“Adote o ritmo da natureza. O segredo dela é a paciência.” – Ralph W. Emerson, filósofo e escritor estadunidense
Todos temos família. Alguns de nós vivem apenas com o cônjuge. Outros dividem a casa com os pais ou até mesmo os irmãos, avós, tios e primos. Seja como for, não escolhemos quem nos trouxe ao mundo ou, dependendo das circunstâncias, quem nos acolheu e criou. Temos ainda menor poder de decisão quanto aos agregados que se juntam à parentada com o passar do tempo.
O fato é que as famílias, perfeitas ou imperfeitas, são formadas por indivíduos que têm lá seus próprios valores e hábitos. Embora nem sempre seja fácil, a convivência com eles faz parte do jogo. Aceitá-los é nosso dever. Em algumas casas, o almoço de domingo pode até se revelar um grande teste de paciência e tolerância, mas é assim mesmo. Não se pode pedir demissão da família, muito menos ignorar os conselhos de quem, no fim – e em regra –, só quer o nosso bem.
Nesse cenário, fica a dúvida: como lidar com a pressão que surge dentro de casa?
Essa é uma das perguntas que os concurseiros mais me fazem nas redes sociais. É natural: o cônjuge, o pai, a mãe e até o irmão impaciente costumam mesmo cobrar resultados de quem está frequentemente ausente a pretexto de estudar. Como muita gente não faz ideia de como é a preparação para passar num concurso público, não entende que o processo pode ser longo e demorar a render frutos. A aprovação não vem de um dia para o outro, às vezes nem de um ano para o outro. Trata-se de um projeto de médio a longo prazo que demanda amadurecimento e experiência. Os candidatos que logo compreendem isso e passam a se dedicar de verdade enfrentam tantos desafios que nem se assustam quando um deles vem de quem deveria apoiá-los incondicionalmente.
Não se assustam, mas nem por isso deixam de se incomodar. A pressão da família atinge boa parte dos que almejam uma vaga no serviço público e trabalham duro por isso, e a ansiedade que ela provoca pode facilmente se tornar um grande inimigo. Se esse é o seu caso, leitor amigo, meu conselho é: encare o período de dedicação a esse projeto como mais uma fase da vida, à semelhança do vestibular ou do período de preparação para tirar a carteira de habilitação. Talvez seja uma fase até mais longa e dificultosa, porém ainda será apenas… uma fase.
O principal é não permitir que a pressão leve você a perder o controle ou o foco. Ao notar, por exemplo, que as palavras proferidas por alguém do seu círculo familiar não vem para somar, seja pragmático e faça como recomendei em meu último artigo: ouça sem escutar. A dica serve para o mundo lá fora, mas também para dentro de casa.
Saiba, porém, que nem toda pressão, parta de onde partir, precisa ser nociva. Quem a enxerga sempre como ameaça corre o risco de ver diminuir a sua confiança e aumentar o seu medo. A memória, a atenção e a capacidade de julgamento ficam prejudicadas, o que, nem preciso dizer, é péssimo para quem está em ritmo de estudo. A ideia, portanto, é simples: converter a pressão em força de agir. Trata-se de encará-la como desafio, quem sabe até uma fonte de diversão. O que a tem justificado é o histórico de reprovações? Então lembre que segundas chances surgem, que as coisas pioram antes de melhorarem, que falhas antecedem acertos.
Digo isso com base no que testemunho diariamente. Quase todos os professores do Gran que hoje são servidores do público me confidenciaram que, até alcançarem a primeira aprovação, perderam muitas oportunidades. A maior parte deles tem reprovações no currículo, mas jamais se permitiu desistir por causa delas. Em comum, eles entendiam que a cada novo edital se aproximavam mais dos seus objetivos. Pensando assim, de forma positiva, tiravam da equação a ansiedade e o medo e aumentavam a confiança de que podiam chegar lá. Se alguém lhes dirigisse um olhar de dúvida, devolviam um olhar assertivo que dizia “eu vou conseguir”.
Há outro ponto que você deve levar em conta, concurseiro: a pressão só atinge quem tem o privilégio de se envolver em algo grande. Ora, meu amigo, minha amiga, você está estudando para melhorar a sua vida e a da sua família! Consegue perceber o valor disso? A cobrança vem na mesma proporção, ou seja, quanto maior a responsabilidade, maior a expectativa depositada pelos outros.
A família é parte desses “outros”, entende? Por isso, penso que a melhor forma de administrar a pressão daqueles que você mais ama é abrindo-se para o diálogo, para uma conversa franca. Tudo precisa ser esclarecido, combinado, ajustado e reajustado. As pessoas não têm obrigação de saber o que você sabe, então compartilhe com elas um pouco do seu conhecimento. Conte-lhes alguns casos de sucesso, de ex-concurseiros que demoraram anos, mas um dia realizaram o sonho da aprovação. Mostre como isso mudou tudo para eles. Ponha sua família a par de todas as etapas do processo para que ela saiba o que esperar. Explique que o jogo, no fim, será do tipo ganha-ganha, na medida em que a posse no cargo público significará aumento da renda familiar, entre outros benefícios.
Não menos importante, sempre que possível demonstre o seu amor, seja por meio de palavras, de um toque ou de um simples olhar. Faça seu pai, sua mãe, seus irmãos, bem como avós, tios e primos, saberem que seu propósito de mudar de vida por meio do estudo, à custa de muita dedicação e algumas ausências, também é uma forma de manifestar o quanto os ama. Ajude-os a compreender isso conversando e mostrando.
É muito bom quando nossos entes queridos caminham ao nosso lado numa estrada que nem sempre será das mais tranquilas. É reconfortante contar com o incentivo, as orações e os conselhos de quem amamos. E nada como ter o apoio deles nas eventuais falhas. O sorriso solidário, o abraço afetuoso, a confiança em cada milímetro das expressões faciais podem fazer toda a diferença para a retomada do ritmo.
Se – e acho que não será o caso – nem o diálogo funcionar, tranquilize o seu coração. Você fez a sua parte e agora deve seguir o caminho que é só seu. É você o autor da sua biografia e redator de cada uma das páginas desse que é o livro mais importante da sua vida. O lápis está na sua mão e de mais ninguém.
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