Guia errada para depósito recursal trabalhista gera deserção

O uso da guia GFIP após a alteração legislativa inabilita o recurso interposto

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31 de dezembro3 min. de leitura

       Antes da reforma trabalhista, o recolhimento do depósito recursal era realizado por meio da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP), sendo que, quando o trabalhador não estava submetido ao sistema do FGTS, admitia-se o depósito judicial em conta vinculada ao juízo.

        Essa diretriz foi fixada inclusive na Súmula 426 do Tribunal Superior do Trabalho:

“DEPÓSITO RECURSAL. UTILIZAÇÃO DA GUIA GFIP. OBRIGATORIEDADE (editada em decorrência do julgamento do processo TST-IUJEEDRR 91700-09.2006.5.18.0006) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 Nos dissídios individuais o depósito recursal será efetivado mediante a utilização da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social – GFIP, nos termos dos §§ 4º e 5º do art. 899 da CLT, admitido o depósito judicial, realizado na sede do juízo e à disposição deste, na hipótese de relação de trabalho não submetida ao regime do FGTS.”

       Contudo, como se sabe, a reforma trabalhista (Lei 13.467/17) alterou a sistemática, de modo que a regra passou a ser o depósito em conta vinculada ao juízo, na forma do art. 899, § 4º, da CLT:

“Art. 899 (…)

§ 4oO depósito recursal será feito em conta vinculada ao juízo e corrigido com os mesmos índices da poupança.”

      Diante da alteração legal, o Tribunal Superior do Trabalho demonstrou clara preocupação com a aplicação das regras processuais novas em relação aos processos pendentes, tendo editado a Instrução Normativa 41/2018, cujo art. 20 disciplina:

“Art. 20. As disposições contidas nos §§ 4º, 9º, 10 e 11 do artigo 899 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.467/2017, serão observadas para os recursos interpostos contra as decisões proferidas a partir de 11 de novembro de 2017.”

         Assim, se a decisão fosse proferida após a vigência da reforma trabalhista, a nova disposição já deveria ser seguida para os recursos que seriam interpostos.

        Além disso, o Ato 13/2017/GCGJT alterou o art. 71 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho para especificar a guia adequada:

“Art. 1° O artigo 71, ‘caput’, da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho passa a vigorar com o seguinte texto:

‘Art. 71. As guias de depósito judicial para pagamentos, garantia de execução, encargos processuais, levantamento de valores e depósitos recursais seguirão o modelo único padrão estabelecido na Instrução Normativa nº 36 do Tribunal Superior do Trabalho , ou outra que venha a substituí-la.’”

       Como se não bastasse, a Instrução Normativa 3/93 foi alterada pela Resolução Administrativa 2.048/18 para constar no item VIII:

“VIII – O depósito recursal, realizado em estabelecimento bancário oficial em conta vinculada ao juízo, mediante guia de depósito judicial, e corrigido com os mesmos índices da poupança (art. 899, § 4°, da CLT), será da responsabilidade da parte quanto à exatidão dos valores depositados e deverá ser comprovado, nos autos, pelo recorrente, no prazo do recurso a que se refere, independentemente da sua antecipada interposição, observado o limite do valor vigente na data da efetivação do depósito, bem como o contido no item VI. No caso de agravo de instrumento, o depósito recursal deverá ser comprovado no ato de interposição do recurso, nos ternos do art. 899, § 7º, da CLT, com a redação da Lei n.º 12.275/2010.”

       A dificuldade surgiu diante do fato de que alguns litigantes, mesmo quando a decisão judicial de seus processos foi publicada após a vigência da reforma, continuaram efetuando o depósito recursal através da guia GFIP.

       Apesar de haver erro quanto à guia, várias vozes se levantaram no sentido de que não haveria qualquer prejuízo ao processo, porquanto o juiz continua podendo movimentar o depósito efetuado na conta vinculada do FGTS. Assim, o erro não seria grave o bastante para justificar o reconhecimento de deserção, segundo essa corrente.

     No entanto, não foi essa diretriz que prevaleceu, visto que a Subseção I de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho consolidou entendimento pela deserção do recurso, cujo depósito foi realizado com base em guia errada. Leia o julgado:

“EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. DESERÇÃO DO RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. UTILIZAÇÃO DA GFIP. NÃO UTILIZAÇÃO DA GUIA DE DEPÓSITO JUDICIAL TRABALHISTA. Afigura-se deserto recurso ordinário interposto na vigência da Lei nº 13.467/2017 se não se efetiva o depósito recursal mediante utilização da guia de depósito judicial em conta vinculada ao juízo, conforme o art. 899, § 4º, da CLT, o Ato nº 13/GCGJT, de 13 de novembro de 2017, a Instrução Normativa nº 41 do TST, art. 20, e a Resolução Administrativa nº 2048. A Súmula 426 do TST, que prevê a utilização obrigatória da guia GFIP, somente se aplica aos recursos interpostos antes da alteração da lei. Embargos conhecidos e desprovidos” (E-RR-1001499-86.2016.5.02.0316, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 13/12/2019).

      Ressalte-se que o fato de a Súmula não ter sido alterada ou cancelada não impede a deserção, seja porque a observância da lei não pode ser afastada, seja porque o entendimento sumular foi formado antes da alteração legal. Leia esse trecho do voto condutor da decisão da SDI-I:

“Com efeito, não obstante a redação da Súmula 426 do TST, que não foi alterada ou cancelada, a alteração legislativa produz efeitos a partir da vigência da lei que a implementou, não sendo possível à parte escusar-se ao seu cumprimento, mesmo que alegue dela não conhecer (art. 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

Quanto ao mais, tratando-se de entendimento jurisprudencial consolidado em decorrência da reiteração das decisões do TST no mesmo sentido, a súmula em epígrafe não pode prevalecer sobre o legislado, sobretudo porque o entendimento nela consubstanciado foi construído com fundamento na redação anterior do art. 899, § 4º, da CLT.”

      Dessa forma, conclui-se que o TST não conhece o recurso por deserção (falta de pressuposto extrínseco), quando ocorre o recolhimento do depósito recursal pela GFIP, se a decisão recorrida foi proferida após a vigência da reforma trabalhista.

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