“Muitos pensam que ter talento é sorte; não vem à mente de ninguém que a sorte pode ser uma questão de talento.” (Jacinto Benavente y Martínez, Vidas cruzadas)
Era uma vez um homem que tinha um sonho. Insistia em prestar o mesmo concurso público, embora nunca fosse aprovado. Entrava e saía ano, lá estava ele, estudando e se preparando para a próxima oportunidade. Ao longo de mais de uma década, testemunhou conhecidos chegando lá, e ele… nada. Eis que, certo domingo, já em sua 43ª tentativa, respirou fundo, tomou coragem e, determinado, encarou as provas uma derradeira vez. E… passou! Finalmente chegara a sua vez de conquistar a sonhada aprovação!
Essa história é verídica. Aconteceu com o Dr. Fábio Branda, hoje Juiz do Trabalho, que contou a sua bela saga numa conversa em nosso canal Imparável. A entrevista foi ao ar na última quinta-feira, e, tão logo postei um trecho no Instagram, um seguidor comentou: “Que sorte! Hoje nem concurso para reprovar tem.” O comentário me chamou a atenção, sobretudo pelo que trazia implícito. Ora, depois de conhecer a admirável história de um ex-concurseiro que tentou incríveis 43 vezes até conseguir ingressar na magistratura, a primeira reação da pessoa foi pensar na sorte como fator decisivo para o sucesso e, em alguma medida, como instrumento para minimizar a conquista do outro. Aquilo me impressionou, mas, em seguida, caiu a ficha: o rapaz se baseava em um frágil argumento que costuma ser usado para explicar o sucesso ou insucesso alheio, o de que forças superiores têm o poder de definir por completo o nosso destino.
É fato: boa parte dos concursos estão suspensos, como ocorre praticamente com todos os eventos que envolvem aglomeração de pessoas, não só no Brasil, mas no mundo. A situação é, como sabemos, temporária. “Ah, mas a Justiça do Trabalho parou de fazer concursos antes mesmo da pandemia”, alguém pode retrucar. A essa pessoa, digo, com tranquilidade, que um dia as oportunidades retornarão mesmo nessa área do Direito. De qualquer forma, retomando o exemplo do nosso protagonista, se fosse necessário, certamente Dr. Fabio encontraria outro caminho. Sem a opção da Justiça trabalhista, talvez se voltasse para os Tribunais de Justiça, que são nada menos que 27! Talvez assentisse em tentar os Ministérios Públicos estaduais, que também somam 27, além do Federal. Ou, quem sabe, transitasse para outra área, como a de controle, com seus 33 Tribunais de Contas (26 nos Estados, 5 nos Municípios, o do DF e o da União). Isso sem falar nos 28 concursos para Delegado; na possibilidade de se tornar Procurador de um dos 27 entes da Federação ou milhares de Municípios; na carreira de Defensor Público, seja no DF, seja em um dos 26 Estados brasileiros…
Em resumo, sempre há um caminho, concurseiro.
Olhando ao nosso redor, temos a impressão de que algumas pessoas são mais afortunadas que outras. Alguns talentos que elas possuem parecem natos. Mas será verdade que alguns de nós nasceram com a sorte ao seu lado?
Quando o assunto é sorte, não há consenso. Nunca haverá. Para Sir Winston Churchil, trata-se de algo que simplesmente não existe. “Aquilo que chamas de sorte é o cuidado com os pormenores”, dizia. Peço licença para discordar parcialmente do ex-Primeiro Ministro do Reino Unido, deixando minha humilde opinião a respeito do tema.
Penso que sorte existe, sim, e se desdobra em dois tipos, a partir das interpretações que nossa sociedade costuma dar à palavra: uma como fruto do completo aleatório do Universo e outra no sentido de que sorte deve ser construída.
Quanto à primeira noção, não me parece muito passível de debate, já que, em essência, a sorte estaria, segundo esse conceito, totalmente fora do nosso controle. Refiro-me a aspectos completamente aleatórios, como o local onde nascemos, nossa genética, o lar no qual fomos inseridos desde crianças, o tempo ao qual pertencemos… Concorda comigo que não temos nenhuma ingerência sobre essas circunstâncias?
Tudo bem, não temos domínio sobre tudo que nos diz respeito, mas temos – e é essa a maravilha da vida –, quando se trata de saber aonde queremos chegar com o que nos foi dado. Somos plenamente capazes de construir o nosso próprio destino, ainda que a lentos passos, desde que não usemos como muleta o argumento de a sorte estar contra nós. Como nos ensina o filósofo Sêneca: “Sorte é aquilo que acontece quando a preparação se encontra com a oportunidade”.
Eu quis trazer a história do Dr. Fábio exatamente por ser a prova de que sorte construída existe e pode ser mais poderosa que aquela fruto da aleatoriedade. Para se tornar bem-sucedida, basta a uma pessoa ter crescido no seio de uma família bem-estruturada, ou ela ainda precisaria ter persistência e coragem para ir em busca dos seus sonhos? E quanto a uma pessoa menos “afortunada”, sem a “sorte” de ter nascido em berço de ouro, seria ela capaz de mudar os trilhos de sua jornada com garra e esforço?
A experiência mostra que sim. Costumo ouvir gracejos do tipo: “Ah, Gabriel, você deu sorte de ter nascido em uma boa cidade, em uma família organizada e ter estudado em ótimas escolas a vida toda.” Sim, e nunca neguei isso. Essas circunstâncias estavam além do meu controle e certamente me ajudaram muito. Todavia, não tenho a menor dúvida: mais importante ainda foi eu ter buscado construir a minha história, estudando e batalhando muito durante mais de 20 anos. Aos 10 anos de idade, eu já passava grande parte do dia imerso nos livros, nas aulas ou em atividades extracurriculares. Tudo isso estava ali, a meu dispor, mas eu precisei desenvolver força de vontade para tirar o máximo proveito da minha sorte inata, trabalhando ativamente em prol da minha sorte construída.
E não parei nunca. Trouxe essa filosofia de vida, baseada em absoluta dedicação aos estudos, para o campo empreendedor. Veja o exemplo deste blog. Pelas minhas contas, este artigo é o de número 242. Já são 242 semanas con-se-cu-ti-vas escrevendo, sem pausa. Quando se faz algo com tal constância e por tanto tempo, a “sorte” uma hora chega. Garanto que hoje não existiria Gran Cursos Online se eu não tivesse construído minha própria sorte, ainda que a outra, fruto do total acaso, tenha pavimentado o caminho.
Em suma, caro leitor, a sorte vinda do berço pode até garantir as luzes acesas na rua, mas quem passará pelas vielas será você, só você. Como ensina Mario Sergio Cortella no livro A sorte segue a coragem, “a sorte, isto é, a circunstância, a ocasião, a chance, é essencial, mas não exclusiva. De nada adianta ela aparecer se eu não tiver o movimento, a inclinação, a orientação, a tendência de seguir naquela direção”. O próprio filósofo, a quem é comum atribuir “o dom da palavra”, ressalta que “dom” não é a palavra certa para definir essa sua qualidade. Afinal, explica, somados os períodos como aluno e como professor, ele está há mais de 60 anos na escola. Já leu mais de 10 mil livros e começou a falar em público quando tinha apenas 13 anos de idade, incentivado por um padre, que, durante a missa, chamou o menino para ler a Epístola de Paulo aos Tessalonicenses. Nervoso, tropeçou, gaguejou, mas leu até o fim. Na semana seguinte, a história se repetiu. Sorte ou azar? Bem, no dia parecia azar, mas exatamente esses episódios o fizeram começar a tomar gosto pelas leituras em público. Hoje, é o que faz Brasil afora.
Muitos que criaram a própria sorte têm em comum o fato de haverem estado muitas vezes no lugar errado, na hora errada. Parecia que as coisas nunca dariam certo para eles. Contudo, de tanto persistirem, tal como ocorreu com o Dr. Branda, num dado instante tudo mudou: o amor chegou, um novo emprego apareceu, a aprovação se concretizou… Pura sorte? Não mesmo. Resultado do esforço. Resultado da dedicação. Resultado da perseverança.
Agora entenda: a determinação que abre caminho para a sorte não é a dos incautos, mas a do tipo que faz avaliar o terreno, impõe preparação, obriga a rever percursos e ir adiante, apesar do medo e não em razão da inexistência dele. Em síntese, é o tipo de determinação intimamente ligada ao trabalho e ao esforço. Assim, quanto mais se trabalha, mais sorte se constrói. Nas palavras de Miguel de Cervantes, “a perseverança é a mãe da boa sorte”.
Espero que você tenha considerado sorte a oportunidade de ler este artigo.
Agora siga em frente, com coragem e perseverança, e busque construir a sua, dia após dia. Acredite: ela virá.
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“O que chamas felicidade, ou sorte ou boa estrela, é apenas o prêmio inevitável e fatal que a vida concede a quem tem decisão e coragem.” – Olavo Bilac (1865-1918), poeta brasileiro.
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Gabriel Granjeiro – Diretor-Presidente e Fundador do Gran Cursos Online. Vive e respira concursos há mais de 10 anos. Formado em Administração e Marketing pela New York University, Leonardo N. Stern School of Business. Fascinado pelo empreendedorismo e pelo ensino a distância.
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