Olá pessoal, tudo certo?
Sem dúvida alguma, os temas decorrentes da aplicação prática do Tema 280, aprovado em repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal em novembro de 2015, é uma das celeumas mais controvertidas dos últimos anos no processo penal.
Conforme já tivemos oportunidade de tratar aqui no blog e, naturalmente, em nossas aulas no Gran Cursos, o STF compreendeu o seguinte:
A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados. (RE 603616, 05.11.2015).
Ora, de acordo com o entendimento acima anotado, constata-se a necessária possibilidade de controle judicial (ainda que posterior) voltado à proteção da inviolabilidade domiciliar, vez que sua ausência culminaria com o esvaziamento potencial desse direito fundamental, mormente em face de ingerências arbitrárias domiciliares (Pacto de São José da Costa Rica, artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, artigo 17, 1).
De acordo com a Corte Suprema, o controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da Constituição Federal, quanto da aplicação da proteção consagrada em tratados internacionais sobre direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico. É fato que a Carta Magna autoriza a flexibilização da inviolabilidade domiciliar em casos de flagrante, mas não será a sua constatação posterior ao ingresso que justificará a medida, sendo, pois, a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados.
Cientes da tese indicando que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando AMPARADO EM FUNDADAS RAZÕES, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito, cuidado redobrado deve se dar em relação ao que será admitido como justificativa para eventual entrada forçada.
Com arrimo nesse entendimento, o STJ já enfrentou situações extremamente polêmicas e controversas que resultaram no reconhecimento de nulidade da diligência e das provas obtidas. O desafio dos candidatos é, cada vez mais, assimilar os casos concretos enfrentados pelos Tribunais Superiores e com probabilidade de serem explorados em prova.
Pensando nisso, entendi pertinente fazer uma lista com alguns dos principais entendimentos, anotando inclusive os respectivos números dos julgados, caso haja interessados em pesquisar ou se aprofundar nas hipóteses. Vejamos esquematicamente:
(i) Denúncia anônima – A denúncia anônima por si só, sem outros elementos que indiquem crime, não legitima que a polícia invada domicílio. Nestes casos, inexiste justa causa para a medida (STJ, REsp 1.871.856).
(ii) Fama de traficante do suspeito – A informação de que o suspeito é conhecido dos meios policiais como traficante de drogas não justifica que a polícia invada domicílio e local de trabalho sem autorização judicial. Tal situação só seria possível pela existência de fundadas razões (STJ, RHC 126.092).
(iii) Tráfico realizado na calçada da rua – O fato de o tráfico de drogas ser realizado na frente ou nas proximidades da moradia do suspeito não autoriza o ingresso de policiais na residência sem autorização judicial. A presunção de que há entorpecentes armazenados no local não basta para justificar a violação do domicílio (STJ, HC 611.918 e REsp 1.886.985).
(iv) Indicativos por cão farejador – A invasão de domicílio sem mandado judicial apenas é legítima quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Cão farejador que aleatoriamente aponta a existência de drogas no local, sem prévia investigação, não é motivo hábil para isso (STJ, HC 566.818).
(v) Perseguição a carro – O fato de um veículo não parar em abordagem policial não justifica que, após perseguição, policiais entrem na casa dos suspeitos sem mandado (STJ, HC 561.360).
(vi) Informação obtida com vizinhos – A existência de denúncia anônima de crimes praticados em uma residência e a posterior confirmação feita por vizinhos não autorizam o ingresso de policiais na residência sem autorização judicial (STJ, HC 609.982).
(vii) Fuga de ronda policial – A fuga de uma iminente abordagem policial, por si só, não autoriza que a polícia entre na casa do cidadão sem mandado judicial (STJ, HC 415.332).
(viii) Saída rápida do portão ao ver viatura policial – O mero avistamento de um indivíduo de pé no portão de sua casa que, ao ver uma viatura policial, se dirige para o quintal ou para o interior de sua residência, sem qualquer denúncia ou investigação prévia, não constitui fundamento suficiente para autorizar a invasão de domicílio sem mandado judicial (STJ, HC 609.072).
(ix) Nervosismo e fuga – O fato de um suspeito, ao ver a aproximação da viatura, correr em direção a um prédio residencial e depois apresentar nervosismo diante da abordagem dos policiais não serve para configurar fundadas razões para ingressar na residência dele sem autorização judicial (STJ, HC 658.403).
Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!
Vamos em frente!
Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.
Excelente! 👏👏