A nova lei de licitações e contratos (Lei 14.133/2021) trouxe diversas alterações que afetam substancialmente o Direito Administrativo, mas também atinge outros ramos, como o Direito do Trabalho.
O novo diploma, apesar de informar que somente o contratado pela Administração será responsável pelos encargos trabalhistas, expressamente reconhece a responsabilidade subsidiária se for comprovada a falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado:
“Art. 121. Somente o contratado será responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 2º Exclusivamente nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, a Administração responderá solidariamente pelos encargos previdenciários e subsidiariamente pelos encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado.”
A questão certamente não é nova, mas se trata de um avanço ter legislador expressamente reconhecido uma responsabilidade já sedimentada há muito tempo pelo Tribunal Superior do Trabalho, mormente na Súmula 331, IV e V:
“CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE
IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.”
No entanto, o que seria serviço contínuo com regime de dedicação exclusiva de mão de obra a que se refere o art. 121, § 2º, da nova lei? O art. 6º, XVI, da lei mencionada esclarece:
“Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
XVI – serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra: aqueles cujo modelo de execução contratual exige, entre outros requisitos, que:
a) os empregados do contratado fiquem à disposição nas dependências do contratante para a prestação dos serviços;
b) o contratado não compartilhe os recursos humanos e materiais disponíveis de uma contratação para execução simultânea de outros contratos;
c) o contratado possibilite a fiscalização pelo contratante quanto à distribuição, controle e supervisão dos recursos humanos alocados aos seus contratos;”
Claro que isso gera novos debates. De plano, já se pergunta: eventual uso dos mesmos trabalhadores para prestar serviços para a Administração e também para outros tomadores de serviço automaticamente elimina essa responsabilidade da Administração? Não poderia haver, ao menos, uma responsabilidade limitada ao benefício recebido pelo trabalho prestado?
E se houver uma predominância de mão de obra, mas não uma dedicação exclusiva? Estaria o legislador criando um critério discriminatório? Está aberta a temporada de novas discussões jurídicas.
De toda sorte, o diploma também incrementou e normatizou o arsenal de medidas que o administrador pode tomar para impedir que ônus financeiro recaia sobre o ente ou entidade contratante. Para assegurar o adimplemento dessas obrigações, a lei previu uma série de medidas que auxiliam a assegurar que o contratado cumprirá suas obrigações:
“Art. 121 (…)
§ 3º Nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, para assegurar o cumprimento de obrigações trabalhistas pelo contratado, a Administração, mediante disposição em edital ou em contrato, poderá, entre outras medidas:
I – exigir caução, fiança bancária ou contratação de seguro-garantia com cobertura para verbas rescisórias inadimplidas;
II – condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas vencidas relativas ao contrato;
III – efetuar o depósito de valores em conta vinculada;
IV – em caso de inadimplemento, efetuar diretamente o pagamento das verbas trabalhistas, que serão deduzidas do pagamento devido ao contratado;
V – estabelecer que os valores destinados a férias, a décimo terceiro salário, a ausências legais e a verbas rescisórias dos empregados do contratado que participarem da execução dos serviços contratados serão pagos pelo contratante ao contratado somente na ocorrência do fato gerador.”
Uma das medidas mais eficazes é a exigência de comprovação da quitação das verbas trabalhistas pelo contratado. A empresa prestadora de serviços, assim, pode ter o seu pagamento da parcela do contrato administrativo vinculado à demonstração de que está em dia com as obrigações trabalhistas perante seus empregados.
Ademais, a possibilidade de pagamento direto ao trabalhador das verbas devidas e inadimplidas pela empresa prestadora permite um resultado mais eficaz com vistas a evitar responsabilidade da Administração.
Parabéns pela abordagem. Porém uma questão é importante tb se salientar. O § 2º, ao exigir a comprovação da falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado, estaria a estabelecer, ainda que de forma não explícita, o ônus da prova ao empregado.