Olá pessoal, tudo certo?
Hoje vou falar de um tema pouco analisado, que trato em meu livro de processo penal e que já apareceu em provas de concurso. Trata-se da aplicação da teoria da perda de uma chance no âmbito do processo penal, especificamente do ponto de vista probatório.
Antes de fazer essa análise, permitam-me justificar a ideia desse texto. Estava eu aqui revisando a aprofundando as reflexões sobre alguns julgados dos Tribunais Superiores não veiculados em informativo de jurisprudência e me deparei com um interessante precedente da lavra da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.
Segundo essa decisão, “a requisição de produção probatória, ao final da audiência, refere-se àquelas originadas de circunstâncias ou de fatos apurados no decurso da instrução, nos termos do art. 402 do CPP. No caso em exame, o procedimento administrativo, requisitado tão-somente ao final da instrução probatória, deveria constar do rol das provas a serem produzidas ainda na defesa prévia (art. 396-A do CPP), o que de fato não ocorreu, de modo que a matéria resta acobertada pelo manto da preclusão, nos termos do art. 572, I, do CPP. “Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse” (art. 565 do CPP), como in casu, no qual o recorrente, que deixou de especificar na defesa prévia a pretensão de produzir referida prova, olvidou-se do seu munus, e pretende, indevidamente, corrigir tal situação por intermédio do recurso especial”[1].
Esse precedente me fez relembrar instantaneamente de um fato comigo ocorrido, no exercício da minha função de Defensor Público Federal, justamente em aplicação da teoria da perda de uma chance. Essa teoria é delineada na área cível, indicando que ainda que inexista dano certo e determinado, havendo uma probabilidade de prejuízo para a vítima, extraída de uma legítima expectativa, exsurgirá o dever de reparação civil.
No processo penal, a adaptação é possível, apesar de ser feita com o devido temperamento. Conforme indica Alexandre da Rosa, essa lógica incide no caso da apreciação da carga probatória, afinal deve a acusação provar a autoria, materialidade, ilicitude, tipicidade e culpabilidade de determinada conduta atribuída no âmbito criminal. A dúvida, pois, milita em favor do réu, que deverá ser absolvido em caso de não comprovação desses fatores.
Compreendido isso, vamos ao caso prático por mim vivenciado!
Tratava-se de um determinado roubo em que, SUPOSTAMENTE, o agente tinha rendido o vigilante e gerente de determinado estabelecimento e, ato contínuo, subtraído valores e pertences. Não houve flagrante.
Processo em curso, o Ministério Público Federal não arrolou qualquer testemunha que pudesse reconhecer o acusado. Nas filmagens, como o criminoso estava de óculos e boné, não houve possibilidade de reconhecimento.
As imagens não eram nítidas, impossível a identificação. Nenhuma pessoa que presenciou o feito foi arrolada como testemunha do processo.
Finda a instrução, o MP pediu em diligências finais a intimação do gerente para a feitura do reconhecimento de pessoas, na forma do art. 226 do CPP. Aberta a palavra para mim (DEFESA), sustentei a perda de uma chance probatória.
De acordo com o art. 402 do CPP[2], as diligências devem recair sobre fatos descortinados NA INSTRUÇÃO, ao passo que essa dificuldade de identificação se revelava desde a fase investigativa.
Ora, conforme se verificou, o Ministério Pública havia perdido a chance de, tempestivamente, produzir provas. Não havendo qualquer dado comprobatório da autoria, a absolvição é de rigor. Não é preciso provar a inocência, basta a dúvida razoável para absolvição.
Requerimento de diligência INDEFERIDO, pelo magistrado.
Naturalmente, estamos diante de um exemplo do fenômeno da preclusão temporal. Entretanto, situações análogas poderão ser enfrentadas, na sua prova, justamente como aplicação prática da teoria da perda de uma chance na esfera processual penal. Isso já caiu em provas discursivas e, mais de uma vez, em provas orais.
Anota mais essa, porque poderá aparecer na sua prova!
Espero que tenham compreendido! É um assunto bem bacana para ser trazido em provas!
Vamos em frente!
Pedro Coelho – Defensor Público Federal
[1] AgRg no REsp 1886303/RN, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 01/09/2020, DJe 14/09/2020.
[2] Art. 402. Produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução.
Ótimo conteúdo!