Descanso semanal da mulher e trabalho aos domingos no comércio

O TST possui divergência quanto à norma de proteção que prevalece

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30 de Agosto de 2020

    O trabalho aos domingos impõe a necessidade de adoção de uma escala de revezamento, de maneira a permitir que a trabalhadora ou o trabalhador possa ter um convívio familiar e social mais abrangente.

    No caso específico da mulher, existe previsão no sentido de que a folga semanal deve coincidir com o domingo ao menos uma vez a cada quinzena, conforme o art. 386 da CLT:

Art. 386 – Havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical.

    Ocorre que, para o comércio em geral, há previsão no sentido de que haverá um revezamento com base de uma folga coincidente com o domingo para cada três semanas, na forma do art. 6º da Lei 10.101/00:

Art. 6º Fica autorizado o trabalho aos domingos nas atividades do comércio em geral, observada a legislação municipal, nos termos do art. 30, inciso I, da Constituição.
Parágrafo único.  O repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho e outras a serem estipuladas em negociação coletiva.

    No entanto, qual norma prevalece se a mulher trabalha aos domingos no comércio em geral?

    O Tribunal Superior do Trabalho apresenta divergência. Há julgados que consideram que prevalece a regra de 3 semanas:

“RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E REGIDO PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº39/2016 . ARTIGO 386 DA CLT. EMPREGADAS MULHERES NO SETOR DO COMÉRCIO. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO AOS DOMINGOS A CADA DOIS DIAS TRABALHADOS. POSSIBILIDADE. LEI Nº 10.101/2000. (…) Desse modo, a recepção constitucional do artigo 386 da CLT, que prevê escala quinzenal para a fruição do repouso semanal remunerado aos domingos para as empregadas mulheres , não impede a aplicação das normas legais específicas (Lei nº 10.101/2000 com as alterações da Lei nº 11.603/2007) para as trabalhadoras do setor do comércio. Precedentes. Recurso de revista conhecido e não provido” (RR-554-39.2017.5.12.0014, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 26/06/2020).

“RECURSO DE REVISTA. ATIVIDADES DO COMÉRCIO EM GERAL. PROTEÇÃO AO TRABALHO DA MULHER. TRABALHO AOS DOMINGOS. ARTIGO 386 DA CLT. LEI Nº 10.101/2000. (…) 5. Dentro desse contexto, se as empregadas substituídas tinham assegurada a folga semanal, nos moldes do art. 6°, parágrafo único, da Lei n° 10.101/2000, têm-se por compensados os demais domingos trabalhados, não havendo falar em condenação ao pagamento do descanso dominical, na forma deferida na sentença, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da isonomia, mormente porque, não obstante homens e mulheres diferenciarem-se em alguns pontos, especialmente no concernente ao aspecto fisiológico, esse diferencial não dá amparo ao gozo de mais folgas no dia de domingo às mulheres do que aos homens, já que o gozo da folga semanal em outro dia da semana não resulta em desgaste físico maior. 6. Ademais, o art. 7°, XX, da CF estabelece a proteção do trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, razão pela qual se repelem regras que resultem em desestímulo a esse trabalho, de modo que, com fulcro no referido dispositivo constitucional, tem-se pela aplicabilidade do comando do art. 6°, parágrafo único, da Lei n° 10.101/2000 a todos os trabalhadores, sem distinção de sexo. Recurso de revista conhecido e não provido ” (RR-1606-46.2016.5.12.0001, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 09/08/2019).

    Por outro lado, há decisões em sentido oposto, admitindo que prevalece a regra do art. 386 da CLT por ser norma especial:

“(…) TRABALHO DA MULHER. ESCALA DE REVEZAMENTO PREVISTA NO ART. 386 DA CLT. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEIS NºS 605/49 E 10.101/2000. (…)Não obstante, o art. 386 da CLT encerra regra específica em relação ao trabalho da mulher, ao consagrar que ” Havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical”. Assim, em face da aplicação do princípio da especialidade consagrado pelo art. 2º, § 2º, da LINDB, não há se falar em revogação do art. 386 da CLT pelas referidas legislações. (…)” (RR-1584-77.2016.5.12.0036, 6ª Turma, Relatora Desembargadora Convocada Cilene Ferreira Amaro Santos, DEJT 20/09/2019).

“(…) II. RECURSO DE REVISTA REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. ARTIGO 896-A, II, DA CLT. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. ESCALA DE REVEZAMENTO QUINZENAL PARA MULHERES. ARTIGO 386 DA CLT. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. DECISÕES DISSONANTES NO TST. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA CARACTERIZADA. 1. Hipótese em que o Tribunal Regional, proclamando a constitucionalidade do artigo 386 da CLT, por analogia à decisão do Pleno do Tribunal Superior do Trabalho em que reconhecida a constitucionalidade do artigo 384 da CLT, reconheceu o direito às horas trabalhadas em descumprimento à escala de revezamento prevista no artigo 386 da CLT, em que determinado o trabalho aos domingos em escala quinzenal. Considerou, ainda, a Corte Regional que o art. 6º, parágrafo único, da Lei 10.101/2000, que possibilita a abertura aos domingos nas atividades do comércio em geral, assume caráter geral, não derrogando a regra especial do art. 386 da CLT, a teor do art. 2º, § 2º, da LINDB. 2. De acordo com as razões de decidir prevalecentes no julgamento do IIN-RR-1540/2005-046-12-00, lavrado pelo Pleno deste TST, o artigo 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, não encerrando conteúdo discriminatório em relação aos trabalhadores do século masculino, não apenas em razão das diferenças de ordem fisiológica que gravam os referidos sexos, mas também por força da realidade social e familiar diversa a que estão submetidos. Essa mesma compreensão justifica e legitima o critério legal e especial, inscrito no art. 386 da CLT, que deve ser considerado recepcionado pela Constituição Federal de 1988. 3. Consagrada essa diretriz na decisão regional recorrida, o recuso de revista não enseja conhecimento, inexistindo afronta aos artigos 5º, I, 7º, XV e XX, da Constituição Federal, 386 da CLT, 6º da Lei 10.101/2000, 1º da Lei 605/49, bem como contrariedade à Súmula 146 do TST. Julgados desta Corte. Recurso de revista não conhecido” (RR-1585-62.2016.5.12.0036, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 22/05/2020).

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30 de Agosto de 2020