O mandado de busca e apreensão precisa detalhar os bens passíveis de recolhimento? CUIDADO nas provas!

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Olá pessoal, tudo certo?

Hoje falaremos sobre um tema que, inexplicavelmente, despenca em prova de concurso e, mais do que isso, representa um grande índice de erro por parte dos candidatos. Afinal, é ou não necessário que o magistrado detalhe no mandado de busca e apreensão os bens passíveis de serem coletados durante a diligência investigativa/probatória?

Sem o intento de criar suspense, já antecipo que a resposta é NEGATIVA.

Aliás, em recente precedente exarado pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, veiculado no Informativo 750 (sem indicação do número do julgado, por tramitar em segredo de justiça), a Corte concluiu serem LÍCITAS as provas obtidas com a apreensão de bens não discriminados expressamente em mandado ou na decisão judicial correspondente, mas vinculados ao objeto da investigação.

No caso concreto, o Tribunal de Justiça compreendeu que o mandado mencionou determinados objetos passíveis de serem recolhidos com a finalidade de elucidar as controvérsias fáticas da infração penal, porém não teria o condão de exaurir as possibilidades, até mesmo porque o juiz da causa – que emanou a ordem de busca e apreensão – não teria como saber de antemão quais objetos poderiam ser encontrados no local da diligência probatória que poderiam ter algum interesse para a apuração dos fatos.

Como resta pacífico no Supremo Tribunal Federal, diante da impossibilidade de indicação, ex ante, de todos os bens passíveis de apreensão no local da busca, é mister conferir-se certa discricionariedade, no momento da diligência, à autoridade policial[1].

Em semelhante diapasão, o STJ em diversas oportunidades militou no mesmo sentido. Em determinado caso, anotou-se que os recorrentes sustentavam que a ordem de busca e apreensão impugnada seria vaga e imprecisa, e não apresentou nenhuma delimitação objetiva, subjetiva ou temporal do escopo e objeto das apreensões, asserção que não procede. A decisão que determinou a medida de busca e apreensão apontou de forma precisa os limites e o objetivo exato das providências, indicando os locais a serem examinados no cumprimento das diligências. “Esta Corte tem entendido que a pormenorização dos bens somente é possível após o cumprimento da diligência, não sendo admissível exigir um verdadeiro exercício de futurologia por parte do Magistrado, máxime na fase pré-processual[2].

A bem da verdade, a orientação dominante nos Tribunais Superiores é de que não há fixação normativa como requisito do mandado de busca e apreensão a pormenorização e detalhamento dos bens passíveis de recolhimento durante a diligência. A rigor, não obstante constarem itens de possibilidade no art. 240 do CPP, ali resta consignado rol meramente exemplificativo de objetos passíveis de serem arrecadados[3].

Não se trata de novidade, mas sim de orientação consolidada há mais de dez anos. É o que nos permite inferir o julgamento tomado a efeito pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que anotou o seguinte: “O art. 240 do CPP, ao tratar da busca e apreensão, apresenta um rol exemplificativo dos casos em que a medida pode ser determinada, no qual se encontra a hipótese de arrecadação de objetos necessários à prova da infração ou à defesa do réu, não havendo qualquer ressalva de que não possam dizer respeito à intimidade ou à vida privada do indivíduo[4].

Pedro, mas no Código de Processo Penal não há menção a essa restrição? Acho que li algo nesse sentido.

Olha, sinceramente, você pode até ter lido. Mas se o fez, repense suas fontes de estudo. É verdade que alguns afirmam isso, contudo essa perspectiva é absolutamente carente de respaldo legal e jurisprudencial. Prevalece, com muita tranquilidade, a compreensão de que “não há no ordenamento jurídico pátrio qualquer exigência de que a manifestação judicial que defere a cautelar de busca e apreensão esmiúce quais documentos ou objetos devam ser coletados, até mesmo porque tal pormenorização só é possível de ser implementada após a verificação do que foi encontrado no local em que cumprida a medida”[5].

Ou seja, o art. 243 do CPP[6] disciplina os requisitos do mandado de busca e apreensão, dentre os quais não se encontra o detalhamento do que pode ou não ser arrecadado[7].

A fim de demonstrar a consolidação dessa orientação, destaque-se que a 6ª Turma sedimentou semelhante compreensão, aplicado a postura de que “o art. 243 do Código de Processo Penal disciplina os requisitos do mandado de busca e apreensão, dentre os quais não se encontra o detalhamento do que pode ou não ser arrecadado; e o art. 240 apresenta um rol exemplificativo dos casos em que a medida pode ser determinada, no qual se encontra a hipótese de arrecadação de objetos necessários à prova da infração ou à defesa do réu, não havendo qualquer ressalva de que não possam dizer respeito à intimidade ou à vida privada do indivíduo. No caso, inexiste nulidade a ser reconhecida. De um lado, foi dada autorização pelo proprietário da clínica para que a busca e apreensão tivesse sequência no prédio contíguo ao endereço autorizado, no qual também funcionava a empresa em questão. De outro, porque, embora os prontuários possam conter dados sigilosos, foram obtidos a partir da imprescindível autorização judicial prévia por meio lícito. A ausência de sua discriminação no mandado de busca é irrelevante, até porque os prontuários médicos encontram-se inseridos na categoria de documentos em geral, inexistindo qualquer exigência legal de que a autorização cautelar deva detalhar o tipo de documento a ser apreendido quando este possuir natureza sigilosa[8].

Agora você não vai mais errar isso em prova, hein?

Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

[1] STF, 1ª Turma, Pet 5173/DF, Min. Dias Tofoli, DJe 18/11/2014.

 

[2] AgRg no RHC n. 150.787/PE, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 20/5/2022. No mesmo sentido, RHC n. 59.661/PR, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 3/11/2015.

[3] RHC n. 141.737/PR, Sexta Turma, julgado em 27/04/2021.

[4] STJ, 5ª Turma, HC 142.205/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 13/12/2010.

[5] AgRg nos EDcl no RHC 145.665/RO, julgado em 28/9/2021

[6] Art. 243.  O mandado de busca deverá: I – indicar, o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador; ou, no caso de busca pessoal, o nome da pessoa que terá de sofrê-la ou os sinais que a identifiquem; II – mencionar o motivo e os fins da diligência; III – ser subscrito pelo escrivão e assinado pela autoridade que o fizer expedir. § 1o Se houver ordem de prisão, constará do próprio texto do mandado de busca. § 2o Não será permitida a apreensão de documento em poder do defensor do acusado, salvo quando constituir elemento do corpo de delito.

[7] STJ, 5ª Turma, HC 524.581/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 13/2/2020.

[8] RHC n. 141.737/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 27/4/2021, DJe de 15/6/2021

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