Extorsão qualificada e extorsão mediante sequestro. Você sabe realmente a diferença?

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11 de Janeiro de 2019

Em razão das semelhanças entre os dois crimes, não raro temos uma confusão. Ao final do texto, tenho por certo que saberás, em definitivo, a diferença entre extorsão qualificada e extorsão mediante sequestro. Vamos aprender?
A Lei 11.923/2009 incluiu o 3º no art. 158 do Código Penal, para tipificar o chamado “sequestro relâmpago” como extorsão qualificada nos seguintes termos:
Art. 158 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa:
Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
(…)
3º Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente (grifos nossos).
Ocorre que o Código Penal já tinha a previsão do crime de extorsão mediante sequestro no art. 159[1]:
Art. 159 – Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate.
Pena –  reclusão, de oito a quinze anos.
Tanto o art. 158, em seu parágrafo 3º, como o art. 159 são crimes formais com dolo de ofensa a patrimônio alheio, valendo-se da restrição da liberdade da vítima, com vistas a obter uma indevida vantagem econômica de natureza patrimonial[2]. Sendo assim, como diferenciar esses dois tipos penais?
Simples. Caso o autor do fato tenha o dolo de exigir da própria vítima a vantagem indevida, a ser obtida por meio de senha bancária ou alguma leitura biométrica, temos a extorsão qualificada.
Por outro lado, caso o autor do fato tenha o dolo de restringir a liberdade da vítima, para então exigir de terceiros a vantagem indevida como condição de resgate, temos a extorsão mediante sequestro.
O critério temporal pode ser ainda decisivo para diferenciar os tipos penais, uma vez que a privação de liberdade da vítima por tempo juridicamente relevante (horas), quando ausente a conduta prolongada de realização ou tentativa de saques nesse interstício, acaba por revelar a finalidade de obter resgate, configurando-se a extorsão mediante sequestro. Nesse sentido:
TJ-ES – Apelação Criminal ACR 1100018744 ES 1100018744 (TJ-ES)
Data de publicação: 01/03/2012. Ementa: EMENTA: APELAÇAO CRIMINAL – EXTORSAO MEDIANTE SEQÜESTRO QUALIFICADA(ART. 159, 1º, DO CP) – AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS – PARTICIPAÇAO DO APELANTE RILDO DEMONSTRADA – INDUZIMENTO, PREPARAÇAO E AUXÍLIO MATERIAL NA CONDUTA – INTELIGÊNCIA DO ART. 29 , DO CP – PRETENDIDA DESCLASSIFICAÇAO PARA O DELITO DE SEQUESTRO-RELÂMPAGO (ART. 158 , 3º , DO CP )- IMPOSSIBILIDADE – PRIVAÇAO DA LIBERDADE E INTENÇAO DE OBTENÇAO DE RESGATE – CRIME FORMAL – PRIVAÇAO DA LIBERDADE – CONSUMAÇAO – OBTENÇAO DA VANTAGEM ECONÔMICA – MERO EXAURIMENTO – DOSIMETRIA DA PENA CORRETA – RECURSOS DESPROVIDOS.1. Não há que se falar em absolvição ou em desistência voluntária, se o conjunto probatório é claro em demonstrar a efetiva participação do apelante Rildo Lopes na empreitada criminosa noticiada, não apenas por ter sido o seu idealizador e ter coordenado toda a sua execução, mas, também, por ter prestado auxílio material, por meio da cessão do seu aparelho celular, por buscar o co-réu Sidnei no cativeiro, com sua motocicleta, e por ter permanecido na espreita dos Bancos mais importantes da cidade, a fim de visualizar se o filho da vítima estava cooperando. 2. Resta impossível acolher o pleito desclassificatório da extorsão mediante sequestro para a figura do sequestro-relâmpago (art. 158, 3º, do CP), quando fica demonstrado que os agentes privaram a liberdade da vítima por tempo juridicamente relevante (07 horas), com a finalidade indiscutível de obter resgate.3. A extorsão mediante sequestro, por interpretação extensiva da Súmula nº 96 , editada pelo Superior Tribunal de Justiça, trata-se de um crime formal, o qual não exige para a sua consumação a ocorrência do alcance da almejada vantagem econômica, bastando para tanto a mera atividade de sequestrar pessoa com a finalidade de obter o resgate. 4. Recursos desprovidos. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL 01/03/2012 – 1/3/2012 Apelação Criminal ACR 1100018744 ES 1100018744 (TJ-ES) SÉRGIO BIZZOTTO PESSOA DE MENDONÇA
Imaginemos uma situação inusitada: após se exigir o resgate a terceiros, a própria vítima revela ter condições de pagar diretamente os valores. Qual seria o crime? Considerando ser de natureza formal, a consumação da extorsão mediante sequestro já ocorreu com a exigência do resgate, pelo que a revelação futura, combinada ou não com o pagamento (exaurimento), não altera o tipo penal.
Por fim, importante destacar ainda que o crime de extorsão qualificada (art. 158, 3º, do CPB), por claro equívoco do legislador, não está contemplado no rol dos crimes hediondos (Lei n. 8.072/1990)[3], diferentemente do crime de extorsão mediante sequestro (art. 159 do CPB):
Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, consumados ou tentados:
(…)
III – extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o);
IV – extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lo, 2o e 3o);
(…)
NUCEPE – 2014 – PC-PI – Delegado de Polícia
Sobre os crimes contra o patrimônio, assinale a alternativa CORRETA.

  1. Os crimes de latrocínio, extorsão, roubo qualificado e extorsão mediante sequestro são classificados como hediondos.
  2. O crime de extorsão mediante sequestro classifica-se como crime material que se consuma quando o agente obtém a vantagem econômica exigida.
  3. No roubo o bem é retirado da vítima, enquanto que na extorsão ela própria é quem o entrega ao agente.
  4. O denominado “sequestro relâmpago” é uma modalidade de crime de extorsão cometido mediante a privação total da liberdade da vítima.
  5. As formas qualificadas do roubo não decorrem, necessariamente, do emprego da violência.

Gabarito: Letra “c”.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto n. º 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848.htm.
NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal : parte especial – arts. 121 a 212 do Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano; SOUZA, Artur de Brito Gueiros. Direito penal: volume único. São Paulo: Atlas, 2018.
[1] Não confudir o crime de extorsão mediante sequestro com o de sequestro e cárcere privado, previsto no art. 148 do Código Penal, o qual não possui dolo de obtenção de vantagem indevida, tendo como objeto jurídico tutelado a liberdade pessoal e não o patrimônio. Art. 148 – Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado: Pena – reclusão, de um a três anos. Crime contra a liberdade pessoal. Art. 158 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa. Crime contra o patrimônio.
[2] Embora o legislador tenha se referido apenas à vantagem econômica, uma interpretação sistemática do Código Penal nos leva à perspectiva patrimonial.
[3] Nesse sentido, e com razão, Guilherme de Sousa Nucci e Cezar Roberto Bitencourt. Todavia, Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches da Cunha se posicionam contrariamente, sustentando que o legislador não inovou o ordenamento jurídico com um delito autônomo, reservando-se a prever apenas outro meio de realizá-lo. Daí a razão de ambos, invocando, uma “visão constitucionalista do Direito Penal”, defenderem o caráter hediondo da extorsão qualificada por restrição da liberdade da vítima.


Felipe Leal 
Graduação em DIREITO pela Universidade Federal da Paraíba (2003), mestrado em DIREITO AMBIENTAL E POLÍTICAS PÚBLICAS pela Universidade Federal do Amapá (2012) e Doutorando em Direito Penal. Ingressou na Polícia Federal em 2005, como Papiloscopista Policial Federal, adquirindo experiência na área técnica, e, desde 2006, é Delegado de Polícia Federal, tendo já chefiado Delegacias Especializadas na Repressão ao Tráfico de Drogas (Pará), na Repressão aos Crimes Ambientais (Amapá) e na Repressão a Crimes Financeiros (Paraíba), bem como atuou como Chefe do Núcleo de Inteligência em Pernambuco. Na docência, é um dos responsáveis pela formação profissional de novos policiais, com a elaboração de Caderno Didático para a Academia Nacional de Polícia. Já elaborou Manuais de Investigações para autoridades policiais. Professor em Faculdades de Direito e em cursos de pós-graduação. Coordenador de pós-graduação em Investigação Criminal e Ciências Forenses. Coordenador da Escola Nacional de Delegados de Polícia Federal.



 
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