Por Bruno de Mello
Antes da reforma do Código Penal em 1984, prevalecia o entendimento de que toda espécie de erro afetava a culpabilidade, inclusive o erro de tipo (chamado de erro de fato), excluindo-a, pois, com a teoria causal/naturalista da ação, de Von Liszt, Beling e Radbruch, o dolo fazia parte dessa categoria penal. # artigo
Atualmente, a teoria unitária perdeu sentido, e impera a teoria diferenciadora, que distingue erro de tipo de erro de proibição.
O erro de tipo é uma espécie de erro em que o agente age, atua ou opera com a falsa percepção da realidade e divide-se em:
I – Essencial: aquele que recai sobre o elemento principal do tipo penal; e
II – Acidental: incidente sobre elemento secundário, paralelo, que nada tem a ver com o tipo penal incriminador.
O erro de tipo essencial se classifica em:
- a) Vencível/evitável/inescusável: está esculpido no art. 20 do Código Penal: “O erro sobre elemento constitutivo do tipo penal exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposose previsto em lei”. Exemplo clássico reiterado na doutrina é o de um caçador que, ao ver um vulto e o balançar no arbusto, atira para matar um animal, porém acaba por matar outro caçador. Note-se: o elemento subjetivo “dolo” está presente, vontade de matar, porém o agente errou sobre o elemento objetivo principalno tipo penal do homicídio (alguém), devendo, então, ser responsabilizado por homicídio culposo, delito previsto no art. 121, §3º, do CP. No entanto, caso o agente pegue uma carteira supondo ser a dele, também estaremos diante do mesmo erro em tela; contudo, não haverá qualquer punição, pois não há que se falar em furto culposo.
Nas brilhantes palavras do professor Juarez Cirino dos Santos: “[…] o erro de tipo incide apenas sobre o elemento objetivo do tipo […] pode-se dizer que o erro de tipo representa defeito na formação intelectual do dolo, que tem por objeto os elementos objetivos do tipo legal, presentes ou futuros”.
Na esteira do raciocínio, há o que a doutrina classifica de erro de tipo essencial:
- b) Invencível/inevitável/escusável:o qual exclui tanto o dolo quanto a culpa. E sem dolo e sem culpa não há que se falar em conduta punível.
Por outro lado, temos o erro de tipo acidental, que se subdivide em:
- a) Erro sobre a coisa(error in objecto.: O agente pretende furtar uma joia, mas confunde-se e subtrai bijuteria).
- b)Erro determinado por terceiro(art. 20, §2º. Ex.: O médico entrega uma injeção com substância letal a uma enfermeira afirmando se tratar de medicamento para dor. Responde pelo crime o médico que determinou o erro).
- c) Erro sobre a pessoa(error in persona. 20, §3º. Ex.: A, querendo matar B, mata C achando se tratar de B, pois confundiu as características físicas. Responde como se tivesse matado B, conforme suas qualidades e condições pessoais inerentes).
- d) Erro na execução(aberratio ictus. 73. Ex.: O agente atira em fulano, mas erra o tiro e acerta beltrano).
- e) Resultado diverso do pretendido(aberratio delicti. 74. Ex.: O agente arremessa uma pedra com intenção clara e inequívoca de quebrar uma vidraça, porém erra e acerta o rosto de uma pessoa), todos do mesmo diploma legal.
Noutro giro, temos o erro de proibição: erro sobre a ilicitude do fato, previsto no art. 21 do CP (isenta o agente de pena ou a diminui). Subdivide-se em direto e indireto.
O erro de proibição direto está previsto no art. 21 do Código Penal e, caso seja inevitável (excludente de culpabilidade), isenta o agente de pena ou apenas a reduz de 1/6 a 1/3 se evitável.
Exemplo clássico seria de um indivíduo que ao cobrar uma dívida de R$ 50,00 a seu colega lhe é negado e tem frustrado o pagamento. Ao abrir a carteira de seu colega, depara-se com a quantia de R$ 300,00 e retira apenas o valor o qual a ele é devido. Não se tem dúvida de que o agente sabe, ou seja, tem plena consciência de que retirar dinheiro de alguém é crime, furto. Todavia, não tem a consciência da ilicitude do fato, pois crê que por causa da dívida ele pode retirar o dinheiro. Note-se: em razão disso é que se diferencia erro de proibição de desconhecimento da lei, mera atenuante genérica, prevista no art. 65, II, do CP.
Quanto ao erro de proibição indireto, temos:
- quanto às circunstâncias fáticas (as chamadas descriminantes putativas. Divergem os doutrinadores a respeito, uns afirmando ser espécie de erro de proibição, pois adotam a teoria extremada da culpabilidade; porém, a doutrina majoritária assevera ser uma espécie de erro de tipo, chamado permissivo, adotando a teoria limitada da culpabilidade);
- quanto à existência de uma causa excludente de ilicitude, que permite ao agente praticar o fato (ex.: eutanásia, a pedido da vítima);
- quanto à continuidade diante de uma excludente (ex.: o agente é agredido e, agindo em legítima defesa – subjetiva –, pratica um excesso, errando sobre a continuidade).
________________________________________________________________________________________
Bruno de Melo é Advogado criminalista e professor de Direito Penal em diversos cursinhos para concursos e graduação em faculdade.
Participe da conversa