A impossibilidade de revisão de complementação de aposentadoria já paga

STJ decide a matéria na sistemática de repetitivos

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26 de Abril de 2020

     Existem muitas entidades de previdência complementar que são patrocinadas pelo empregador. Tais entidades pagam, no caso de eventual aposentadoria, benefício complementar aos trabalhadores aposentados que também contribuíram para o benefício extra.

         Nesse contexto, forma-se uma reserva matemática que custeia a futura complementação de proventos, atendendo ao disposto no art. 202, caput, da Constituição Federal:

“Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.”

         Ocorre ser muito comum, na Justiça do Trabalho, haver ações de ex-empregados reclamando verbas remuneratórias (como horas extras, por exemplo), as quais integrariam a base de cálculo da complementação de aposentadoria. Dessa forma, depois de vencer a demanda trabalhista, esses trabalhadores, que já recebem o benefício complementar, ajuízam ação contra a entidade de previdência complementar para que haja a revisão de seu benefício.

        A competência para essa demanda, como se sabe, é da Justiça Comum. Partindo dessa premissa e considerando a grande quantidade de processos com o mesmo objeto, o Superior Tribunal de Justiça, utilizando a sistemática dos recursos repetitivos, decidiu a matéria no Tema 955.

        A Corte Superior entendeu que a formação da prévia reserva matemática é fundamental para impedir o desequilíbrio atuarial dos planos, de maneira que, se o benefício já havia sido concedido ao ex-empregado, a revisão dos cálculos não seria possível. Veja o item I da Tese firmada:

“I – A concessão do benefício de previdência complementar tem como pressuposto a prévia formação de reserva matemática, de forma a evitar o desequilíbrio atuarial dos planos. Em tais condições, quando já concedido o benefício de complementação de aposentadoria por entidade fechada de previdência privada, é inviável a inclusão dos reflexos das verbas remuneratórias (horas extras) reconhecidas pela Justiça do Trabalho nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria;”

        Essa lógica privilegia as previsões contidas no art. 18, §§ 1º a 3º, da LC 109/01:

“Art. 18. (…)
§ 1º O regime financeiro de capitalização é obrigatório para os benefícios de pagamento em prestações que sejam programadas e continuadas.
§ 2º Observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor.
§ 3º As reservas técnicas, provisões e fundos de cada plano de benefícios e os exigíveis a qualquer título deverão atender permanentemente à cobertura integral dos compromissos assumidos pelo plano de benefícios, ressalvadas excepcionalidades definidas pelo órgão regulador e fiscalizador.”

         Diante dessa premissa, surge uma questão: e como fica o prejuízo sofrido pelo trabalhador que não teve a verba devidamente paga e integrada ao cálculo do benefício antes da aposentadoria?

         O STJ deixou bastante clara a possibilidade de ação contra a empresa ex-empregadora no âmbito da Justiça do Trabalho. Veja o item II da Tese firmada:

“II – Os eventuais prejuízos causados ao participante ou ao assistido que não puderam contribuir ao fundo na época apropriada ante o ato ilícito do empregador poderão ser reparados por meio de ação judicial a ser proposta contra a empresa ex-empregadora na Justiça do Trabalho;”

        No entanto, ainda pendia um ponto de relevo. Há diversas condenações do ex-empregador, na Justiça do Trabalho e em virtude do reconhecimento de verbas remuneratórias, para que pague as contribuições respectivas diretamente à entidade de previdência complementar. Ora, se não é possível rever o benefício, o que fazer com esses valores? Poderia a entidade de previdência receber os mesmos sem qualquer contrapartida?

         A resposta é negativa. O STJ, no item IV da Tese, entende os valores devem ser repassados a participante ou assistido a título de reparação, impedindo o enriquecimento sem causa da entidade:

“IV – Nas reclamações trabalhistas em que o ex-empregador tiver sido condenado a recompor a reserva matemática, e sendo inviável a revisão da renda mensal inicial da aposentadoria complementar, os valores correspondentes a tal recomposição devem ser entregues ao participante ou assistido a título de reparação, evitando-se, igualmente, o enriquecimento sem causa do ente fechado de previdência complementar.”

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26 de Abril de 2020