Cabimento de honorários no IDPJ – Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica

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30 de Junho de 2020

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica (artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil e artigo 855-A da CLT), tem por escopo a inclusão no polo passivo da demanda do(s) sócio(s) da pessoa jurídica devedora. Assim, caso a pessoa jurídica não possua patrimônio suficiente para responder pelos créditos trabalhistas viabiliza-se a inclusão de seus sócios no polo passivo.

Discute-se se a parte que requer a desconsideração e não obtém êxito em seu propósito deve arcar com os ônus referentes à sucumbência, em atendimento ao princípio da causalidade. Ou, ainda, se é cabível a verba honorária em caso de sucesso do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Existem pelo menos três entendimentos dissonantes sobre a matéria.

Há vozes na doutrina e na jurisprudência que sustentam o cabimento dos honorários advocatícios no incidente aqui referido a despeito de não haver previsão expressa no art. 85, § 1º, do CPC/15. Para os defensores desse posicionamento o incidente de desconsideração da personalidade jurídica tem natureza semelhante à de um procedimento comum (natureza jurídica de ação)[1], razão pela qual a parte que requer a desconsideração e não obtém êxito em seu propósito deve arcar com os ônus referentes à sucumbência, em atendimento ao princípio da causalidade.[2]

Nessa ordem de ideias, nos casos de rejeição do incidente de desconsideração da personalidade jurídica haverá honorários, já que, nesse caso, não haverá prosseguimento da demanda em relação aos sócios, encerrando-se, quanto aos mesmos, o trabalho do(s) respectivo(s) advogado(s). Os defensores desse pocionamento entendem aplicável aqui o princípio da causalidade, sendo cabível a condenação da parte que deu causa ao incidente ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte cujo trabalho, que culminou no acolhimento da tese defendida, não pode deixar de ser remunerado.[3]

Em sentido diverso, há entendimento segundo o qual não se pode impor ao requerente do incidente de desconsideração da personalidade jurídica o ônus da sucumbência quando o incidente foi instaurado por culpa do devedor, em razão do princípio da causalidade:

[…] 8. Por aplicação da causalidade, se revelaria teratológico, absurdo, aberrante impor ao credor que sequer tem atendido seu crédito mais uma penalidade em decorrência do exercício de seu direito de persegui-lo.

Na hipótese concreta, embora tenha logrado êxito pela improcedência do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, foi a recorrida quem deu causa à sua instauração, pois, conforme se infere dos autos, a circunstância que motivou o pedido do presente incidente foi o encerramento irregular da pessoa jurídica sem que essa tenha sido baixada junto aos órgãos competentes, ou mesmo sem ter deixado bens passíveis de penhora para satisfação dos débitos assumidos.

De fato, o encerramento irregular da pessoa jurídica é resultado da desídia de seus sócios em promover o competente registro, que constitui providência que poderia, em tese, evitar a indesejada tentativa de levantamento do véu da separação patrimonial.

Na hipótese dos autos, portanto, a causalidade deve prevalecer sobre a sucumbência, sendo afastada a condenação da recorrente ao pagamento de honorários em favor da recorrida (REsp 1845536/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 26/05/2020, DJe 09/06/2020)

No entanto, no mesmo processo acima referido, prevaleceu o entendimento de que não é cabível a condenação em honorários advocatícios em incidente processual, ressalvados os casos excepcionais. Segundo o atual entendimento do STJ, tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa ou foi sucumbente no julgamento final do incidente.[4]

A posição atual da jurisprudência fundamenta-se no entendimento de que a condenação nos ônus de sucumbência é atrelada às decisões que tenham natureza jurídica de sentença, o que não é o caso da decisão que resolve o incidente.  Apenas excepcionalmente se estende essa condenação àquelas decisões previstas de forma expressa no § 1º do artigo 85 do Código de Processo Civil.

Assim, firmou-se no Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que não é cabível honorários advocatícios nos incidentes processuais, exceto nos casos em que os incidentes são capazes de extinguir ou alterar substancialmente o próprio processo principal. Até a presente data o C. Tribunal Superior do Trabalho não havia se pronunciado sobre o cabimento dos honorários advocatícios sucumbenciais no incidente em comento.

Nos casos como o acima decidido, o trabalho exercido pelos advogados da parte impugnante será avaliado e remunerado juntamente com a totalidade dos serviços prestados em conformidade com o resultado final da demanda.

Referências:

[1] Rogério Licastro Torres de Mello afirma que, em termos práticos, o pedido de desconsideração da personalidade jurídica consiste em acionamento judicial do sócio. Para ele, “a desconsideração da personalidade jurídica requerida em caráter incidental (i) deve ter valor da causa, (ii) devem ser recolhidas custas e, via de consequência, deve existir (iii) condenação sucumbencial (custas e honorários sucumbenciais) da parte derrotada, especialmente porque o exercício do direito de ação é algo sério, tem consequências igualmente sérias (o requerido deverá constituir advogado etc.) e deve ser balizado pela litigância responsável e sujeita aos ônus da sucumbência. (TORRES, Rogério Licastro. É preciso dar valor à causa no pedido de desconsideração da personalidade jurídica. In: Revista Consultor Jurídico, 7 de fevereiro de 2019. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2019-fev-07/licastro-valor-causa-desconsideracao-pessoa-juridica> Acesso em: 29/06/2020).

[2] Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. 1. A ausência de comprovação de abuso de personalidade impede sua desconsideração, nos termos do artigo 50 do Código Civil. 2. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica apresenta natureza de ação, devendo arcar a parte vencida com os honorários advocatícios de sucumbência. 3. Inexistência de litigância de má-fé. Recurso parcialmente provido. (TJ-SP, Agravo de Instrumento 2201737-30.2017.8.26.0000; Relator (a): Roberto Mac Cracken; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 7/3/2018; Data de registro: 7/3/2018).

[3] Nesse sentido: TRF 4ª Região; AG-5013307-20.2019.4.04.0000; 3ª Turma; Rel. Des. Fed. Rogerio Favreto; Julg. 16/06/2020; Publ. PJe 17/06/2020.

[4] RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. ART. 85, § 1º, DO CPC/2015. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Não é cabível a condenação em honorários advocatícios em incidente processual, ressalvados os casos excepcionais. Precedentes. 2. Tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa ou foi sucumbente no julgamento final do incidente. 3. Recurso especial provido. (REsp 1845536/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 26/05/2020, DJe 09/06/2020)

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30 de Junho de 2020