“As pessoas que resolviam as coisas em geral tinham muita persistência e um pouco de sorte. Se a gente persistisse o bastante, a sorte em geral chegava. Mas a maioria das pessoas não podia esperar a sorte, por isso desistia.” – Charles Bukowski (1920-1994), poeta e escritor alemão
Falamos muito, aqui, sobre seguir em frente, sobre não desistir em hipótese alguma. Mas e quando o que deveria ser persistência é, na verdade, apenas teimosia? Qual é a diferença entre uma e outra? A linha que as separa é tênue; como saber, então, se não a ultrapassamos?
Persistência é a virtude dos campeões, predicado daqueles que não desistem enquanto não tiverem alcançado o que querem. Você sabe que está sendo persistente quando segue o coração, movido por um desejo de mudança, por uma inquietude na alma, por um propósito que fará bem para outras pessoas além de você mesmo. A teimosia, por sua vez, é um defeito. Sabe quando insistimos, insistimos, insistimos mais um pouco em algo, possivelmente até com boas intenções, porém fazendo isso de maneira errada e sem planejamento?
“Você sabe que está sendo persistente quando segue o coração, movido por um desejo de mudança, por uma inquietude na alma, por um propósito que fará bem para outras pessoas além de você mesmo”.
Quando agimos com persistência, os resultados vão aparecendo, ainda que lentamente. Às vezes, são mesmo imperceptíveis, mas, ao olharmos o todo, vemos que estão lá. Dá pra notar que o sucesso final é uma questão de tempo. Já quando estamos sendo apenas teimosos, não vemos resultado algum. Ficamos anos no mesmo ponto da trajetória, em loop, andando em círculos, enxugando gelo, e nada acontece. Nadinha. Não avançamos nem um por cento. Empreendemos muito esforço, fazemos inúmeros sacrifícios, choramos rios de lágrimas, enfrentamos incontáveis noites insones, empregamos energia a valer, mas nada se altera. Significa que temos cometido os mesmos erros, dado murro em ponta de faca, esperando resultados diferentes sem, de fato, termos contribuído para eles.
O persistente é constante, firme, porém não irredutível. É um sobrevivente que segue sempre adiante, usando o cérebro e a experiência para tirar do caminho os entraves. Alguém que não desiste enquanto não superar o que quer que o aflija, mas agindo proativamente. No outro lado da linha, vemos o teimoso. Ele não aceita conselhos. É obcecado. Tem opiniões imutáveis e dificuldade para sequer respeitar quem pensa diferente. Insiste em teorias, atitudes, ações, práticas, hábitos que já se mostraram infrutíferos. Não inova, não se transforma, não evolui. Usa métodos que já falharam várias vezes e perde facilmente a paciência quando se vê contrariado. Não aceita corrigir a rota para chegar ao destino e quer, a todo custo, chegar lá do seu jeito, por menos promissor que seja.
Milton Senna costumava dizer que o filho, o piloto Ayrton Senna, era tão teimoso quanto ele e a mãe. O piloto se defendia: “Ninguém mandou me colocar sentado num Kart quando eu era pequeno. Experimentei, gostei e agora não peçam jamais para eu desistir. É minha vida!”. Diferentemente do que pensava o pai, Senna não era teimoso; estava mais para persistente. Era um convicto, o que, para alguns – até mesmo para o homem que o criou –, soava como teimosia. A diferença é que se mantinha firme em seus objetivos porque estava seguro de si e de sua técnica, que conhecia tão bem.
“O persistente é constante, firme, porém não irredutível. É um sobrevivente que segue sempre adiante, usando o cérebro e a experiência para tirar do caminho os entraves”.
Se você não sabe, Senna entrou para a história do automobilismo como um especialista em pistas molhadas. Quando chovia, não tinha pra ninguém: ele dava um baile nos competidores. Muitos ao redor temiam por ele e viam como teimosia a ousadia em acelerar na pista encharcada. Mas não se tratava de mera insistência: Senna treinou muito para ser o melhor em condições climáticas adversas. Eram os fatores experiência e técnica que o separavam da teimosia e o aproximavam da persistência. Ele não tinha por que temer. Sabia o que estava fazendo. E estava preparado para fazê-lo. Lembre-se: a linha é tênue, mas está lá.
Há muitos episódios envolvendo Ayrton que ilustram sua persistência na busca por resultados diferenciados. Seu Milton conta, por exemplo, que jamais esqueceu a tarde em que levou o filho ao kartódromo de Interlagos: “Chovia quando chegamos lá, e resolvi que não dava para o moleque ‘brincar’ naquela pista encharcada. Ele insistiu tanto, quis chorar; então, deixei ele dar algumas voltas. O Ayrton, como todos os meus filhos, era muito teimoso. Eles herdaram isso de nós, os pais. Uma das suas teimosias era pilotar no molhado. Divertia-se em atravessar o kart sobre os lençóis de água. Para convencê-lo a sair da chuva, usei a minha autoridade de pai para evitar que ele se machucasse. Mas, quanto mais eu temia, melhor ele pilotava. O Beco [apelido do Ayrton à época] gostava de se testar, e acho que via na pista molhada um desafio novo e comprazia-se com aquela situação. Pelo menos aos meus olhos de pai, estava nascendo um especialista na pilotagem da chuva.”
A performance na Pista de Estoril (primeira vitória de Senna, em 1985), em Portugal, foi tão incrível que mereceu o seguinte comentário do comedido semanário inglês Motoring News: “Ayrton deslizava, navegando seguro como um experiente timoneiro numa pista cheia de armadilhas, enquanto outros pilotos veteranos naufragaram no acquaplaning (aquaplanagem)”.
A determinação do piloto nos treinos e a convicção de que correr e vencer era a sua missão o colocavam bem em cima da tal linha que separa teimosia e persistência. A movê-lo mais para o lado desta, estava a humildade, que lhe era tão característica. Senna era um homem que escutava os técnicos e se ajustava quando necessário, sem insistir em algo que não dera certo antes.
Eis o segredo. Uma pessoa persistente é também resiliente: ninguém consegue seguir adiante sem suportar bem as porradas da vida. Pode-se ir além, na tentativa de se tornar antifrágil, alguém apto a suportar forte pressão e rapidamente retornar ao estado normal, sem perder a força e a capacidade. Mais que isso: alguém que volta – depois de sucessivas ameaças, chantagens, injustiças – até mais forte e determinado, com sangue nos olhos para perseguir seus objetivos. Particularmente, acredito que sou assim, pois costumo me desenvolver em situações adversas. Funciono ainda melhor sob pressão.
“Uma pessoa persistente é também resiliente: ninguém consegue seguir adiante sem suportar bem as porradas da vida”.
Vou ilustrar a ideia de resiliência com o processo de forja de uma boa espada. O ferro é aquecido até ganhar um forte tom de vermelho. Então o ferreiro bate muitas vezes nele com uma marreta, para depois mergulhá-lo num líquido e resfriá-lo. O processo é repetido sucessivas vezes, até que o metal se torne resistente, convertendo-se em uma arma de aço poderosa. O interessante é que, nesse processo, algumas espadas não resistem: trincam e quebram, sendo descartadas.
É o que a vida faz conosco, amigo leitor: nos põe à prova o tempo todo para ver se nos tornamos aço – antifrágeis – ou se “trincamos”. Os persistentes vão em frente, sem desistir, mas são humildes o bastante para escutar outras pessoas, filtrando, é claro, quem não merece ser ouvido. Ajustam o percurso, trocam ferramentas, mudam técnicas, alteram o projeto. Já os teimosos ignoram qualquer conselho e insistem no erro. Repetem o que não deu certo sem fazer nenhuma correção. É loucura! O resultado – inevitável – é a frustração e, pra piorar, mais uma “boa” desculpa para reiniciar todo o ciclo.
Entendeu a diferença? Decidiu em qual lado da linha quer estar? Fez a escolha certa? Então registre nos comentários: “Eu sou persistente!” e siga em frente conosco.
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Gabriel Granjeiro – Diretor-Presidente e Fundador do Gran Cursos Online. Vive e respira concursos há mais de 10 anos. Formado em Administração e Marketing pela New York University, Leonardo N. Stern School of Business. Fascinado pelo empreendedorismo e pelo ensino a distância