É válida a prova obtida mediante ingresse policial autorizado pelos avós do investigado? Vejamos o que disse o STJ!

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20 de janeiro2 min. de leitura

Olá pessoal, tudo certo?

Quem me acompanha sabe que eu constantemente faço levantamentos estatísticos sobre os julgados criminais apreciados pelos Tribunais Superiores. Recentemente, afirmei categoricamente que o tema que mais vem crescendo em termos de apreciação dentro da esfera do Superior Tribunal de Justiça – ao menos na seara criminal – são as medidas de busca e apreensão, sobretudo no contexto da inviolabilidade domiciliar e (in)validade de provas.

Imprescindível se faz recordar que o entendimento pacificado no STF, em sede de repercussão geral, e atualmente agasalhado no STJ, é no sentido de não ser necessária certeza quanto à prática delitiva para se admitir a entrada em domicílio, bastando que, em compasso com as provas produzidas, seja demonstrada justa causa para a medida, ante a existência de elementos concretos que apontem para situação de flagrância (RE 603.616/RO). Ademais, prevalece a compreensão de que, nos crimes permanentes, tal como o tráfico de drogas, o estado de flagrância prolonga-se no tempo, o que, todavia, não é suficiente, por si só, para justificar busca domiciliar desprovida de mandado judicial, exigindo-se a demonstração de indícios mínimos de que, naquele momento, dentro da residência, está-se diante de uma situação de flagrante delito.

Revisado isso, vamos entender um caso concreto.

Imagine que policiais tenham avistado um jovem em atividade suspeita (não percepção dos agentes) e, ao ser abordado em frente de sua casa, identificou-se em seu poder 30 gramas de maconha e um valor próximo de dois mil reais. Os agentes pediram para entrar na residência do suspeito, o que fora franqueado por seus avós, idosos. No local, foram encontradas 20 gramas de cocaína e documentos que atestavam ser o jovem um traficando contumaz.

Nessa situação, o flagrante é legal? E as provas obtidas são lícitas?

Um caso muito semelhante ao narrado acima fora apreciado em dezembro do ano passado pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. À época, a Corte deliberou que não foram realizadas investigações prévias nem indicados elementos concretos que confirmassem o crime de tráfico de drogas dentro da residência, não sendo suficiente, por si só, a verificação de atitude suspeita do paciente ou mesmo a sua fuga no momento da abordagem, tampouco a apreensão da droga em sua posse

Ademais, relativamente à autorização para ingresso no domicílio, não há nenhum registro de consentimento do morador para a realização de busca domiciliar. O Tribunal vem reiteradamente decidindo que “as regras de experiência e o senso comum, somadas às peculiaridades do caso concreto, não conferem verossimilhança à afirmação de que [a genitora do paciente] teria autorizado, livre e voluntariamente, o ingresso em seu próprio domicílio, franqueando àqueles a apreensão de drogas e, consequentemente, a formação de prova incriminatória”[1].

Destarte, diante do fato de que a ação policial não esteve legitimada pela existência de fundadas razões (justa causa) para a entrada no imóvel em que se residia o paciente, e que não houve autorização judicial ou válido consentimento do morador para ingresso naquele domicílio, a Corte reconheceu a ilicitude das provas obtidas e suas respectivas anulações.

Diante do panorama probatório restante, houve absolvição do acusado, por ausência de provas (art. 386, II do Código de Processo Penal).

Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido.

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

 

 

[1] HC 598.051/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 02/03/2021, DJe 15/03/2021

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