(IM)Possibilidade de insignificância no contrabando de pequena quantidade de medicamentos, na visão do STJ!

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Olá pessoal, tudo certo?

Iniciaremos os comentários e textos aqui no blog nesse ano de 2022 tratando de um tema recorrente em provas de concurso público na seara criminal: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA!

Especificamente, gostaria de tratar acerca da insignificância nos crimes de contrabando. É que, ao contrário do que temos para o descaminho, a regra no tratamento daquele delito é quanto à inaplicabilidade da bagatela própria.

 

E por qual razão esse tratamento é diferenciado, Pedro?

É que, consoante o reiterado entendimento das Corte Superiores, no contrabando, o prejuízo não é APENAS de caráter tributário, uma vez que a importação de produtos absoluta ou relativamente proibidos tem o condão de causar potencialmente danos de maior gravidade. Eis alguns exemplos concretos em que tal compreensão é observada:

 

(i) Importação de cigarros, ainda que em quantidade pequena[1];

(ii) Importação de medicamentos[2];

(iii) Importação de arma de pressão, independentemente do calibre[3];

(iv) Importação  de colete balístico[4];

(v) Importação de peças de máquinas de jogo[5] – “caça-níqueis”.

 

Nesse sentido, indubitável afirmarmos corretamente, de forma genérica, que – de acordo com a compreensão exarada pelo STF e STJ – o contrabando é incompatível com a incidência do princípio da insignificância, uma vez que o dano causado com esse delito suplanta a esfera patrimonial, atingindo valores e bens outros, caros ao ordenamento jurídico e incompatível com o status bagatelar.

Entretanto, é preciso redobrar os cuidados com as EXCEÇÕES.

Nesse contexto, imperioso anotar que o próprio Superior Tribunal de Justiça vem excepcionando o seu entendimento e admitindo o reconhecimento da atipicidade material pela insignificância em se tratando de importação de pequena quantidade de medicamentos. Segundo a Corte, é certo que o contrabando deve ser aplicado aos casos em que suficientemente caracterizado o dolo do agente em introduzir no território nacional mercadoria que sabe ser de proibição absoluta ou relativa. Não se pode olvidar, ainda, o princípio da proporcionalidade quando se constatar que a importação do produto se destina ao uso próprio (pelas características de quantidade e qualidade) e não é capaz de causar lesividade suficiente aos bens jurídicos tutelados como um todo[6].

Em recente posicionamento, a 6ª Turma do STJ ratificou essa compreensão, conforme se extrai do didático excerto abaixo colacionado:

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. IMPORTAÇÃO IRREGULAR DE MEDICAMENTOS DE ORIGEM ESTRANGEIRA. PEQUENA QUANTIDADE PARA CONSUMO PRÓPRIO. HIPÓTESE EXCEPCIONAL DE INCIDÊNCIA DO CRIME DE BAGATELA. RECURSO MINISTERIAL. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. 1. Em regra, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não admite a incidência do princípio da insignificância aos delitos de contrabando de medicamentos. 2. EM HIPÓTESES EXCEPCIONAIS, CONTUDO, A ORIENTAÇÃO DESTA CASA PERMITE O RECONHECIMENTO DA INFRAÇÃO BAGATELAR SE A QUANTIDADE APREENDIDA É PEQUENA E DESTINADA AO CONSUMO PRÓPRIO, COMO CONSIDEROU O ACÓRDÃO RECORRIDO. Isso ocorre tendo em vista a falta de lesão ou perigo de lesão ao bem juridicamente tutelado pela norma penal incriminadora, sob o ponto de vista da tipicidade material. Precedentes. 3. Na hipótese, a Corte regional decidiu que a agravada adquiriu pequena quantidade de fármaco a preço mais favorável e para consumo pessoal. Fixadas pelo aresto recorrido a ausência de potencial lesivo à saúde pública e a falta de destinação comercial dos produtos, rever esse entendimento, como alega o Ministério Público, demandaria o reexame dos elementos fático-probatórios, o que é defeso em recurso especial, em virtude do que preceitua a Súmula n. 7 desta Corte. 4. Nos termos da jurisprudência deste Tribunal Superior, é defeso, em âmbito de agravo regimental, ampliar a quaestio veiculada nas razões do recurso especial. 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1724405/RS, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/10/2018, DJe 06/11/2018)[7].

 

Pedro, dominar isso é realmente importante??

Demais! Além de, como sempre digo e repito em aula, o candidato precisar estar com atenção redobrada às exceções, temos percebido que, estatisticamente, os examinadores têm ampliado a cobrança de temas que estão espelhados na ferramenta do Superior Tribunal de Justiça chamada “Jurisprudência em Teses”.

Nessa seção no site do Tribunal, encontramos a edição 81 “Crimes contra a Administração Pública”, na qual observamos a seguinte tese no item 4:

“A importação clandestina de medicamentos configura crime de contrabando, aplicando-se, excepcionalmente, o princípio da insignificância aos casos de importação não autorizada de pequena quantidade para uso próprio”.

Não bastasse isso, recentemente, na primeira semana de janeiro de 2022, fora encaminhado através de e-mail do próprio STJ um compilado de “pesquisa pronta” justamente noticiando esse tema.

Ou seja, temos mais do que razões para afirmar que esse tema está na órbita dos operadores do direito e, sobretudo, do seu examinador. Até porque se muita gente conhece a regra, posso categoricamente afirmar que poucos são os que dominam essa exceção!

Agora, você já sabe e não vai escorregar em eventual pegadinha, bacana?

Espero que tenham gostado e, principalmente, entendido!

Vamos em frente.

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

 

 

 


[1] STF: HC 131.205/MG, DJe 22/09/2016; STJ: AgRg no AREsp 697.456/SC, DJe 28/10/2016.

[2] STJ: AgRg no REsp 1.500.691/SP, DJe 26/10/2016.

[3] STJ: AgRg no REsp 1.479.836/RS, DJe 24/08/2016.

[4] STJ, RHC 62.851/PR, DJe 26/02/2016.

[5] STJ: EREsp 1.230.325/RS, DJe 05/05/2015.

[6] REsp 1428628/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 12/05/2015.

[7] Na mesma linha, é a orientação da 5ª Turma. Vejamos:

PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. IMPORTAÇÃO DE MEDICAMENTO. PEQUENA QUANTIDADE. USO PRÓPRIO. EXCEPCIONALIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. EMBARGOS ACOLHIDOS. 1. A importação de pequena quantidade de medicamento destinada a uso próprio denota a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, tudo a autorizar a excepcional aplicação do princípio da insignificância. 2. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para negar provimento ao recurso especial. (EDcl no AgRg no REsp 1708371/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 24/04/2018, DJe 11/05/2018).

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