Distinguishing em relação à Súmula 455 do STJ!

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13 de Março de 2023

Olá pessoal, tudo certo?

Hoje analisaremos uma distinção (distinguishing) realizado pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em relação a um verbete de enunciado sumulado do próprio Tribunal. Antes, porém, é preciso conferir contornos precisos acerca da compreensão da distinção.

Devemos compreender o distinguishing como a efetiva e concreta distinção do caso concreto para afastá-lo da subordinação e aplicação da solução repetitiva e/ou vinculante conferida por determinado Tribunal a partir de seus precedentes. Assim, caso constatada a distinção, não se aplica o precedente por falta de subsunção.

Conforme estabelece o professor Fredie Didier, sobre o tema, consiste em uma técnica de confronto do suporte fático precedente com o da demanda a ser julgada, cujo resultado poderá: (a) conduzir à aplicação do precedente no caso concreto, se as eventuais dissemelhanças entre os casos confrontados não forem consideradas relevantes o suficiente para o afastamento daquele, ou; (b) impedir a aplicação do precedente, acaso as divergências fáticas entre os elementos contrastados apresentem grau de importância capaz de afastar a incidência daquele. Por distinguishing, se entende não apenas o método de confronto entre o precedente e o caso concreto, como, também, o resultado desse confronto, quando constada diferença entre os elementos comparados[1].

De acordo com o art. 366 do Código de Processo Penal, se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.

Nesse contexto, sendo possível a determinação de produção antecipada de provas, a orientação firmada no verbete de súmula 455 do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que se exige decisão motivada para justificar tal medida, não sendo idôneo realizá-la com base apenas no mero decurso do tempo.

Contudo, há precedentes do próprio STJ flexibilizando o alcance desse verbete, notadamente quando estivermos diante de agentes de segurança pública que funcionem como testemunhas em infrações penais.

A própria 3ª Seção, quando do julgamento do RHC 64.086/DF (09/12/2016), anotou ser justificável a antecipação de provas para a oitiva de testemunhas policiais, com base apenas nos efeitos deletérios do tempo na memória da pessoa, uma vez que, em casos tais, o simples decurso do tempo traz efetivo risco de perecimento da prova testemunhal, por esquecimento, dada a natureza dessa atividade profissional, diariamente em contato com fatos delituosos semelhantes, devendo ser ouvidas com a máxima urgência possível.

Vale ressaltar ainda que, para a Corte, a realização antecipada de provas não traz prejuízo ínsito à defesa, visto que, a par de o ato ser realizado na presença de defensor nomeado, nada impede que, retomado eventualmente o curso do processo com o comparecimento do réu, sejam produzidas provas que se julgarem úteis à defesa, não sendo vedada a repetição, se indispensável, da prova produzida antecipadamente[2].

Nesse mesmo sentido, admitindo a antecipação de provas com base nos efeitos do tempo na memória da testemunha quando ela for agente de segurança pública, também se declina a orientação do Supremo Tribunal Federal. Vejamos:

Habeas corpus. 2. Homicídio culposo na direção de veículo automotor (artigo 302, caput, da Lei n. 9.503/1997). Réu revel. Citação editalícia. Suspensão do processo e da prescrição nos termos do artigo 366 do CPP. 3. Produção antecipada de provas, ao fundamento de que haveria a possibilidade de “não serem mais localizadas as testemunhas” e porque uma das testemunhas é “policial militar” e pode se esquecer dos fatos. 4. Medida necessária, considerando a gravidade do crime praticado e a possibilidade concreta de perecimento (testemunhas esquecerem de detalhes importantes dos fatos em decorrência do decurso do tempo). 5. Nomeação da Defensoria Pública para acompanhar a colheita cautelar da prova testemunhal. Observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 6. Direito à razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII). A construção de uma justiça mais célere depende da adoção de medidas que preservem os atos praticados, evitando repetições desnecessárias. Ordem denegada (HC 135386, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 13/12/2016).

Dessa maneira, como mencionado anteriormente, recentemente a 6ª Turma do STJ ratificou essa posição, ao concluir o julgamento do AgRg no AREsp 1.995.527/SE. No caso, a Corte constatou que as razões invocadas para determinar a antecipação de provas foram idôneas, tendo em vista a urgência da medida, consubstanciada na possibilidade do perecimento ou da fragilidade dos elementos de convicção, salientando a instância ordinária a necessidade da oitiva antecipada das testemunhas, seja em virtude do lapso temporal de cerca de quatro anos decorridos desde os fatos, seja em razão de AS ÚNICAS TESTEMUNHAS SEREM POLICIAIS MILITARES, estando presente o efetivo risco de fuga do acusado do distrito da culpa e de esquecimento dos fatos pelas testemunhas, pela própria natureza do ofício de quem atua diariamente no combate à criminalidade, circunstâncias essas concretas que justificam a antecipação da prova.

Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

[1] DIDIER JR, Fredie et al. Precedentes. Salvador: Editora Juspodivum, 2016, p. 206.

[2] RHC 64.086/DF, relator Ministro Nefi Cordeiro, relator p/ Acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 23/11/2016, DJe 9/12/2016

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13 de Março de 2023