Artigo feito em coautoria com o professor Luciano Dutra
Nesta quarta vi, no Instagram do meu amigo Luciano Dutra – Advogado da União e Professor de Direito Constitucional –, uma explicação acerca da atual reforma política, amplamente discutida ao longo das últimas semanas. Ao longo da explanação, ele afirma que essa medida será implementada por meio de uma emenda à Constituição. Mas o correto não seria emenda constitucional? Ou tanto faz?
Primeiramente, o Luciano vai nos colocar a par do que está acontecendo no contexto jurídico:
Em linhas gerais, de forma direta e objetiva, a novel Emenda Constitucional nº 97, de 4 de outubro de 2017, altera a Constituição Federal para vedar as coligações partidárias nas eleições proporcionais e estabelecer normas sobre acesso dos partidos políticos aos recursos do fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuito no rádio e na televisão, chamado de cláusula de barreira ou cláusula de desempenho.
A vedação à celebração de coligações nas eleições proporcionais aplicar-se-á a partir das eleições de 2020.
No que toca ao acesso dos partidos políticos aos recursos do fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão, os requisitos da cláusula de barreira valerão para as eleições de 2030. No entanto, haverá um escalonamento dos critérios de desempenho já a partir de 2018. Em 2030, somente terão direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que alternativamente: I – obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas; ou II – tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação.
Com base nas explicações do Luciano, podemos afirmar que a Constituição, por meio da proposta de reforma política, foi alterada. Para que entender quais são as consequências disso para a língua, preciso detalhar o que é um complemento nominal.
O complemento nominal (CN) é um termo necessariamente preposicionado que se liga a substantivos abstratos, adjetivos ou advérbios. A semântica de um CN é sempre paciente em relação ao substantivo a que se refere. Vejamos um exemplo:
- O consumo de medicamentos.
Olhe para a expressão sublinhada. Ela, além de estar preposicionada, se liga a um substantivo abstrato (“consumo”). Note o principal: os medicamentos são consumidos, ou seja, são pacientes em relação ao consumo (você há de concordar comigo que medicamentos são incapazes de praticar o ato de consumir, certo?).
Situação semelhante ocorre com emenda à Constituição. Quando esse dispositivo é acionado, o que se faz é emendar a Constituição. Em outras palavras, a Constituição é emendada; logo, ela é paciente em relação à emenda. Sintaticamente, a expressão “à Constituição” é classificada como complemento nominal. Como essa função sintática deve ser sempre preposicionada, é agramatical usar “emenda constitucional”. Cabe ressaltar, todavia, que muitos juristas preferem usar a forma gramaticalmente não recomendada, apoiados no argumento de que essa expressão já foi consagrada pelo uso. O próprio Luciano destaca que, na prática jurídica, é raro alguém empregar “emenda à Constituição”. O site do Planalto usa “emenda constitucional” 1.224 vezes ao longo da versão virtual da Constituição Federal de 1988! Curioso é notar, todavia, que o artigo 59 da CF/88 afirma que “o processo legislativo compreende a elaboração de emendas à Constituição”. Aliás, o texto original faz uso apenas da variante gramaticalmente correta.
Poucas bancas, como a FGV, cobram a identificação de complementos nominais, no entanto é um conhecimento necessário para entender outros assuntos, como pontuação e período composto. Portanto, estude-o! Outro conselho: se, em uma prova de Direito Constitucional, o examinador usar “emenda constitucional”, não invalide o item devido ao uso de uma expressão gramaticalmente rejeitada! Tenha bom senso!
Elias Santana
Licenciado em Letras – Língua Portuguesa e Respectiva Literatura – pela Universidade de Brasília. Possui mestrado pela mesma instituição, na área de concentração “Gramática – Teoria e Análise”, com enfoque em ensino de gramática. Foi servidor da Secretaria de Educação do DF, além de professor em vários colégios e cursos preparatórios. Ministra aulas de gramática, redação discursiva e interpretação de textos. Ademais, é escritor, com uma obra literária já publicada. Por essa razão, recebeu Moção de Louvor da Câmara Legislativa do Distrito Federal.
Você encontra essa coluna também no jornal Brasília Capital deste sábado, 07 de setembro.
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Excelente análise e dicas, professor! Estarei atenta, rsrs!
Obrigada!
Ione
A fim de ”acalourar” o debate, gostaria de compartilhar um ponto com viés jurídico sobre o tema. O uso de ”Emenda Constitucional” como Adjunto Adnominal não poderia ser configurado uma exceção a essa regra ? Já que a Constituição também é um agente durante esse processo, devido ela estabelecer limites, as formalidades para a realização da emenda (vide artigo 60 da CF/88), como também oferece meios de anular emendas que possuam algum vício/irregularidade.
Desde já, um ótimo e interessante artigo, muito obrigado.
Diferença entre adjunto adnominal e complemento nominal:
Substantivo concreto – sempre AA
Adjetivo ou advérbio – sempre CN
Substantivo abstrato com qualquer preposição (exceto DE) – sempre CN
Subst. abstrato + preposição DE + substantivo – executor da ação – sentido ativo: AA / alvo da ação – sentido passivo: CN