Estatuto do Torcedor e crime militar

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31 de julho2 min. de leitura

Como já foi divulgado em nosso Gran Cursos Online, foi publicado o Edital n. 1/2022, do Tribunal de Justiça Militar do Estado de Minas Gerais, inaugurando o concurso para provimento, inicial, de 6 cargos de Juiz de Direito do Juízo Militar, com inscrições de 12 de setembro a 11 de outubro de 2022.

Causou espécie a algumas pessoas, ao analisarem o conteúdo programático, a presença de algumas leis penais especiais, especificamente na matéria Direito Penal Militar, integrante do Bloco I, que terá na prova objetiva 20 questões, como o caso do Estatuto do Torcedor, a Lei n. 10.671/2003.

O que este diploma tem com a atuação do Juiz de Direito do Juízo Militar? Não deveria ser exigido apenas no concurso para ingresso na Polícia Militar, já que a eles, policiais militares, caberia a repressão de algumas condutas criminalizadas?

O ponto de partida para compreender a presença deste – e de outros diplomas muito específicos – no edital é lembrar que, após o advento da Lei n. 13.491/2017, crimes comuns podem ser adjetivados como crimes militares, quando praticados em uma das hipóteses das alíneas do inciso II do art. 9º do Código Penal Militar.

Assim, crimes muito propícios de serem praticados na atividade policial-militar – e, portanto, de interesse de conhecimento para o exercício da magistratura na Justiça Militar Estadual –, como os de abuso de autoridade, da Lei n. 13.869/2019, figuram como objeto de interesse, mas não apenas eles, havendo também casos mais raros, como as condutas incriminadas no Estatuto do Torcedor.

Tomemos um exemplo para facilitar a compreensão, o crime de facilitação á atividade de cambista, do art. 41-G do mencionado Estatuto:

Art. 41-G.  Fornecer, desviar ou facilitar a distribuição de ingressos para venda por preço superior ao estampado no bilhete:

Pena – reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa.

Parágrafo único.  A pena será aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o agente for servidor público, dirigente ou funcionário de entidade de prática desportiva, entidade responsável pela organização da competição, empresa contratada para o processo de emissão, distribuição e venda de ingressos ou torcida organizada e se utilizar desta condição para os fins previstos neste artigo.

Note-se que o sujeito ativo deste delito poderá ser qualquer pessoa, inclusive um servidor público, que terá a pena majorada.

Não se exclui, portanto, o cometimento deste delito por um policial militar do Estado de Minas Gerais, por exemplo, quando estiver no policiamento de Choque, em serviço em uma “praça desportiva”, e desviar (tirar de seu destino) ingressos em favor de cambistas.

Uma tal conduta, ao nosso sentir, ferirá a ordem administrativa militar (art. 9º, II, “e”), adjetivando o fato como crime militar e, em consequência, permitindo o processo e julgamento na Justiça Militar, em um Conselho de Justiça (Especial ou Permanente), sob a presidência do Juiz de Direito do Juízo Militar.

É fato que o estatuto, em seu art. 41-A, dispõe que os “juizados do torcedor, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pelos Estados e pelo Distrito Federal para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes das atividades reguladas nesta Lei”, mas esta previsão não impede a análise acima, pois, note-se, não se criou uma justiça especializada – e nem poderia, dado o mote constitucional da matéria –,  tratando-se de Justiça Comum (“Justiça Ordinária”, como diz o artigo), sendo perfeitamente possível entender por crime militar de competência da Justiça Militar, nos termos do art. 125, § 4º da Constituição Federal.

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