Afinal, o ato infracional serve ou não para afastar a causa de diminuição do art. 33, parágrafo 4º da Lei de Drogas?

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04 de junho3 min. de leitura

Olá pessoal, tudo certo?

A maior parte dos compêndios de jurisprudência e manuais voltados para concurso público apontam, de forma indiscriminada, que os atos infracionais, apesar de não poderem servir de parâmetro para a reincidência (STJ, AgRg no AREsp 1665758/RO) e tampouco para maus antecedentes (STJ, HC 499.987/SP), servem como óbice à incidência da causa de diminuição de pena delineada no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. Vejamos:

(…) 2. Concluído pelas instâncias antecedentes, com fulcro nos elementos constantes dos autos e no fato de registrar atos infracionais análogos ao tráfico de entorpecentes, que o agravante se dedica ao tráfico de drogas, a alteração desse entendimento – para fazer incidir a minorante da Lei de Drogas – enseja o reexame do conteúdo probatório dos autos, o que é inadmissível em sede de habeas corpus. Precedentes. 3. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o registro de atos infracionais é elemento idôneo para afastar a figura do tráfico privilegiado, quando evidenciar a propensão do agente a práticas criminosas. Precedentes. (…) (AgRg no HC 573.149/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 02/06/2020).

Entretanto, como restou bem delineado na decisão do Ministro Joel Ilan Paciornik, relator do Habeas Corpus 662.834, a possibilidade de utilização de atos infracionais pretéritos para afastar a referida minorante se dá quando eles forem análogos ao tráfico, a fim de caracterizar a dedicação a atividades criminosas.

No caso analisado a situação era diversa. O ato infracional praticado pelo paciente envolvia a divulgação em redes sociais de vídeos íntimos com menor com que manteve relações íntimas, vinculando-se ao art. 217-A do Código Penal e art. 241-B, ECA, não podendo por si apontar dedicação à atividade criminosa do tráfico. Assim, sendo o paciente primário, sem antecedentes e a quantidade de droga apreendida não sendo de elevada monta, possível o reconhecimento da aplicação do redutor previsto no § 4º, do art. 33, da Lei nº 11.343/2006[1].

Em conclusão, de acordo com o Ministro Relator, não se deve considerar em todos os casos os atos infracionais como sendo crimes, para o afastamento da redutora prevista em lei. A jurisprudência do STJ admite o uso de ato infracional para demonstrar habitualidade delitiva, desde que o crime praticado é o mesmo. No caso em tela, porém, os atos infracionais praticados pelo réu enquanto menor de idade e que levaram à condenação não servem para, por si só, apontar dedicação à atividade criminosa do tráfico.

O assunto, sem dúvidas, ainda está longe de restar pacificado, sendo uma ótima questão para uma prova discursiva, dissertativa ou oral.

 

Espero que tenham entendido e gostado!

 

Vamos em frente!

 

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

 

 

 

[1] 1. Consoante o § 4.º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, os condenados pelo crime de tráfico de drogas terão a pena diminuída, de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), quando forem reconhecidamente primários, possuírem bons antecedentes e não se dedicarem a atividades criminosas ou integrarem organização criminosa. Para que o agente possa ser beneficiado, é preciso preencher cumulativamente os requisitos. 2. Na esfera da Lei n. 8.069/1990, as medidas socioeducativas aplicadas em resposta a ato infracional cometido por adolescente possuem o objetivo de responsabilização quanto às consequências lesivas do ato, a integração social e garantia de seus direitos individuais e sociais, bem como a desaprovação da conduta infracional (art. 1.º, § 2.º, incisos I, II e III, da Lei n. 12.594/2012 – SINASE). 3. No entanto, apesar de a medida socioeducativa, impositiva e preponderantemente pedagógica, possuir certa carga punitiva, certo é que não configura pena e, portanto, não induz reincidência nem maus antecedentes. Nessa medida, é incompatível considerar o registro de anterior ato infracional, na terceira fase da dosimetria da pena do crime de tráfico de drogas, como elemento caracterizador da dedicação do agente a atividades delituosas, obstando a minorante, equiparando a conduta a crime hediondo e recrudescendo a execução penal. 4. Vale dizer, o registro da prática de fato típico e antijurídico por adolescente (inimputável), que não comete crime nem recebe pena, atingida a maioridade penal, não pode ser utilizado como fundamento para se deduzir a dedicação a atividades criminosas, e produzir amplos efeitos desfavoráveis na dosimetria e execução da pena. 5. A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, em recentes julgados, tem reafirmado que “[a] prática de atos infracionais não é suficiente para afastar a minorante do tráfico privilegiado, pois adolescente não comete crime nem recebe pena. Como disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/1990), as medidas aplicadas são socioeducativas, (arts. 1º e 112) e visam à proteção integral do adolescente infrator” (HC 184.979-AgR/SP, Rel. Ministra CÁRMEN LÚCIA, SEGUNDA TURMA, DJe 07/08/2020). (REsp 1916596/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 27/04/2021, DJe 04/05/2021).

 

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