Olá amigos do Gran!
Hoje quero abordar com vocês um tema espinhoso no Dir. Previdenciário, que é o recolhimento em atraso. Trata-se de uma questão com muitas nuances e peculiaridades conforme o tipo de segurado do RGPS e se trata de uma pedra fundamental para a concretização do direito ao melhor benefício ao trabalhador.
Antes de entender o que é recolhimento em atraso, necessário, por óbvio, entender o que é atraso no âmbito do custeio da previdência. Bom, como sabemos, o vértice da previdência é o seu caráter contributivo, de modo que aqueles que exercem atividade remunerada são obrigatoriamente filiados ao sistema público de previdência no Brasil, salvo aqueles que possuem vínculos com o serviço público na hipótese do respectivo ente federativo ter constituído regime próprio de previdência.
Os militares, também, possuem seu próprio sistema de seguridade social. Mas, no âmbito do regime geral de previdência social, o fato de ter uma atividade remunerada já é suficiente para se ter uma filiação ao sistema. Essa filiação, entretanto, não se encerra unicamente pela existência da atividade em si, necessitando ser completada pela contribuição previdenciária. O sistema é contributivo e, por isso, a mera atividade sem a correspondente fonte de custeio não satisfaz a relação jurídico-previdenciária entre o trabalhador e o INSS. Tanto é assim, aliás, que a própria Constituição Federal de 1988 assinala sem deixar dúvidas de que não haverá concessão, majoração ou extensão de benefícios da seguridade social sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, §5º, da CF).
Tomando por base essa premissa, ou seja, tomando como referência inicial que o pagamento da contribuição é medida que se impõe para ambas as relações jurídicas formadas entre trabalhador e previdência sejam formadas (relação jurídica de custeio e relação jurídica de proteção), é de todo óbvio que aquele pagamento deve ser feito em dia. Como qualquer obrigação de pagar, espera-se que o recolhimento previdenciário também respeite datas finais de vencimento. E é nesse ponto que começamos a entender que o pagamento em atraso acaba frustrando, de certo modo, as “expectativas” do sistema atuarial e financeiro do RGPS. Logo, sua ocorrência deveria ter os mesmos efeitos do que o não pagamento da contribuição.
Mas, como no Dir. Previdenciário aquelas duas relações jurídicas (de custeio e de proteção) revelam sempre dois lados da moeda – lados esses que decorrem, em verdade, das bases principiológicas de um sistema de repartição de previdência (o que é o caso) – existe certo abrandamento para o fato jurídico “recolhimento em atraso” no âmbito do RGPS. E esse abrandamento nasce do pilar protetivo da previdência, calcado no princípio da solidariedade, que anda ali, lado a lado, com o princípio da contributividade. As normas previdenciárias ora se esgarçam para o lado da contributividade, ora se esticam para a face da solidariedade.
E, visto isso, talvez agora você já saiba me dizer: quais são os efeitos do recolhimento em atraso da contribuição previdenciária no âmbito do RGPS?
A resposta vai variar de acordo com o tipo de segurado. Para os segurados empregado, empregado doméstico (esse especialmente a partir da Lei Complementar 150/15), trabalhador avulso e, por fim, contribuinte individual prestador de serviços a uma ou mais empresas (esse desde a competência 04/2003, nos termos da Lei 10.666/03), o recolhimento em atraso não significa absolutamente nada. Exatamente! Nada. Porque a obrigação de recolher não desses segurados. Eles pagam a cota deles da previdência, claro! Mas que recolhe são os empregadores e tomadores do serviço deles. Logo, se houver atraso, a culpa não é deles e, com isso, não ocorrerá nada de ruim, digamos, ao patrimônio previdenciário desses trabalhadores se houver recolhimento em atraso. Obviamente, por vezes será necessário, a depender do tamanho da omissão do empregador/tomador de serviço, comprovar a própria atividade, caso os respectivos registros não tenham sido informados nas obrigações tributárias acessórias que cabem àqueles entes. De todo modo, qualquer omissão nesse contexto não pode ser imputada aos segurados e, por isso, o recolhimento em atraso não os afeta.
Já os contribuintes individuais autônomos (profissionais liberais, por exemplo) e o segurados facultativos sofrem efeitos negativos com o recolhimento em atraso. Isso porque são eles os responsáveis pelo recolhimento de suas próprias contribuições previdenciárias. Se não houver pagamento até a data de vencimento, estará caracterizado o recolhimento a destempo.
Para o segurado facultativo, o impacto dessa mora é maior. A norma é clara no sentido de que sua proteção previdenciária somente ocorre com sua inscrição (ato voluntário) somada ao pagamento da primeira contribuição em dia, sem atraso. Mesmo que ele pague, se o pagamento for feito após a data de vencimento (no caso, o vencimento é, regra geral, feito até o dia 15 do mês subsequente ao da competência), tal pagamento terá sido em vão, pois não terá nascido ainda a relação jurídica de proteção. Já para os contribuintes individuais, há muita discussão sobre a exigência, também, da primeira contribuição em dia para o nascedouro de sua qualidade de segurado. Quanto ao início do cômputo da carência, não há duvidas de que ele somente se inicia quando, aí sim, houver o pagamento sem atraso da primeira contribuição. Mas, é fato que não há na norma previdenciária dispositivo semelhante àquele dirigido ao segurado facultativo no que toca ao nascimento da qualidade de segurado. O art. 185, caput, da Instrução Normativa INSS 128/22, aliás, assinala os recolhimentos em atraso do contribuinte individual, inclusive MEI, não obstam a qualidade de segurado, desde que esse pagamento em atraso não seja feito após o fato gerador do benefício pleiteado. Aliás, o pagamento da contribuição em atraso pode ser feito até mesmo após o dia exato do fato gerador, desde a competência respectiva desse fato gerador seja paga até sua data de vencimento. Exemplo: se a data de início da incapacidade for estipulada em 22/08/2022, a competência 08/22 pode ser paga até 15/09. Se for paga até essa data, mesmo após aquela DII, haverá qualidade de segurado. Note que o pagamento foi após o fato gerador, mas o art. 185, §7º, da IN 128/22, deixa muito claro que deve “ser considerada, para efeito de manutenção da qualidade de segurado, o recolhimento referente à competência do fato gerador, desde que efetuado dentro do seu vencimento”.
Em suma, tem-se que o atraso do recolhimento para o segurado facultativo é fatal, pois a norma deixa manifesto isso: somente após a primeira contribuição em dia é que se completa sua filiação e inscrição no RGPS. Já o contribuinte individual precisa, obviamente, pagar a contribuição para ter a sua qualidade de segurado, mas ela pode ser paga em atraso e isso não afetará sua qualidade de segurado. Nesse sentido, o art. 185, caput, da IN 128/22, afirma que para esse segurado, inclusive o MEI, “as contribuições efetuadas em atraso poderão ser computadas para efeito de manutenção de qualidade de segurado, desde que o seu recolhimento seja anterior à data do fato gerador do benefício pleiteado”. E o §2º, do art. 185, vai mais além, assinalando que isso se aplica mesmo que o pagamento em atraso tenha sido feito após o período de graça.
Quanto à carência, não há distinções entre segurado facultativo e contribuinte individual, sendo necessário para ambos que exista o primeiro recolhimento em dia para o inicio do computo da carência. Se nas seguintes houver atraso, não haverá efeito negativo à continuidade do computo da carência, desde que não haja interrupções ao ponto de se perder a qualidade de segurado, conforme o art. 27, II, da Lei 8.213/91.
Por fim, o tempo de contribuição sempre será computado, mesmo que eventualmente já se tenha escoado o período de graça do segurado. Por vezes, portanto, não será possível recolher em atraso e obter qualidade de segurado e carência, mas o tempo de contribuição será sempre possível. O INSS, contudo, tem entendido que não haverá qualquer efeito mesmo para o tempo de contribuição nos casos em que o recolhimento foi feito após o fato gerador, especialmente nas hipóteses de busca de aposentadorias anteriores a EC 103 ou previstas em regras de transição da reforma de 2019. Nesse sentido, vale conferir o art. 208, da Instrução Normativa 128/22, quando diz que a “contribuição recolhida em atraso poderá ser computada para tempo de contribuição, desde que o recolhimento seja anterior à data do fato gerador do benefício pleiteado”.
Muito bem, meus queridos! Espero ter ajudado um pouco mais no entendimento dessas complexas questões do Dir. Previdenciário.
Um grande abraço,
Prof. Frederico Martins
@prof.fredericomartins
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