Das Provas Ilícitas

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3 de Setembro de 2017

O nosso ordenamento jurídico, seja do ponto de vista constitucional, seja do ponto de vista legal, como regra, inadmite a prova ilícita. Esta só é permitida por exceção quando põe a salvo o direito de liberdade do indivíduo. Nesse sentido, no sistema processual penal brasileiro, a prova há de ser primordialmente legal e legítima.
A Carta Magna ordena de forma lapidar, no seu art. 5º, LVI: são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos. Nessa esteira, o CPP ordena no seu art. 157: São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. Com efeito, flagra-se que as provas ilícitas devem ser rechaçadas e, quando insertas em autos, seja de Inquérito Policial (IPL), seja de Ação penal (AP), devem ser retiradas para que se mantenha o bojo probatório incólume, não eivado de ilicitude.
Nesse diapasão, o Professor Guilherme de Souza NUCCI[1] ensina:
O processo penal deve formar-se em torno da produção de provas legais e legítimas, inadmitindo-se qualquer prova obtida por meio ilícito.
E conclui o Mestre paulista:
(…) o gênero é a ilicitude – assim em Direito Penal, quanto nas demais disciplinas, inclusive porque foi o termo utilizado na Constituição Federal – significando o que é contrário ao ordenamento jurídico, contrário ao Direito de um modo geral, que envolve tanto o ilegal quanto o ilegítimo, isto é, tanto a infringência às normas legalmente produzidas, de direito material e processual, quanto aos princípios gerais de direito, aos bons costumes e à moral.
Nesse sentido, é possível sustentar que a prova ilícita, que é contrária ao ordenamento jurídico, é gênero que abrange as espécies (1) prova ilegal, que compreende a prova cuja captação ofende o direito material, v.g. interceptação telefônica sem autorização judicial, e (2) prova ilegítima, que diz respeito a prova produzida com inobservância da norma processual, v.g. prova da morte da vítima através de mera confissão do réu.
Contudo, não se pode olvidar que as provas ilícitas podem ser instrumentalizadas no processo penal pátrio. Com efeito, há, no contexto das provas ilícitas, a chamada Teoria da Proporcionalidade do Direito alemão. As bancas de concurso também trazem as denominações Teoria da Razoabilidade, Teoria do Interesse Predominante ou Teoria do Sopesamento para se referir a essa teoria.
Essa teoria tem por escopo equilibrar os direitos individuais com os interesses da coletividade, não implicando em uma rejeição prima facie e contumaz das provas ilícitas. Assim, sustenta-se que é necessário ponderar os interesses postos em baila (notadamente pro reu) quando se viola uma garantia constitucional em prol da produção probatória.
O Professor Norberto AVENA[2] nos ensina:
(…) a doutrina e a jurisprudência majoritárias há longo tempo têm considerado possível a utilização das provas ilícitas em favor do réu quando se tratar da única forma de absolvê-lo ou de comprovar um fato importante à sua defesa. Para tanto, é aplicado o princípio da proporcionalidade, também chamado de princípio do sopesamento, o qual, partindo da consideração de que “nenhum direito reconhecido na Constituição pode revestir-se de caráter absoluto”, possibilita que se analise, diante da hipótese de colisão de direitos fundamentais, qual é o que deve, efetivamente, ser protegido pelo Estado.
Por via de consequência, não pode haver emprego de prova ilícita pro societate. Ou seja, a busca da satisfação da pretensão punitiva não pode ser lastreada em prova ilegal ou em prova ilegítima. O Estado-Investigação, através da atuação do Delegado de Polícia na Presidência do IPL, e o Estado-Acusação, por intermédio da atuação do parquet, não podem levar a termo persecução criminal que tenha lastro em prova ilícita. Isso é inconstitucional e ilegal.
Além da prova ilícita, não podemos olvidar que há também as provas ilícitas por derivação. E esse tema é recorrente em provas de concurso. Essas provas são aquelas que, embora lícitas de per si, decorrem exclusivamente de uma outra prova considerada ilícita, ou de uma situação de ilegalidade, ficando, portanto, contaminadas. Ordena o CPP, em seu art. 157, § 1º: São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
O Professor AVENA (Idem) nos ensina o seguinte sobre as provas ilícitas por derivação:
Trata-se, enfim, da aplicação da teoria norte-americana dos Frutos da árvore Envenenada (fruits of lhe poisonous tree), segundo a qual o defeito existente no tronco contamina os frutos. (…) Transpondo-se essa disposição para o tema de provas, resultava que a ilicitude de uma prova, uma vez reconhecida, causará a ilicitude das provas que dela diretamente decorram.
Com efeito, se a prova, mesmo em um contexto de ilicitude probatória, provier de fonte independente (Prova Separada), como tal considerada aquela que por si só, seguindo as diligências ordinárias investigativas em sede de IPL, por exemplo, não ocorrerá a contaminação. Percebe-se que a validação do elemento probatório em razão da fonte independente exige que não haja nenhum nexo de causalidade entre a prova que se quer utilizar e a situação de ilicitude. Além das provas advindas de fonte independente, o Professor AVENA nos ensina outras duas exceções à teoria da prova ilícita por derivação:
1) O fenômeno da limitação da contaminação expurgada (“purged taint limitation”), também conhecido como limitação da conexão atenuada (“attenuated connection limitation”). Trata-se da hipótese em que, apesar de já estar contaminado um determinado meio de prova em face da ilicitude da prova ou da ilegalidade da situação que o gerou, um acontecimento posterior expurga (afasta, elide) esta contaminação, permitindo-se o aproveitamento da prova.
Esse é o caso, por exemplo, da confissão ratificada em juízo que primeiro foi feita em sede de flagrante ilegal. Ensina, ainda, o mestre gaúcho sobre a segunda exceção à teoria da prova ilícita por derivação:
2) O fenômeno da descoberta inevitável (“inevitable discovery”), isto é, hipótese na qual a prova será considerada admissível se evidenciado que ela seria, inevitavelmente, descoberta por meios legais.
Dessa forma, em outra conclusão não chegamos senão na de que o nosso sistema processual penal não permite que os órgãos de persecução criminal instrumentalizem a prova ilícita. E, mais ainda, que esta só é passível de ser empregada na persecução criminal como uma exceção quando o jus libertatis deve ser posto a salvo. Isso através da Teoria da proporcionalidade. De outro lado, as provas que advêm de provas ilícitas ilícitas também são e devem receber o mesmo tratamento das originalmente ilícitas.
Esse assunto das provas ilícitas vem sendo cobrado em sede de concurso público da seguinte forma:

  1. (2014/MPE-SC/MPE-SC/Promotor de Justiça[3])

Analise o enunciado da questão abaixo e assinale se ele é Certo ou Errado. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. É o que estabelece o Código de Processo Penal.
(   ) Certo   (   ) Errado

  1. (2011/CESPE/PC-ES/Delegado de Polícia[4])

Considerando as disposições constitucionais e legais aplicáveis ao processo penal e, quando for o caso, a doutrina e a jurisprudência correlatas, julgue os itens que se seguem. De acordo com a doutrina e a jurisprudência pátrias, são inadmissíveis, em qualquer hipótese, provas ilícitas ou ilegítimas no processo penal brasileiro.
(   ) Certo   (   ) Errado

  1. (2016/MPE-SC/MPE-SC/Promotor de Justiça[5])

A teoria dos “frutos da árvore envenenada”, de origem norte-americana, encontra-se prevista no art. 157, §1º, do Código de Processo Penal, quando este dispõe serem inadmissíveis, sem ressalvas, as provas derivadas das ilícitas.
(   ) Certo   (   ) Errado

  1. (2013/CESPE/Polícia Federal/Perito criminal[6])

A respeito da prova no processo penal, julgue o item subsequente. A consequência processual da declaração de ilegalidade de determinada prova obtida com violação às normas constitucionais ou legais é a nulidade do processo com a absolvição do réu.
(   ) Certo   (   ) Errado

  1. (2015/FUNIVERSA/PC-DF/Delegado de Polícia[7])

Assinale a alternativa correta a respeito de prova, indiciamento e inquérito policial, com base na legislação, na jurisprudência e na doutrina majoritária.

  1. a) Conforme a lei, o indiciamento é ato privativo do delegado de polícia ou do órgão do Ministério Público, devendo ocorrer por meio de ato fundamentado, que, mediante análise técnico-jurídica do fato, deverá indicar a autoria, a materialidade e suas circunstâncias.
  2. b) O relatório de inquérito policial, a ser redigido pela autoridade que o preside, é indispensável para o oferecimento da denúncia ou da queixa-crime pelo titular da ação penal.
  3. c) As provas ilegítimas são as obtidas por meio de violação de normas de direito material, ao passo que as provas ilícitas são as obtidas por meio de violação de normas de direito processual.
  4. d) Consoante o Código de Processo Penal (CPP), admitem-se as provas derivadas das ilícitas, desde que não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou que as derivadas possam ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
  5. e) No ordenamento jurídico brasileiro, não se adota a denominada teoria da árvore dos frutos envenenados, de modo que a prova derivada da prova ilícita tem existência autônoma e deverá ser apreciada em juízo.

[1]Manual de Processo Penal e Execução Penal, Rio de Janeiro: Editora Forense, 2014.
[2]Processo Penal Esquematizado, São Paulo: Editora Método, 2015.
Gabarito:
[3]Certo.
[4]Errado.
[5]Errado.
[6]Errado.
[7]Letra d.
Prof. M. Sc. Adriano Barbosa – Delegado de Polícia Federal, Master of Science pela Naval Postgraduate School (NPS), CA, EUA, em Relações Internacionais, título acadêmico revalidado pela Universidade de Brasília (UnB), Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal para Cursos Preparatórios para Concursos Públicos, Professor convidado do Núcleo de Estudos sobre Violência (NEVIS) da Universidade de Brasília (UnB) no Curso de Pós-graduação em Gestão da Segurança Pública para a Disciplina Inteligência Policial, Professor voluntário da Faculdade de Direito (FD) da Universidade de Brasília (UnB) no Curso de Graduação em Direito para a Disciplina Polícia Judiciária e Investigação Criminal, Professor titular da Escola Superior de Polícia da Polícia Federal para os Cursos de Pós-graduação em Ciências Policiais para as Disciplinas Gestão de Investigação Criminal e Terrorismo Internacional, Escritor, Articulista e membro da Comissão Editorial da Revista Brasileira de Ciências Policiais, ISSN 2178-0013 e da Revista de Segurança Pública e Cidadania, ISSN 1983-1927.



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