Ao contrário do que se dá com os Estados estrangeiros, no caso dos Organismos a imunidade de jurisdição não se funda na praxe internacional. Decorre, ao revés, de expressa previsão em ajuste internacional, de sorte que sua inobservância representaria, em última análise, a quebra de um pacto internacional, o que poderá render ensejo a enorme instabilidade das relações na comunidade internacional.
A máxima de que entre iguais não há jurisdição (princípio “par in parem non habet judicium”) e que fundamenta a imunidade de jurisdição entre Estados estrangeiros não se aplica às organizações internacionais. Para essas, como dito, a imunidade de jurisdição tem origem convencional, ou seja, nos seus tratados constitutivos, sendo que a jurisprudência pátria atualmente entende que sua imunidade é absoluta, ao contrário da dos Estados, que é relativa, não admitindo a jurisprudência sua relativização.
O Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida nos autos do Processo nº RE 1.034.840, julgado pelo Tribunal Pleno em 30.6.2017, ao analisar o tema “Imunidade de jurisdição dos organismos internacionais garantida por tratado firmado pelo Brasil”, firmou a seguinte tese (Tema 947), em repercussão geral:
“O organismo internacional que tenha garantida a imunidade de jurisdição em tratado firmado pelo Brasil e internalizado na ordem jurídica brasileira não pode ser demandado em juízo, salvo em caso de renúncia expressa a essa imunidade” (RE 1.034.840, Relator Ministro Luiz Fux, julgamento finalizado no Plenário Virtual em 02/06/2017) (gn).
Sobre o tema, a Orientação Jurisprudencial nº 416 da SBDI-1 do TST consagra o entendimento consolidado na jurisprudência da mais alta Corte Trabalhista:
IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. ORGANIZAÇÃO OU ORGANISMO INTERNACIONAL. (DEJT divulgado em 14, 15 e 16.02.2012) (mantida conforme julgamento do processo TST-E-RR-61600-41.2003.5.23.0005 pelo Tribunal Pleno em 23.05.2016). As organizações ou organismos internacionais gozam de imunidade absoluta de jurisdição quando amparados por norma internacional incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro, não se lhes aplicando a regra do Direito Consuetudinário relativa à natureza dos atos praticados. Excepcionalmente, prevalecerá a jurisdição brasileira na hipótese de renúncia expressa à cláusula de imunidade jurisdicional. (gn)
Deste modo, o organismo internacional que tenha garantida a imunidade de jurisdição em tratado firmado pelo Brasil e internalizado na ordem jurídica brasileira não pode ser demandado em juízo, seja em processo de conhecimento, seja em processo de execução, salvo em caso de renúncia expressa a essa imunidade.
Haverá renúncia expressa à imunidade de jurisdição, por exemplo, se ficar estabelecido entre as partes a eleição de foro situado no Brasil para a solução de eventuais litígios entre as Partes (AIRR-52640-20.2003.5.10.0018, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 18/10/2019).
Importante dizer que nos casos que envolvam Organismos Internacionais, uma vez acionada na Justiça do Trabalho alguma dessas organizações, deverá o magistrado, de ofício, determinar a juntada do seu tratado constitutivo aos autos. Estes tratados normalmente preveem a imunidade de jurisdição da organização internacional tanto para o processo de conhecimento quanto para o de execução.
Daí porque, acionada a organização internacional, deve o Juiz, de ofício, determinar a juntada aos autos do tratado respectivo para que se possa examinar a questão, que precede a todas as outras, pois a imunidade das organizações é regida pelos respectivos convênios constitutivos.
Como se nota, o exame da questão passa, necessariamente, pela análise do conteúdo de tais tratados, a partir dos quais será possível definir o exato alcance da imunidade de jurisdição das referidas instituições. Trata-se, portanto, de uma análise casuística.
Já sobre a responsabilidade subsidiária de ente público em casos de terceirização firmada com Organismos Internacionais, o Tribunal Superior do Trabalho enfrentou caso que envolvia a responsabilidade subsidiária de ente público brasileiro como decorrência de terceirização firmada via convênio ou acordo de cooperação técnica com Organismo Internacional. No caso concreto, a UNESCO, na qualidade de prestadora de serviços, celebrou convênio com a União, contratante dos serviços, pondo à sua disposição o trabalho de pessoa física.
Inicialmente, a jurisprudência do TST inclinou-se para reconhecer a responsabilidade subsidiária do ente público brasileiro, com base na súmula nº 331 do TST e no fundamento de que não se pode eximir a contratante de serviços da responsabilidade subsidiária pelas obrigações trabalhistas da prestadora de serviços, ainda que a prestadora seja organismo internacional. Nesse sentido: TST-RR-1.112/2004-005-10-85.0, 5ª Turma, Rel. Ministro João Batista Brito Pereira, DEJT de 04/12/2009.
Apesar deste entendimento, faz-se necessário frisar que a C. SbDI-1 do TST, na sessão do dia 3/9/2009 (E-ED-RR 900/2004-019-10-00.9), reconheceu a imunidade absoluta de jurisdição dos Organismos Internacionais, quando assegurada por norma internacional ratificada pelo Brasil. Por corolário lógico desse entendimento jurisprudencial, como não é possível responsabilizar a prestadora de serviços em razão da imunidade de jurisdição, não subsiste também responsabilidade subsidiária em caso de terceirização firmada via convênio com organismo internacional. Este é o entendimento atual do TST quando ao tema. Neste sentido: RR-43140-65.2004.5.20.0001, 6ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 10/09/2010.
Importante registrar que no julgamento acima o Ministro Relator Maurício Godinho Delgado ressalvou seu entendimento em sentido diverso: “ressalva do entendimento deste Relator, que compreende não haver espaço na Constituição para regra internacional supressora de direitos humanos, sociais e econômicos da pessoa humana trabalhadora (art. 5º, §2º, CF). O princípio da norma mais favorável e a diretriz da vedação do retrocesso têm firme assento constitucional desde 05.10.1988, como se sabe”.
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