A incompetência da Justiça do Trabalho para cobrança de contribuições sindicais relativas a servidores estatutários

O Tribunal Superior do Trabalho consolida o entendimento prevalecente

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      A competência material da Justiça do Trabalho sempre gerou uma série de divergências jurisprudenciais e doutrinárias. Um dos pontos de maior discussão envolve circunstâncias relacionadas a servidores sujeitos a regime estatutário ou qualquer outro de natureza jurídico-administrativa.

              Diferentemente do que muitos pensam, a questão não foi totalmente superada pelo julgamento da ADI 3395-MC. De fato, a decisão trouxe uma clara diretriz vinculante no sentido de que a Justiça Especializada não possui competência para julgar ações envolvendo servidores públicos estatutários ou que detenham relação jurídico-administrativa.

                Nesse ponto, vale transcrever a ementa:

“ Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária. (ADI 3395 MC, Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 05/04/2006, DJ 10-11-2006)”

        No entanto, considerando que a interpretação focou o art. 114, I, da Constituição Federal, questionamentos surgiram em relação à exegese que deveria ser feita quando o tema fosse ação de cobrança de contribuição sindical, matéria essa inserida, em tese, no âmbito do art. 114, III, da Constituição da República:

“Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

III- as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;”

               A contribuição sindical permite a manutenção e a atuação plena das entidades sindicais, estando diretamente ligada à representação sindical, em última análise.

            Diante desse quadro e tendo em vista a existência de entidades sindicais que representam servidores estatutários ou agentes públicos que possuem outra relação jurídico-administrativa, surgiram basicamente duas correntes para tratar da competência para a cobrança de contribuições sindicais.

              A primeira defende que a competência seria da Justiça do Trabalho, porquanto a relação individual de trabalho seria matéria diversa da relação coletiva de trabalho, estando a decisão do STF na ADI 3395-MC centrada no art. 114, I, da CF, ao passo que a cobrança das contribuições estaria no art. 114, III, da CF. Leia um exemplo dessa corrente:

RECURSO DE REVISTA – PROCESSO SOB A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E DO CPC/73 – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO – REPRESENTAÇÃO SINDICAL DE SERVIDORES ESTATUTÁRIOS – COBRANÇA DE IMPOSTO SINDICAL – ART. 114, III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. A Justiça do Trabalho é competente para julgar ações relativas à representação sindical estabelecidas entre sindicatos de servidores públicos estatutários. O comando imposto pelo Supremo Tribunal Federal na liminar concedida no bojo da ADI 3.395, ao excluir da competência da Justiça do Trabalho o exame da relação jurídica de natureza estatutária estabelecida entre a Administração Pública e os servidores públicos a ela vinculados, construiu-se com respaldo na interpretação do art. 114, I, da Constituição Federal. Exegese diversa, e que não pode ser considerada abarcada pela construção hermenêutica exposta na ADI 3.395, deve ser conferida ao art. 114, III, da Constituição Federal, que reconhece à Justiça do Trabalho competência para julgar as ações sobre representação sindical entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores. Nesse sentido, há decisões do Supremo Tribunal Federal em sede de reclamações constitucionais. É importante ressaltar que a relação estabelecida entre o sindicato e o trabalhador por ele representado é autônoma no que tange à relação individual de trabalho, com ela não se confundindo. Portanto, é irrelevante que o trabalhador guarde com a Administração Pública vínculo estatutário, pois a relação que ele estabelece com seu sindicato, para efeito de representação, situa-se no âmbito do Direito Coletivo do Trabalho e independe da especificidade do vínculo administrativo. Recurso de revista conhecido e provido. (RR – 105100-56.2014.5.13.0004, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 06/09/2017, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 11/09/2017)

                  A segunda corrente, por seu turno, não faz essa separação, entendendo que a decisão do STF atrai a incompetência da Justiça do Trabalho inclusive para as ações de cobrança de contribuição sindical abrangendo esses servidores. Veja um julgado nessa linha:

“(…) 2 – CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. SERVIDORES MUNICIPAIS. REGIME ESTATUTÁRIO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Trata-se de lide em que a Federação pretende a percepção da contribuição sindical dos servidores públicos estatutários do Município de Cocal. O Supremo Tribunal Federal nos autos da ADI-MC 3.395-DF, julgada sob relatoria do Ministro Cezar Peluso, pontuou em sede cautelar interpretação conforme ao art. 114, I, da Carta Magna para excluir da competência da Justiça do Trabalho a apreciação de causas instauradas entre o poder público e servidores a ele vinculados por relação jurídico-administrativa. Dessa forma, em observância à decisão do Supremo Tribunal Federal, conclui-se que não se inserem na competência da Justiça do Trabalho as ações ajuizadas por Sindicatos, tendo como objeto contribuição sindical, que diga respeito a trabalhadores submetidos ao regime estatutário. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido” (RR-10-05.2017.5.22.0101, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes, DEJT 16/05/2019).

                  A segunda corrente já vinha sendo a posição majoritária. Essa posição foi afirmada pela Subseção I de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho recentemente. Veja esse julgado:

“EMBARGOS INTERPOSTOS SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. SERVIDORES PÚBLICOS SUBMETIDOS AO REGIME ESTATUTÁRIO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. A discussão nos autos diz respeito à competência da Justiça do Trabalho para julgar ação ajuizada por entidade sindical postulando sua legitimidade para cobrança de contribuição sindical, devida pelo servidores públicos vinculados ao Município embargante. Nesse cenário, a jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que, para manter alinhamento com o Supremo Tribunal Federal nos julgamentos da ADI nº 3.395-MC/DF e do Agravo Regimental interposto nos autos da Reclamação nº 9.625/RN, deve-se entender que não se inserem na competência da Justiça do Trabalho as ações ajuizadas por Sindicatos, tendo por objeto representatividade ou contribuição sindical, que digam respeito a trabalhadores submetidos ao regime estatutário ou àqueles cujo regime jurídico aplicável esteja em discussão. Dessa forma, o acórdão embargado ao concluir pela competência da Justiça do Trabalho para julgar a presente demanda decidiu em desarmonia com a atual, iterativa e notória jurisprudência desta Corte Superior sobre a matéria. Precedentes. Recurso de embargos conhecido e provido” (E-RR-1309-35.2010.5.18.0081, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 13/12/2019).

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