A exceção de contrato não cumprido e greve

A tese pode motivar o pagamento de salários durante a greve

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    A greve é um direito fundamental do trabalhador consagrado no art. 9º, caput, da Constituição Federal:

“Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.”

    A regulamentação desse direito foi expressa na Lei 7.783/89, que adotou a posição no sentido de que, durante a greve, o contrato de trabalho está suspenso, conforme se constata no at. 7º, caput, do diploma mencionado:

“Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.”

    Assim, quando os trabalhadores iniciam o movimento paredista em busca de melhorias nas condições salariais ou de outras vantagens econômicas, resta natural admitir a suspensão do contrato durante a paralisação. Logo, enquanto pendente o movimento deflagrado, não há trabalho e não existe salário.

    No entanto, existem greves cujo objetivo não são maiores vantagens econômicas e sociais, mas o efetivo cumprimento das obrigações legais, normativas e contratuais pelo empregador.

    Imagine uma greve em que se busca o pagamento de salários atrasados. Seria justo impor aos trabalhadores a suspensão do contrato (situação em que ficarão sem a remuneração do período de greve), quando o movimento pretende justamente o pagamento das parcelas inadimplidas?

   Pense, agora, em um movimento que pretende somente que o empregador cumpra as obrigações de zelar pelo meio ambiente de trabalho saudável, fornecendo os equipamentos de proteção apropriados. Seria correto afastar o direito aos salários?

   As respostas somente podem ser negativas. Nesses casos, constata-se que não tendo o empregador cumprido suas obrigações, não poderia ele exigir dos trabalhadores a prestação de serviços. Trata-se de aplicação, no Direito do Trabalho, da exceção de contrato não cumprido consagrada no art. 476 do CC:

“Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.”

    O Tribunal Superior do Trabalho chancela essa aplicação, reconhecendo que, nesses casos excepcionais, o trabalhador possui direito aos salários do período de greve, afastando a regra do art. 7º, caput, da Lei 7.783/89. Veja um julgado exemplificativo:

“A) DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. (…) 2. DESCONTO DAS HORAS NÃO TRABALHADAS EM FACE DA DEFLAGRAÇÃO DA GREVE. A regra geral no Direito brasileiro, segundo a jurisprudência dominante, é tratar a duração do movimento paredista como suspensão do contrato de trabalho (art. 7º, Lei 7.783/89). Isso significa que os dias parados, em princípio, não são pagos, não se computando para fins contratuais o mesmo período. Entretanto, caso se trate de greve em função do não cumprimento de cláusulas contratuais relevantes e regras legais pela empresa (não pagamento ou atrasos reiterados de salários, más condições ambientais, com risco à higidez dos obreiros, etc.), em que se pode falar na aplicação da regra contida na exceção do contrato não cumprido , a greve deixa de produzir o efeito da mera suspensão. Do mesmo modo, quando o direito constitucional de greve é exercido para tentar regulamentar a dispensa massiva. Nesses dois grandes casos, seria cabível enquadrar-se como mera interrupção o período de duração do movimento paredista, descabendo o desconto salarial. O caso dos autos não se amolda à hipótese de interrupção do contrato de trabalho, mas de suspensão contratual, não sendo devido, a princípio, o pagamento das horas não trabalhadas – considerando que a greve ocorreu em apenas um dia. Recurso ordinário provido, no aspecto. (…)” (RO-1001268-03.2017.5.02.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 06/03/2020).

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