Momento Filosofia OAB: discurso jurídico como discurso especialC

A oposição da teoria da argumentação de Alexy aos fundamentos da tópica de Viehweg

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Caras e caros colegas,

Como vimos anteriormente, a tópica de Viehweg influenciou fortemente as modernas teorias da argumentação jurídica. Contudo, ao enfatizar que o problema é o ponto de partida para a decisão jurídica, que se constrói por meio de uma espécie de duelo argumentativo, seu pensamento foi acusado de assistemático e casuístico.

Segundo Atienza, a tópica teve grande êxito na teoria do Direito da Europa continental, convertendo-se em um dos centros a partir do qual se debateu a questão do método jurídico. Em suas palavras, “com relação às muitas discussões que, a partir daí, se sucederam sobretudo, naturalmente, na Alemanha – entre partidários e os detratores da tópica, é preciso dizer que, em geral, o debate foi proposto em termos não muito claros, devido em grande parte ao caráter esquemático e impreciso da obra fundadora de Viehweg” (ATIENZA, 2003, p. 59/60)

A falta de sistematização da tópica e a possibilidade de agravamento da insegurança jurídica pela sua utilização também foram alvos de críticas por parte de Robert Alexy. Segundo o autor, o fato de as argumentações que utilizam um topos como ponto de partida não serem encaradas como verdades absolutas, mas apenas como plausíveis, razoáveis, geralmente aceitas ou prováveis, daria uma perspectiva muito generalizante, além de não incluir a lei, a dogmática e os precedentes na teoria da argumentação jurídica. As formulações muito genéricas dos topoi os tornam inúteis (ALEXY, p. 31-32).

Com base nessa crítica, que reconhece a necessidade de uma discussão metodológica sobre a tópica, Alexy afirma a necessidade de se elaborar uma teoria sobre a teoria da argumentação jurídica racional contemporânea. É isso mesmo, uma teoria das teorias, que seria capaz de evitar arbitrariedades no processo de realização do direito. Com isso, o autor pretende colaborar com a difícil tarefa de preservar a segurança jurídica, sem engessar o direito, elaborando uma das mais completas teorias da argumentação jurídica (ALEXY, p. 34).

Em síntese, Alexy defende que a tarefa de administrar a justiça segundo a lei e, sobretudo, segundo a constituição, exige um ato de cognição que inevitavelmente envolve um elemento discricionário, mas não comporta arbitrariedades. Por essa razão, as decisões judiciais têm de ser fundamentadas na argumentação racional. Em suas palavras, “deve ficar evidente que a lei escrita não cumpre a tarefa de promover uma justa resolução dos problemas legais. Nesses casos, a decisão judicial fecha a brecha de acordo com os padrões da razão prática e dos conceitos de justiça bem fundamentados na comunidade” (ALEXY, p. 34).

A teoria da argumentação jurídica proposta por Alexy é, portanto, normativa e elenca regras de justificação que devem ser observadas pelo órgão responsável pela decisão judicial. Para que as decisões tomadas sejam consistentes e passíveis de controle, é imprescindível a observância de regras de justificação interna e externa do discurso jurídico, sob pena de perda da legitimidade do Poder Judiciário e enfraquecimento do próprio Estado Democrático de Direito.

No que se refere à justificação interna, Alexy ultrapassa os positivistas mais extremos, que identificam tal atividade com o mero silogismo. Mas já vimos que existem casos que não se subsomem à norma, devendo ser solucionados pela ponderação axiológica das proposições jurídicas.

Já a justificação externa diria respeito à possibilidade de analisar a correção das próprias premissas, aplicando-se algumas regras, como, por exemplo, as regras da argumentação prática e empírica, as regras que decorrem dos métodos clássicos da interpretação do texto normativo, a própria argumentação dogmática, que ganha um caráter cientifico-conceitual, além do uso dos precedentes e das formas especiais de argumentos jurídicos (analogia, argumentum a contrario, argumentum a fortiori e argumentum ad absurdum).

Em síntese, Alexy reconhece que discurso jurídico é sim um discurso prático, pois se constitui de enunciados normativos, mas, ao mesmo tempo, é racional, pois está submetido à pretensão de correção discursivamente obtida, exigível em um contexto de Estado Democrático de Direito.

Mas para além disso, o discurso jurídico é um discurso especial, que se subordina a condições limitadoras, que não existem no discurso prático racional geral, como é o caso da lei, da dogmática e dos precedentes. Como ele mesmo afirmou, “essas condições, que institucionalizam o discurso jurídico, reduzem consideravelmente seu campo do discursivamente possível, na medida em que delimitam mais precisamente de quais premissas devem partir os participantes do discurso, fixando ainda as etapas da argumentação jurídica, mediante as formas e regras dos argumentos jurídicos” (ALEXY, p. 35).

E vocês, com quem concordam? É possível objetivar a justificação da decisão jurídica?

Até breve,

Chiara Ramos

Doutoranda em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, em co-tutoria com a Universidade de Roma – La Sapienza. Graduada e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Procuradora Federal, desde 2009. Atualmente exerce o cargo de Diretora da Escola da Advocacia Geral da União. É Editora-chefe da Revista da AGU, atualmente qualis B2. É instrutora da Escola da AGU, desde 2012. Foi professora da Graduação e da Pós-graduação da Faculdade Estácio Atual. Aprovada e nomeada em diversos concursos públicos, antes do término da graduação em direito, dentre os quais: Procurador Federal, Oficial de Justiça do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Técnica Judiciária do Tribunal Regional do Trabalho 6ª Região, Técnica Judiciária do Ministério Público de Pernambuco, Escrivã da Polícia Civil do Estado de Pernambuco.

ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica. São Paulo: Landy Editora, 2001.

ATIENZA, Manuel. As Razões do Direito: Teorias da Argumentação Jurídica. 3. ed. São Paulo: Landy, 2003.

CAMARGO, Margarida Maria Lacombe. Hermenêutica e Argumentação: uma contribuição ao estudo do direito. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

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