A prova testemunhal revela-se extremamente comum no Processo do Trabalho, gerando uma série de debates sobre quem poderia ser efetivamente testemunha.
O art. 829 da CLT indica a impossibilidade de atuar como testemunha para algumas pessoas:
“Art. 829 – A testemunha que for parente até o terceiro grau civil, amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes, não prestará compromisso, e seu depoimento valerá como simples informação.”
Como se nota, a norma revela-se insuficiente para captar todas as hipóteses de impedimento e suspeição, razão pela qual, com base no art. 769 da CLT, a jurisprudência trabalhista utiliza o critério definido no art. 447 do CPC. Examinando o referido preceito processual civil, percebe-se que, dentre as hipóteses de suspeição, encontra-se o interesse no litígio, na forma do § 3º, II:
“Art. 447. Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas.
§ 3º São suspeitos:
II – o que tiver interesse no litígio.”
No entanto, a definição de interesse no litígio pode envolver valoração subjetiva, porquanto o conceito é amplo e deve ser avaliado pelo juiz em cada caso concreto.
Diante desse quadro, tornou-se comum verificar a alegação em contradita de testemunha no sentido de que o depoente seria suspeito pelo fato de manter ação própria em face do mesmo empregador. Assim, em que pese naquele feito em foi arrolado como testemunha não haja um interesse direto, muitos sustentam que, por estar litigando em outro processo contra o mesmo empregador, algumas vezes com os mesmos pedidos e os mesmos advogados, haveria uma suspeição.
Essa corrente não prevaleceu, visto que o simples exercício do direito de ação cuida de direito constitucionalmente assegurado, de forma que o seu exercício não poderia implicar a suspeição do depoente, de forma automática. Nesse contexto, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 357:
“TESTEMUNHA. AÇÃO CONTRA A MESMA RECLAMADA. SUSPEIÇÃO (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 Não torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador.”
Contudo, a discussão ainda não estava completamente superada. Muitas vezes, a testemunha “ciclano” de um processo em que o autor seria “fulano” indicava, em seu próprio processo contra a mesma empresa (processo em que “ciclano” é autor), o “fulano” como testemunha. Em resumo, um seria testemunha no processo do outro.
Esse panorama fez surgir a alegação de troca de favores e, em consequência, alegações de suspeição por interesse na causa.
O Tribunal Superior do Trabalho, analisando a questão, consolidou entendimento de que o simples fato objetivo de um ser testemunha do outro não configura automática suspeição, devendo a suposta troca de favores ser devidamente comprovada pelo alegante em termos de intenção maliciosa. O animus de prejudicar deve ser comprovado. Assim, os termos da Súmula 357 do TST foram aplicados também para o presente caso.
Veja esses julgados:
“(…) II – RECURSO DE REVISTA . LEI Nº 13.015/2014. CERCEAMENTO DE DEFESA. TESTEMUNHA QUE LITIGA CONTRA O EMPREGADOR. SÚMULA 357 DO TST. SUSPEIÇÃO NÃO CARACTERIZADA. ÓBICE DA SÚMULA 333/TST. Esta Corte Superior entende que a contradita de testemunha deve ser efetivamente comprovada, de maneira a evidenciar a ausência de isenção de ânimo do depoente ou de efetiva “troca de favores”. O mero fato de a reclamante e a testemunha terem ajuizados ação com identidade de pedidos em face do mesmo empregador e serem testemunhas recíprocas, por si só, não tem o condão de tornar suspeita a testemunha apresentada pela reclamante neste processo. Precedentes . Recurso de revista não conhecido. (…)” (RR-4477-34.2013.5.12.0040, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 07/02/2020).
“(…) SUSPEIÇÃO DE TESTEMUNHA. SÚMULA Nº 357 DO TST. O acórdão regional está em consonância com a Súmula nº 357 do TST, segundo a qual não torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador. Vale notar que o Tribunal Superior do Trabalho tem reiteradamente decidido pela aplicação do aludido verbete também aos casos em que a ação ajuizada pela testemunha tem objeto idêntico ao do feito em que esta presta depoimento. A Súmula em questão não faz referência à limitação de conteúdo das ações ajuizadas, de maneira que nada impede que tenham o mesmo objeto, sob pena de violação ao direito de ação, constitucionalmente assegurado no artigo 5º, XXXV, da Carta Maior, e que deve ser compreendido de forma ampla, sem interpretações limitativas, portanto. Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, motivo pelo qual o julgador deve examinar o teor do depoimento e, ao final, concluir pela sua imprestabilidade, ou não. Muitas vezes os fatos são conhecidos de poucos e somente eles podem informar em Juízo sobre os detalhes de sua ocorrência. Esclareço que para configurar a “troca de favores”, seria necessária a comprovação de que o autor também tenha sido indicado como testemunha na ação movida por sua testemunha e de que, nos depoimentos, haja a intenção em beneficiar a parte, de modo a obter o êxito de ambas, em suas respectivas ações, o que não é o caso dos autos. Logo, não se há de falar em desconsideração do depoimento colhido nos autos. Agravo conhecido e não provido. (…)” (Ag-ARR-1131-71.2014.5.03.0014, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 13/12/2019).
Perfeito…