Antes da pandemia do novo coronavírus, havia vezes em que o empregador e o empregado simulavam a dispensa sem justa causa para permitir que o saque do FGTS. Tratava-se de prática fraudulenta.
Para facilitar a fiscalização, a Portaria 384/92 do extinto Ministério do Trabalho criou uma presunção relativa de fraude. Se o trabalhador fosse recontratado em menos de 90 dias, incidiria a presunção. Veja o preceito:
Art. 2º Considera-se fraudulenta a rescisão seguida de recontratação ou de permanência do trabalhador em serviço quando ocorrida dentro dos noventa dias subseqüentes à data em que formalmente a rescisão se operou.
Contudo, com a pandemia e a imensa dispensa de trabalhadores, medidas tiveram que ser adotadas para facilitar a recontratação, porquanto o momento é sui generis.
Logo, considerando o retorno das atividades econômicas em várias localidades, e tendo em vista a necessidade de permitir a volta de pessoas ao trabalho, a Portaria 16.655/2020 da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho afastou essa presunção de fraude. Veja a regra nova:
Art. 1º Durante o estado de calamidade pública de que trata o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, não se presumirá fraudulenta a rescisão de contrato de trabalho sem justa causa seguida de recontratação dentro dos noventa dias subsequentes à data em que formalmente a rescisão se operou, desde que mantidos os mesmos termos do contrato rescindido.
Parágrafo único. A recontratação de que trata o caput poderá se dar em termos diversos do contrato rescindido quando houver previsão nesse sentido em instrumento decorrente de negociação coletiva.
No entanto, o Poder Executivo acrescentou um parágrafo único que autoriza, mediante convenção ou acordo coletivo, a recontratação em termos diversos do contrato primitivo.
Surgiu, então, a nova polêmica: se houver norma coletiva autorizadora, o trabalhador regularmente dispensado durante a pandemia poderia ser recontratado dias ou poucos meses depois COM SALÁRIO INFERIOR?
Ressalte-se que, por um lado, o art. 7º, VI, da Constituição Federal permite uma exceção à irredutibilidade salarial, sendo ela exatamente a autorização por norma coletiva. Por outro lado, existe risco de alguns empregadores, com base na autorização normativa eventualmente existente para facilitar o retorno de trabalhadores, dispensar os empregados sob pretexto de dificuldade econômica inexistente para os recontratar posteriormente com a remuneração menor.
De fato, a matéria ainda é muita nova e vai levar tempo significativo até a consolidação em Tribunais Trabalhistas.
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