Sexta Turma do STJ afasta a hediondez do crime de porte de arma de uso permitido com numeração raspada

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25 de fevereiro4 min. de leitura

Em 2021, recente decisão da 6ª Turma do STJ entendeu que o crime de posse ou  porte de arma de fogo de uso permitido com numeração raspada não é crime hediondo.

A decisão superou o entendimento que prevalecia na Corte, e os Ministros concederam dois “habeas corpus” em favor de réus condenados por porte ou posse de arma de uso permitido com numeração suprimida, para afastar a hediondez do delito em comento. Em um dos casos, o Juiz da Vara de Execução Penal negou o pedido de exclusão da hediondez, entendendo que a Lei 13.497/2017, ao considerar hediondo o crime de posse ou porte de arma de uso restrito (artigo 16 da Lei 10.826/2003), teria incluído na mesma categoria a posse ou o porte de arma de fogo com identificação adulterada ou suprimida (antigo parágrafo único do mesmo dispositivo). O TJRS também entendeu que a inclusão do artigo 16 “caput” no rol dos crimes hediondos implicava a inclusão da conduta prevista no parágrafo.

Vale explicar para o candidato é que para fins didáticos eu chamo nas nossas aulas vídeo aulas do Gran Cursos Online que os crimes previstos nos incisos do parágrafo único do art. 16 da Lei 10.826/03 de condutas equiparadas ao crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito.

Como todos sabem, obedecendo ao comando do inciso XLIII do art. 5o da  Constituição Federal, os crimes hediondos são  aqueles que estão no rol taxativo do art. 1º  da Lei 8072 e 90, uma vez que o critério adotado no Brasil para se definir um crime hediondo é o legal, ou seja, quem define é o legislador.

Mesmo que o Juiz, o Membro do Ministério Público ou o Delegado entendam que o crime é repugnante, se o delito não estiver no rol taxativo do art. 1º da Lei 8072/90, ele não será considerado hediondo.

Consideram-se hediondos os crimes previstos no dispositivo supra, tanto na forma tentada quanto na forma consumada.

Em dezembro de 2017 o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito ou proibido foi inserido no rol taxativo do art. 1º da Lei 8072/90. Ainda não havia ocorrido a cisão dos tipos penais, que separou os objetos materiais em dispositivos diferentes. Ocorre que com o advento do pacote Anticrime uma houve uma mudança no Estatuto do Desarmamento.

Antigamente o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito estava no mesmo dispositivo do crime de posse ou porte legal de arma de fogo de uso proibido. Atualmente, os dois delitos estão em dispositivos diferentes.

No “caput” do art. 16 do Estatuto do Desarmamento está o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, sendo que nos incisos do parágrafo único do mesmo dispositivo estão as condutas equiparadas, o que inclui o delito de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso permitido com numeração raspada. Já o §2º do art. 16 traz como objeto material a arma de fogo de uso proibido.

O interessante é que ainda com o surgimento do pacote Anticrime no rol taxativo de crimes hediondos foi suprimido o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, sendo feita menção ao delito de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido ( o que abarca, na minha humilde concepção, a posse ou porte ilegal de acessório ou munição de uso proibido ).

Podemos concluir que não é mais hediondo o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, bem como os crimes previstos nos incisos do parágrafo único do art. 16 do Estatuto do Desarmamento.

A questão do afastamento da hediondez do art. 16 caput e incisos do p. único do Estatuto do Desarmamento pode ter se resolvido no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, mas não espancou de vez a questão da inafiançabilidade e impossibilidade de concessão de liberdade provisória sem fiança para os mesmos dispositivos.

O CPP, alterado pelo Pacote Anticrime, diz que na audiência de custódia, não há possibilidade de concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança àqueles que foram flagrados portando arma de fogo de uso restrito. Repito, uso restrito. O candidato deve ficar atento uma vez que o art. 310 do Código de Processo Penal fala em impossibilidade de concessão de liberdade provisória para aqueles que foram flagrados portando arma de fogo de uso restrito, quando na verdade deveria estar escrito no dispositivo “arma de fogo de uso proibido”.

Ao estabelecer uma inafiançabilidade e vedar a concessão de liberdade provisória ao crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, na audiência de custódia, o legislador manteve para tal delito um dos efeitos da hediondez do crime e ainda reestabeleceu cláusulas que tinham sido declaradas inconstitucionais pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 2007, quando o Guardião da Constituição foi chamado para analisar o a constitucionalidade do p. único do art. 14, o p. único do art 15 e o art. 21, todos do Estatuto do Desarmamento, diante do Princípio Constitucional da Proporcionalidade.

 

Questão comentada

(2018/CESPE/PC-MA/DELEGADO DE POLÍCIA) De acordo com o entendimento da doutrina e dos tribunais superiores sobre o Estatuto do Desarmamento, especialmente quanto às armas de fogo,

a) o crime de tráfico internacional de arma de fogo é insuscetível de liberdade provisória.

b) majora-se a pena em caso de crime de comércio ilegal de arma de fogo mesmo que se trate de armamento de uso permitido.

c) a arma de fogo desmuniciada afasta as figuras criminosas da posse ou do porte ilegal, considerando-se que o objeto jurídico tutelado é a incolumidade física.

d) o porte de arma de fogo de uso permitido com a numeração raspada equivale penalmente ao porte de arma de fogo de uso restrito.

e) o disparo de arma de fogo em via pública e o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido configuram situações de inafiançabilidade.

 

Gabarito: Letra d.

O § 1o traz as hipóteses de condutas equiparadas ao caput do art. 16 e que incorrerão nas mesmas penas. São condutas que se referem tanto a armas, munições ou acessórios de uso permitido quanto de uso restrito ou proibido. Assim, equipara-se a posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito a conduta de portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado (inciso IV do § 1o do art. 16 do Estatuto).

 

a) Errado. O STF já declarou inconstitucionais os dispositivos do Estatuto do Desarmamento que vedavam a fiança e a liberdade provisória.

b) Errado. O comércio ilegal de arma de fogo, tanto de uso permitido quanto restrito ou proibido, não é caso de majoração de pena, e sim de crime autônomo, nos termos do art. 17.

c) Errado. Os crimes do Estatuto do Desarmamento são de perigo abstrato, razão por que o fato de a arma apreendida em poder do agente estar desmuniciada é irrelevante, bastando que a posse seja irregular ou o porte ilegal.

e) Errado. O STF já declarou inconstitucionais os dispositivos do Estatuto do Desarmamento que vedavam a fiança e a liberdade provisória

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