosso país aconteceu no começo da década de 1980, mas há evidências de que a doença chegou aqui pela primeira vez ainda no século XIX. Hoje, a dengue alcança mais de cem países. Cerca de metade da população mundial vive em áreas afetadas e, a cada ano, 50 milhões de pessoas desenvolvem a doença.

Mas voltando a falar de vacinas, mais de 30 doenças tais como poliomielite, sarampo e, mais recentemente, a COVID-19, por exemplo, podem ser prevenidas por vacinas oferecidas gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por meio do Programa Nacional de Imunização (PNI). No entanto, quem olhar a lista dos imunizantes disponíveis no PNI não vai encontrar nenhuma vacina contra a dengue… Por enquanto!

Como vimos anteriormente, a dengue pode ser causada por quatro subtipos do vírus, DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4, todos circulantes no Brasil. Na prática, isso quer dizer que uma pessoa pode pegar dengue até quatro vezes na vida, caso seja contaminada pelos quatro sorotipos, um de cada vez. Normalmente o quadro tem evolução benigna, com manejo dos sintomas e posterior cura. Porém, a partir da segunda infecção, aumentam as chances de a doença evoluir para a forma grave, popularmente chamada de dengue hemorrágica.

Considerando que não existe nenhum tratamento medicamentoso eficaz contra o vírus da dengue em si e que os números de infectados são expressivos, há vários anos, pesquisadores de diversos países, incluindo do Brasil, se dedicam a criar uma vacina contra a dengue usando diferentes tecnologias.

A primeira a obter sucesso foi a CYD-TDV, mais conhecida como Dengvaxia®, lançada em 2015 e fabricada pela empresa farmacêutica francesa Sanofi Pasteur. O esquema vacinal exige três doses e sua tecnologia utiliza DNA recombinante, ou seja, usando a estrutura do vírus atenuado da febre amarela, os pesquisadores “trocam” certos genes, inserindo “partes” dos quatro subtipos de vírus da dengue. Assim, a pessoa que recebe a vacina passa a produzir anticorpos contra os vírus da dengue.

Ela é, atualmente, a única vacina contra a dengue disponível no Brasil, mas possui algumas indicações de uso bastante restritas, e é por isso que, como já dissemos, a Dengvaxia®, não faz parte do PNI, isto é, não está no calendário nacional de imunizações. Algumas prefeituras compraram doses dessa vacina e a aplicam em casos específicos e ela também pode ser encontrada em serviços privados de vacinação, para pacientes entre 9 e 45 anos, mas o ideal é que sua indicação seja avaliada por um médico.

Isso se tornou ainda mais relevante após 2017, quando a ANVISA determinou restrições de uso na bula do imunizante, após pesquisas sugerirem que a Dengvaxia® poderia causar problemas a quem nunca foi infectado pelo vírus.

Vou explicar melhor: pacientes sem histórico de infecção podem desenvolver quadros mais graves se tomarem a vacina e, depois, forem infectados pelo vírus por meio da picada do mosquito. É como se a vacina fosse uma primeira infecção e a infecção real, pelo vírus transmitido na picada do mosquito, já fosse uma segunda infecção, que tem maior chance de evoluir para a forma grave, lembra? Diante disso, vem a primeira alteração na bula: contraindicação da vacina em indivíduos que nunca tiveram dengue.

No entanto, é altíssima a efetividade da Dengvaxia® na prevenção de uma segunda infecção. E aí vem a próxima mudança na indicação:  o uso restrito a indivíduos soropositivos (ou seja, que já tiveram dengue uma vez) e que moram em áreas endêmicas exatamente por apresentarem alta probabilidade de uma segunda infecção.

Isso, no entanto, traz uma complicação: o paciente precisa ter a certeza de que realmente contraiu dengue em determinado momento da vida, e não um outro vírus que, às vezes, traz sintomas similares, como o Chikungunya. Em teoria, só um exame sorológico (com detecção dos anticorpos IgG para dengue) responde a esta questão.

Mas aí vem uma notícia promissora: é possível que em breve tenhamos mais uma opção disponível no Brasil além da Dengvaxia®. Trata-se do imunizante Qdenga®, do laboratório japonês Takeda, que acaba de ser aprovado para uso na União Europeia. A vacina foi projetada para uso em pessoas com 4 anos ou mais, para prevenir qualquer um dos quatro sorotipos da dengue e mostra uma proteção mais ampla para crianças pequenas e pessoas com mais de 45 anos.

A solicitação de registro da Qdenga® junto à ANVISA já foi realizada em abril de 2021 e ela terá esta vantagem: segundo a empresa, a proposta da vacina é ser indicada para prevenção da dengue em pessoas de 4 a 60 anos de idade, sem distinção entre quem teve ou não a doença.

Em paralelo, temos também uma candidata nacional, já que o Instituto Butantan trabalha no desenvolvimento de outra vacina há mais de 10 anos, em parceria com o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês). Segundo o Butantan, as pesquisas devem ser finalizadas até 2024. É esperar para ver, e torcer por mais esta opção!

Gostou do conteúdo? Espero que sim! E espero também que você continue a estudar com o time do Gran Cursos Saúde. Temos cursos on line voltados para os editais dos principais concursos e residências do Brasil. Um forte abraço!

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19 de Dezembro de 2022