Jurisprudência Comentada: A colheita compulsória de material genético dos acusados versus o princípio do nemo tenetur se detegere

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súmula 606Gran OAB | Cursos Online
A recente decisão do TRF da 1ª Região: a colheita compulsória de material genético dos acusados versus o princípio do nemo tenetur se detegere
Como se sabe, a identificação criminal em solo pátrio encontra respaldo constitucional, sendo disciplinada no art. 5º, LVIII, que prescreve: “o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”.
A Lei n. 12.654, de 2012, criou a possibilidade de extração compulsória de material genético de investigados.
A nosso ver, tal norma, que permite a colheita compulsória do material genético de investigados ou acusados, afronta o princípio da não autoincriminação – o nemo tenetur se detegere.
Em razão da presunção da não culpabilidade, impede-se que as pessoas sejam obrigadas a se autoacusar e garante-se também o chamado direito ao silêncio.
Ademais, o Brasil assumiu compromisso internacional neste sentido, uma vez que signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Decreto n. 678, de 1992.
Sobre o tema, o art. 8º, número 2, alínea “g”, do Pacto de São José da Costa Rica prevê que “toda a pessoa tem direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem declarar-se culpada”.
Por óbvio que, em um processo penal acusatório, ninguém tem que se descobrir para contribuir na sua própria punição criminal, seja prestando declarações, fornecendo padrão gráfico para exame grafotécnico ou soprando bafômetro para constatar embriaguez. Igualmente, não pode ser compelido a fornecer seu material genético para incriminá-lo.
Sabe-se que o Estado é a parte mais forte na persecutio criminis, possuindo agentes e instrumentos aptos a buscar e descobrir provas contra o autor do crime. Prescinde-se, pois, da colaboração do próprio acusado. Essa é a regra, pois existe o instituto da colaboração premiada.
Corroborando com o entendimento esboçado acima, citamos a recente decisão da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Processo nº: 0002272-80.2017.4.01.3823/MG), que, em 22/2/2018, julgou improcedente pedido do Ministério Público Federal para que fosse realizada identificação criminal de investigado por crime de roubo.
A decisão, por maioria, seguiu o voto divergente proferido pelo desembargador federal Néviton Guedes.
Nos autos do processo, constava que o investigado fora preso em flagrante, no dia 07 de junho de 2017, por roubar uma agência dos Correios mediante o uso de arma de fogo em concurso de pessoas. A autoridade policial requereu a identificação criminal da coleta de material biológico para obtenção de perfil genético, tendo em vista que ele não portava nenhum documento de identificação pessoal no momento da prisão.
Ao analisar o caso, o juiz federal convocado, Clodomir Sebastião Reis, entendeu que o pedido do MPF deveria ser atendido ao fundamento de que, se tal medida não for tomada, ficará comprometido o sucesso da investigação deste caso, bem como de outros em aberto, possivelmente praticados pelo mesmo grupo criminoso.
No Tribunal, o desembargador federal Néviton Guedes proferiu voto divergindo do relator. Destacou que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de que ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo.
Destacou, ainda, que, segundo o pretório excelso, haveria a violação do princípio da dignidade humana, da intimidade, da intangibilidade do corpo humano, do império da lei e da inexecução específica e direta de obrigação de fazer (provimento judicial que implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao laboratório para coleta do material indispensável à feitura de exame).
Por fim, enfatizou que “a Constituição Federal não consente com qualquer possibilidade de forçar o acusado em processo penal a produzir prova contra ele mesmo, especialmente quando o meio de prova pressupõe método invasivo de sua integridade física ou moral”.
Acertada a decisão do TRF da 1ª Região, pois, à luz do nemo tenetur se detegere, não se pode exigir que o acusado produza provas contra si próprio, uma vez que as provas acerca da sua culpabilidade devem ser colhidas sem a necessidade da sua colaboração.
Devem-se impor limites aos poderes do Estado-juiz, fazendo-se respeitar o devido processo legal, a presunção da não culpabilidade e o sistema processual penal acusatório.


José Carlos Ferreira JrJosé Carlos – Professor Universitário e Advogado, com especialização em Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Ambiental e Recursos Hídricos. Doutorando em Direito Penal pela Universidade de Buenos Aires (UBA). Professor Titular de Direito Penal e Direito Processual Penal na Universidade Católica de Brasília (UCB). Professor Titular das Faculdades Integradas da União Educacional do Planalto Central (FACIPLAC) nas áreas de Direito Penal, Processo Penal e Laboratório de Prática Jurídica. Participante de bancas examinadoras de Concursos Públicos.
 
 


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